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19/04/2012

SINASE


http://www.redebrasilatual.com.br/temas/cidadania/2012/04/sinase-muda-conceitos-no-sistema-socioeducativo

País terá de criar nova política para menor infrator

A partir desta quinta, entra em vigor o Sinase, sistema que prevê política integrada de atendimento a adolescentes com medidas que vão de advertências a internação
Por: Jessika Marchiori, da Rede Brasil AtualPublicado em 18/04/2012, 09:24
Última atualização às 16:46
São Paulo – Todos os estados e municípios brasileiros terão de criar uma política integrada de  atendimento a adolescentes de 12 a 18 anos incompletos em conflito com a lei para se adequar ao Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), criado pela Lei 12.594, que entra em vigor nesta quinta-feira (19). Ações de responsabilização, educação, saúde e assistência social deverão ser colocadas em prática conjuntamente. O sistema propõe, de forma inovadora, não punitiva, o que fazer para enfrentar situações de violência com medidas que vão desde advertências até internação. Os recursos partem de um cofinanciamento com a União. 
O Levantamento Nacional do Atendimento Socioeducativo ao Adolescente em Conflito com a Lei, elaborado pela Secretaria de Direitos Humanos (SDH) da Presidência da República, mostra que em novembro de 2010 havia no país 12.041 adolescentes em centros de internação, 3.934 em internação provisória, e 1.728 em semiliberdade, totalizando 17.703 jovens, sendo 888 (5,06%) mulheres e 16.815 (94,94%) homens. O dado registra aumento de 4,5% ante 2009, quando se chegava a 16.940 jovens (4% mulheres e 96% homens) com restrição e privação de liberdade. A média do Brasil é de 8,8 internados para cada 10 mil adolescentes.
O Sinase propõe a co-responsabilidade da família, comunidade e Estado. Traz ainda regras sobre a construção dos centros de internação e a qualificação dos profissionais para atender aos adolescentes. De acordo com Ariel de Castro Alves, presidente da Fundação Criança de São Bernardo do Campo e vice- presidente da Comissão Especial da Criança, do Adolescente e do Idoso, essa legislação prevê, principalmente, a criação de programas de liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade. "São medidas socioeducativas em regime aberto, pelas quais o jovem continua vivendo com a sua família e comparecendo ao programa social para que aprenda a ser responsabilizado e reeducado”, afirma.      
Segundo a SDH, com a vigência da lei, o Brasil passa a ser o primeiro país do Mercosul e um dos poucos do mundo a instituir legislação para medidas socioeducativas em nível nacional. A ministra Maria do Rosário, da SDH, disse que é preciso saber quem são esses jovens, de onde vêm, suas prioridades educacionais e familiares. Ela defende adoção de medidas que apoiem a reinserção social dos infratores.
"Se o jovem quebrou um patrimônio público, danificou a escola ou infringiu a lei, será que é melhor privá-lo da liberdade? Ou será que ele pode receber uma medida que o leve a reparar, reconstruir, pintar ou estar no serviço comunitário? Isso pode ser mais educativo do que uma medida de reclusão", disse a ministra.
O Sinase reafirma a diretriz da Lei 8.069, criada em 1990, que instituiu o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), sobre a natureza pedagógica da medida socioeducativa. Tem como inspiração os acordos internacionais em direitos humanos e, em especial, os de crianças e adolescentes, dos quais o Brasil é signatário.
De acordo com o juiz e coordenador do Programa Justiça ao Jovem do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Daniel Issler, a lei veio para suprir uma lacuna, já que o ECA tinha uma regulamentação superficial em relação às medidas socioeducativas.
“A lei trouxe normas para que o Estado coloque à disposição os aparelhamentos públicos necessários aos adolescentes para que eles cumpram essas medidas”, disse o juiz. “Traz também algumas normas processuais a respeito dos ritos que dentro do poder Judiciário vão ser adotados na execução das medidas e traz também alguns estímulos, como atividades profissionalizantes para os adolescentes.”
Para Issler, os adolescentes terão mais garantias processuais e normas que facilitarão a capacitação profissional. “Não basta apenas uma estrutura física adequada, é preciso que o atendimento aos adolescentes também seja adequado de acordo com as normas, já respeitando seus direitos”, disse.

Ditadura


http://blog-sem-juizo.blogspot.com/2012/04/direito-memoria-tortura-como-causa.html


http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,revisao-de-atestado-de-obito-de-morto-pela-ditadura-militar-anima-entidades,862695,0.htm

15/04/2012

Conjur - A tomada de poder pelos estagiários e o novo regime, por Lenio Streck

A tomada de poder pelos estagiários e o novo regime
Por Lenio Luiz Streck

Respeito muito os estagiários. Esta coluna é uma homenagem a eles e, especialmente, àqueles que trabalha(ra)m em meu gabinete nestes anos todos. Valorosa classe. Inicio com uma citação:
“Embora a qualidade média das decisões judiciais possa não ter diminuído em conseqüência da atribuição de redigi-las a estagiários, a variação de qualidade diminuiu. Os estagiários de direito – que em sua maioria, são indivíduos recém-formados em direito, com referências acadêmicas extraordinárias, mas sem experiência em direito ou em qualquer outra profissão – são mais homogêneos que os juízes. A tendência à uniformidade da produção, também característica das petições redigidas pelos grandes escritórios de advocacia, encontra equivalência na evolução em direção à fabricação em massa de produtos...”.
Não se empolguem aqueles críticos que sempre acham que no Brasil tudo é pior... A citação anterior é uma preocupação externada por um dos corifeus da análise econômica do direito (AED), Richard Posner – portanto, distante das minhas predileções teóricas - em relação à “estagiarização” que está ocorrendo nos Estados Unidos.
1. Todo o poder aos estagiários.
Os estagiários ainda não assumiram o poder – falo agora de terrae brasilis - porque não estão (ainda) bem organizados. Deveriam aderir à CUT. Em alguns anos, chegariam lá. Dia desses veremos os muros pichados com a frase “TODO O PODER AOS ESTAGIÁRIOS”. Afinal, eles dão sentenças, fazem acórdãos, pareceres, elaboram contratos de licitação, revisam processos... Vão ao banco. Sacam dinheiro. Possuem as senhas. Eles assinam eletronicamente documentos públicos. Eles decidem. Têm poder. Eu os amo e os temo.
Sim, eu respeito profundamente os estagiários. Eles estão difusos na República. Por vezes, invisíveis. Jamais saberemos quantos são. E onde estão. Algum deles pode estar com você no elevador neste momento. Ou em uma audiência (é bem provável até). Ou no Palácio do(s) Governo(s). Federal, estadual e municipal. Sei de vários que lá estão. E participam de reunião de gabinetes de Ministérios. Que bom. Com isso vão aprendendo. Afinal, é para isso que servem os estagiários.
Eles fazem de tudo. Neste momento, um estagiário, ou vários deles, podem estar controlando o seu voo. A Infraero tem muitos estagiários. Torço para que eles sejam tão bons quanto os que estagiam no meu gabinete. Estagiários de todo mundo: uni-vos. Nada tendes a perder senão vossos manuais recheados de enunciados prêt à porter, prêt à parler, prêt à penser que os professores vos mandam comprar. Estagiários de toda a nação: indignai-vos face à exploração a que estão submetidos.
1. A tomada do poder.
Parênteses: como seria uma revolta dos estagiários? Imaginemos uma aliança tipo “operário-camponesa”, quer dizer, uma aliança entre estagiários e os bacharéis que não passaram no Exame de Ordem. Cercariam os Fóruns e Tribunais. Juízes, Promotores, advogados e serventuários da justiça (sim, estes, dos quais muitos maltratam os pobres estagiários nos balcões de todo o Brasil) ficariam sitiados durante semanas. O armamento das forças aliadas (estagiários e bacharéis sem carteira) seria simples, mas letal: enormes catapultas, com as quais atirariam enormes manuais (aqueles que querem simplificar o direito e que, por sua causa e baixa densidade científica, os bacharéis não conseguiram passar no exame de ordem e nem nos concursos)... Conheço alguns desses compêndios que provocariam enormes estragos nos tetos dos Tribunais. Penso que nem o teto do STJ resistiria. Que, assim como os demais fóruns, repartições e tribunais, teriam um problema a mais: não somente o ataque vindo de fora, das catapultas das forças aliadas, como também de dentro. Explico: provavelmente o ataque seria lançado durante o expediente. Alguns representantes do MUNESBASC (Movimento Unido dos Estagiários e Bacharéis sem Carteira) estão fazendo alianças com os bacharéis – mesmo os com carteira - que não conseguem decifrar as questões armadilhescas dos concursos públicos (a sigla do movimento, pelo seu tamanho, é impossível de publicar). Já se fala abertamente em um putsch.
Eles formam verdadeiramente o Terceiro Estado. Lembrem-se: antes de 1789, já se ouviam rumores... Diziam coisas, mas ninguém acreditava: lá vinham eles em direção à Paris...! Hoje, os estagiários são aquele conjunto de pessoas que formavam o terceiro Estado (camponeses, comerciantes, advogados, enfim, todos os que não eram nobres ou clérigos...). E as fileiras vão engrossando.
Portanto, meu pedido inicial: estagiários de todo os fóruns, repartições, palácios e tribunais em geral: quando chegardes ao poder, poupai-me! Sou da “base aliada dos estagiários”. A diferença é que não fico exigindo, como fazem os deputados da base aliada do governo, a liberação de emendas parlamentares. Eu apoio a futura estagiariocracia sem chantagear! Outro detalhe que me favorece: eu não peço para a “base aliada” colocar minha mãe no TCU (lembram-se de um certo governador fazendo campanha para levar mamãe ao Tribunal de Contas da União? Ele conseguiu!). Quem me contou isso foi um estagiário que viu tudo...
Eles sabem de tudo. Outra vantagem minha: como sou da base aliada dos estagiários, não mando a conta da arrumação dos meus dentes para o Senado (portanto, é a patuléia quem paga), como fez, no ano passado, o agora presidente da comissão de ética, senador Valadares. E nem uso o que resta das minhas cotas de passagens aéreas para levar familiares (ou namoradas) para a Disney ou para Paris. Nem quero o Ministério da Pesca. Eu também não sei pescar, assim como o ministro Crivella. Só sei escrever. Um pouco.
2. Depois da revolução. Como seria o nouveau régime? O adeus ao ancièn régime.
Eu apoio a futura estagiariocracia sem exigir cargos ou favores. Já ofereço, desde já, a minha biblioteca para o nouveau régime. Ela pode ser expropriada. Vamos melhorar o ensino jurídico brasileiro. Tenho uma lista enorme de livros a indicar. Bons autores. Nenhum deles trará as lições de autores como Dworkin, Habermas, Gadamer, Rui Barbosa, Pontes de Miranda, Heleno Fragoso, Alexy, Kelsen, etc, de “orelha” (aqui, cada leitor pode fazer a sua lista – não quero polemizar nessas simples referências). Nada de pequenos resumos. Fora com as vulgatas. Vamos estudar de verdade. No novo regime, o direito será encarado como um fenômeno complexo. Portanto, não haverá mais espaço para “literatura piriguete” (quer algo mais fácil que “piriguete”?) Também na pós-graduação (mestrados e doutorados) não mais serão feitas dissertações ou teses sobre temas monográficos como “agravo de instrumento”, “o papel do oficial de justiça”, “reflexões sobre os embargos infringentes”; “(re)pensando o artigo 25 do Código do Consumidor – uma visão critica”; “um olhar sistêmico sobre a progressão de regime” ou “execução de pré-executividade: reflexões à margem”... (permitam-se as licenças poéticas).
Sim, tudo mudará. Os estudantes não mais serão enganados pelo professor que só sabe dar aula usando Power Point e fica lendo o que está nesse “pauerpoint” (observação: se o professor insistir, passará a remeter o material via email para os alunos, que poderão ficar em casa lendo aquilo que, até então, ele lia para eles no pauerpoint...). PS: antes que alguém se atravesse (ou se irrite), registro: sim, eu valorizo bastante as novas tecnologias... Só acho que não podem ser um fim em si mesmo. O instrumento não substitui o saber.
No nouveau régime, será proibido ao professor ficar lendo o artigo do código para os alunos e, em seguida, “explicar” – fazendo caras e bocas - o que “dizem as palavras da lei...”. Será proibido invocar coisas metafísicas como “a vontade da norma” (como sabemos, “norma” só tem vontade se for uma senhora que convidamos para jantar). Sugeri isso para a pauta da Estagiariocracia porque essa discussão me é muito cara. De há muito.
Também não haverá mais a invocação do “espírito do legislador” e não haverá mais perguntas “inteligentes” como “o que o legislador quis dizer aqui”? (neste caso, sempre haverá um aluno – espião do regime – que entregará um celular pré-pago ao professor sugerindo-lhe que ele mesmo, o mestre, ligue para “o legislador” e pergunte...).
Com o tempo, os alunos, a partir desse novo programa pedagógico, já poderão entender as anedotas e os sarcasmos que eu conto em minhas palestras... Até as finas ironias (não só as minhas, é claro) serão compreendidas. Já não agüento mais contar a estória dos rabinos que estudavam o Talmude, o Livro Sagrado... Mas, é claro, não contarei aqui. Não mais precisarei explicar que interpretar não depende de placar ou de maioria... E que quando o Rabino Eliezer disse... Bem, deixemos assim. Na próxima conferência, que será em Natal (Congresso em Homenagem ao Min. Gilmar Mendes), prometo que contarei (de novo). Ainda: quando falo do sujeito solipsista, não será mais preciso estroinar no final, desfazendo o silêncio com brincadeiras do tipo “o Selbstsüchtiger (sim, é esse o nome do sujeito egoísta da modernidade, esse do esquema sujeito-objeto) não é o volante do Bayern de Munique... O novo regime será muito bom. Já estou antevendo isso. Alvíssaras.
Mas, tem mais: no nouveau régime — pelo menos até que ocorra a restauração (sempre ocorre, pois não) do ancièn régime e nossas cabeças sejam cortadas — mudaremos os atuais currículos dos cursos jurídicos. E os concursos públicos não mais perguntarão sobre a vida e obra de gêmeos xifópagos e nem sobre a transformação de homens em lagartos (nunca vou esquecer isso). As questões não mais versarão sobre enfiteuse e nem serão armadilhas (pegadinhas malandras que só divertem o nécio que a elaborou). Não mais será necessário decorar a Constituição e os Códigos para fazer concurso; as perguntas, no novo regime, buscarão detectar efetivamente o que os candidatos sabem; também o Exame de Ordem não trará mais perguntas que somente o argüidor saiba ou baseadas no único livro que o argüidor leu ou conhece.
Nessa nova era, as provas de concursos não serão mais feitas para divertir os arguidores. Não. Nunca mais. E haverá fortes punições. Por exemplo, quem fizer perguntas do estilo “pegadinhas” ou sobre coisas ridículas (p.e.x., Caio e Tício que embarcam em uma tábua e depois se matam...), terá que resolver as questões do mesmo concurso feitas pelos seus colegas de banca. E essa prova será oral... na presença de todos os concurseiros (como na arena romana). E cabeças rolarão!
No nouveau régime, extinguiremos (me coloco no meio porque me considero, como já disse, da “base aliada dos estagiários”) os embargos declaratórios e os juízes não mais farão sentenças obscuras, contraditórias ou omissas. No novo regime, o art. 93, IX será cumprido na íntegra. E não será mais necessário fazer agravo do agravo; e nem embargos do agravo e embargos do agravo do agravo. Na nova ordem que será instaurada, o Supremo Tribunal Federal declarará a inconstitucionalidade dos embargos declaratórios (ou os declarará não recepcionados, antes que alguém me corrija e diga que, em sendo o art. 535 do CPC anterior a Constituição, não cabe ADI – embora caiba ADPF, pois não?).
No novo regime, não mais se decidirá conforme o que cada-um-pensa-sobre-o- mundo-e-o-direito, mas, sim, a partir do que diz a doutrina e a jurisprudência, com coerência e integridade. O direito terá um DNA. As denuncias do Ministério Público somente serão deduzidas quando efetivamente existirem indícios. Não bastará juntar reportagens de revistas, por exemplo. E serão recebidas de forma amplamente fundamentadas.
Nesse novo tempo, não será mais permitido construir princípios estapafúrdios. Até que saibamos, de fato, o que é um Princípio, sua “fabricação” estará suspensa. Proibida! Vamos separar o joio do trigo. Como Medida Provisória n. 1, já de pronto ficam revogados “princípios” como “da ausência ocasional do plenário”, “da rotatividade”, “do fato consumado”, “da confiança no juiz da causa”, “da delação impositiva”, “alteralidade”, da “benignidade”, “do deduzido e do dedutível”, “da afetividade” e “da felicidade” (embora todos queiramos ser felizes!).... Estão fora ab ovo. Ficará também vedado o uso da ponderação de valores, a não ser que haja a comprovação de que o utente tenha construído a regra adstrita... Portanto, nada de pegar um princípio em cada mão e recitar o mantra da “ponderação”.
No nouveau régime que se instalará, o sistema acusatório prevalecerá no processo penal. Inclusive o art. 212 do CPP será cumprido. O STJ e o STF anularão todos os processos em que não for obedecido o novo modo de inquirição das testemunhas. O descumprimento do art. 212 não será mais “nulidade relativa”; será, sim, nulidade absoluta. Finalmente, a nova lei será cumprida e os advogados e promotores deverão eles mesmos produzir as provas. O juiz inquisidor terá seus dias contados.
Já no processo civil, não mais se falará em “escopos processuais”. Finalmente, o instrumentalismo será sepultado. As cinzas de Oskar von Büllow serão jogadas na costa brasileira e sua alma, juntamente com as de Liebmann (e outros...), descansarão em paz. Tudo graças ao nouveau regime.
Também o direito administrativo será levado a sério. Será vedada a sua “descomplicação” (é um sarcasmo!). Você não será mais multado por qualquer guarda de trânsito sem a possibilidade de defesa. Não mais bastará a palavra dele. Ele não terá mais “fé pública”. A Constituição triunfará. Todos dirão: viva, o direito administrativo não é mais só para fazer grandes congressos... Ou para fazer dissertações de mestrado. Agora vai valer mesmo. Inclusive os recursos que o advogado interpuser contra as multas serão lidos na íntegra pelas juntas. As juntas, quando negarem os recursos, fundamentarão as decisões. E já não se falará de outra coisa...
No direito penal, os tipos penais de perigo abstrato sofrerão uma forte censura (filtragem) hermenêutico-constitucional. Cada caso concreto será examinado à luz da presunção da inocência e, se necessário, será aplicada a técnica da Teilnichtigerklärung ohne Normtextreduzierung. É verdade. Finalmente, implementaremos o controle difuso para valer e este não mais servirá apenas para ornamentar dissertações e teses.
Nos crimes de furto, o sistema fará uma escolha: ou aplicará o critério da insignificância dos crimes de descaminho também para o furto ou os crimes de contrabando ou descaminho também serão avaliados de acordo com as balizadoras do furto. A isonomia será para valer. Inclusive na comparação entre a devolução do valor furtado com o pagamento dos tributos nos casos de sonegação. Fairness (equaninimidade), essa será a palavra mais usada. Isonomia. Igualdade. Estes serão os critérios norteadores dos tribunais.
Também o art. 557 do CPC será usado com mais parcimônia pelos tribunais. O nouveau régime dará cursos para evitar tantas decisões monocráticas... O CNJ baixará recomendação para que sejam revitalizados os juízos colegiados. Também os advogados, ao fazerem sustentações orais, serão ouvidos. Ninguém ficará mexendo nos computadores enquanto o causídico se esfalfela na Tribuna. Todos prestarão atenção.
No nouveau régime, uma portaria não valerá mais do que a Constituição. Nunca mais. O Ministro da Fazenda não legislará mais por resoluções. Nwem o da Previdência. A Comissão de Constituição e Justiça do Congresso examinará os projetos previamente. As ONG’s serão fiscalizadas. Muitos dos atuais dirigentes terão que trabalhar de verdade. Os atores da Globo não mais usarão os benefícios da Lei Rouanet. Oas Estádios da Copa não serão superfaturados. A fiscalização será implacável. E o crime de Fraude à Licitação não será mais punido com “cesta básica”.
No nouveau régime os advogados não mais serão maltratados e/ou humilhados. Eles não precisão mais implorar para serem recebidos pelos juízes. E receberão cafezinho na antessala do magistrado. Aliás, isso estará no novo Estatuto que o nouveau régime implantará. E, o que é melhor, o Estatuto dos Advogados será cumprido. Ah, no novo regime...!
Pronto. Eis as bases do putsch. Mas não quero ser o Robespierre desse regime. Pela simples razão de que este perdeu a cabeça. Falando mais sério ainda: um pouco de utopia vai bem. Nestes tempos de atopia e acronia, mirar um lugar inalcançável pode fazer bem ao nosso espírito. Um pouco de desconstrução do sistema pode levar a boas reconstruções. Como diz meu poeta favorito, Manoel de Barros, sempre compreendo o que faço depois que já fiz! Só esta frase já daria para fazer uma tese. Pura fenomenologia. Mas, o que quer dizer isto? No nouveau régime saberemos. Aliás, no novo regime os estudantes lerão Manoel de Barros. E tantos outros bons livros. E o Google não mais mentirá, porque será alimentado por jovens que refletem e não por aqueles que apenas se informam!
Numa palavra final. Estamos no mundo pela metáfora. E estamos nele porque simbolizamos. O texto acima também se pretende “metáfora”. Mas não pode ser somente uma metáfora. Como disse Wittgenstein — e cito-o, de cabeça, pela boca de Ruben Alves —, andaimes cercam a casa, mas não são a própria casa; uma vez construída a casa, desmontam-se os andaimes. Pois é. As metáforas talvez sejam isso. Nietschze talvez me ajude: tudo aquilo para que temos palavras é porque já fomos além. E, assim, fica mais fácil entender a frase acima de Manoel de Barros... Sim, sempre compreendo o que faço depois que já fiz!

Lenio Luiz Streck é procurador de Justiça no Rio Grande do Sul, doutor e pós-Doutor em Direito.
Revista Consultor Jurídico, 12 de abril de 2012

Engana-me que eu gosto, por Rizzato Nunes

Engana-me que eu gosto – parte 2 – 12-4-2012

Por Rizzatto Nunes

 

Continuo hoje a desenvolver a série do título, muito em voga no país. Como eu disse no primeiro episódio da série (no dia 6-2-2012) retirei o nome de uma comédia. É uma brincadeira que, de todo modo, ilustra um fato importante: se, de um lado, a mentira pode ser conscientemente utilizada, de outro, muitas vezes, a pessoa enganada, estava mesmo interessada em sê-lo. Aceita a mentira porque lhe soa cômoda ou está de acordo com seu próprio interesse ou, ainda, porque não desenvolveu senso crítico capaz de percebê-la.


Do ponto de vista da sociedade de consumo – e também do sistema mais amplo da sociedade em geral, como demonstrarei abaixo -- há muito tempo que os consumeristas descobriram que um dos fundamentos da sociedade capitalista de consumo é a mentira, mentira nem sempre detectável, mas que pode muitas vezes ser.


Cuido, a seguir, de dois casos: um, que é, -- para ficar com a ideia do título que extraí de um filme – uma reprise: o das sacolas plásticas. O outro, escancarado e abertamente praticado nas ruas e avenidas de nossa megalópole de São Paulo congestionada assombrosamente. Começo por esta.


No início deste ano, foram divulgados os valores que a Prefeitura de São Paulo arrecadou com as multas de trânsito no ano de 2011. Foram aproximadamente R$ 748.000.000,00, um crescimento de quase 35% em relação ao ano de 2010 (naquele ano a Prefeitura arrecadou a bagatela de R$ 556.000.000,00).


Meu amigo Outrem Ego, examinando o valor das cifras, reclamou e me perguntou se eu tinha percebido o retorno dessa montanha de dinheiro no setor dos transportes em São Paulo? "O trânsito está melhor? As ruas estão menos esburacadas? Os funcionários da CET estão melhor preparadores? Eles te ajudam, ajudam o trânsito, te respeitam ou só pensam em multar?", prosseguiu indignado. E ele tem boas razões. Veja, na sequência, duas situações, uma vivida por ele e outra por sua esposa, Bete.


No final do ano passado, em um começo de noite, após uma forte chuva, meu amigo, ouvindo uma buzinação enorme na rua, foi até a janela de seu quarto. De lá observou que o semáforo quase em frente de seu prédio estava quebrado, o que ocasionava transtorno no trânsito e, naturalmente, as buzinadas.


De repente, ele viu um carro da CET estacionar na rua. Pensou: "Ainda bem que eles chegaram". Uma moça desceu do veículo, olhou para o trânsito e ao redor.


Você sabe o que essa servidora, que trabalha para uma empresa que administra o trânsito, fez? Veja.

Ela sacou do talonário, foi até um veículo estacionado num local proibido, aplicou uma multa, colocou no para-brisa, olhou de novo para a balbúrdia do trânsito por causa do semáforo quebrado, entrou no carro e foi embora, deixando o caos do trânsito para trás!


A outra história foi protagonizada pela Bete e ocorreu no dia 07.12.2012 na porta de um importante colégio na região de Pinheiros. Como é de costume, mais ou menos em torno das 12:30 horas, ela dirigiu-se à porta do colégio à espera da saída dos filhos. Ficou parada na fila, que normalmente se forma à porta.


De repente, quando fez menção de tirar o cinto de segurança, eis que estava ali parada, surgiu na frente dela um funcionário do colégio gesticulando pedindo que ela abrisse o vidro, o que ela fez. Ele então disse: "Minha senhora, não retire o cinto de segurança até que seus filhos cheguem à porta do carro e a senhora tenha que descer para ajudá-los. Veja ali aqueles fiscais (e apontou para dois servidores da CET). Eles multam todas as pessoas que ficam aqui paradas esperando os filhos sem o cinto de segurança."


Bete, indignada, verificou que o trânsito era bastante confuso na região, aliás, como é todo dia, mas os dois servidores públicos, ao invés de ajudarem as pessoas, realmente passavam devagar ao lado dos carros com o talão na mão, apenas para lançar o maior número de multas possíveis.


Depois de me contar as histórias, Outrem Ego repetiu as questões incisivamente: "Você acredita que a enorme arrecadação com a aplicação de multas reverte a favor da administração do trânsito? Acredita que existe alguma preocupação com a qualidade de vida da população?". Depois para terminar disse: "A eficiência tecnológica beneficia apenas o lado do faturamento " e lembrou que sempre que chove na cidade de São Paulo, o noticiário das rádios aponta como é interessante que os semáforos deixem de funcionar, mas os radares que lavram as multas não!


 

Eis, agora, o caso da ladainha das sacolas plásticas.

Albert Camus disse no seu livro "A queda", que, no futuro, para definir o homem moderno bastará uma frase: "Fornicava e lia jornais". Meu amigo Outrem Ego, que é fã do famoso escritor francês-argelino disse, nele inspirado, que, no futuro, os historiadores poderão definir os paulistas como pessoas que acreditam em Papai Noel e carregam sacolas plásticas pelas ruas...


De fato, os supermercados já foram um lugar agradável de frequentar. Aliás, o slogan de uma grande rede é "um lugar de gente feliz". É caso de mudar o refrão, mas penso que os marqueteiros de plantão baterão o mesmo martelo na esperança de que, de tanto o consumidor ouvir o slogan, passe nele a acreditar. Ora, atualmente, as pessoas não devem estar muito felizes nos supermercados, especialmente nas saídas dos caixas.

Eu, particularmente, nunca pensei que algum empresário pudesse tratar seus clientes com tamanho desprezo e antipatia, como estão fazendo esses do setor. Agora, é levar tudo nas caixas, se existirem, nos braços ou em pequenas ou grandes e caras sacolas adquiridas na hora.


Mas, ouvi numa rádio, de um dos dirigentes do setor, que eles estudam transformar essas grandes sacolas em retornáveis. Disse ele, constatando o óbvio, como faria o antigo personagem Pedro Bó: as pessoas simplesmente se esquecem de levar as sacolas ou, de repente, resolvem ir ao supermercado sem, naturalmente, estarem com uma sacola no bolso ou na bolsa.


Outrem Ego, estupefato, lembrou-me que as pessoas não vão ao supermercado comprar sapatos – embora até isso alguns vendam. E que ele não gostaria nem um pouco de utilizar sacolas retornáveis usadas por muitas outras pessoas que passaram sabe-se lá por onde para colocar os mantimentos que ele leva para casa. "Sacolas retornáveis? E sujas? Será que haverá desconto por bactérias?" Serão também laváveis e lavadas?" É! Talvez.


Como diria meu amigo, isso mudaria se os consumidores simplesmente deixassem de ir ao supermercado e o substituísse por quitandas, padarias e feiras ou fossem até lá para comprar apenas o estritamente necessário que coubesse nos braços. Só com a queda no faturamento, esse setor voltará a respeitar seus clientes.


E, para terminar mais este capítulo do filme "Engana-me que eu gosto", colo abaixo a foto que recebi via internet.


 


13/04/2012

Boaventura - Neoliberalismo e Esquerda

Plataforma para as esquerdas: à cultura do medo do neoliberalismo propor a cultura da esperança
09/04/2012
BOAVENTURA DE SOUZA SANTOS, professor em Coimbra e em Austin (USA) é um dos que melhor pensa o processo de globalização a partir do Grande Sul.Conta-se entre os fundadores do Forum Social Mundial onde é uma das vozes mais ouvidas pela pertinência e originalidade do seu pensamento que advem do fato de pensar a partir das alternativas negadas pelo sistema imperante e que contem sementes para um outro mundo possivel e necessário.Sempre tem desafiado as esquerdas para superarem as armadilhas que o neoliberlismo lhes prepara e assim ocupá-las com falsos problemas e começarem a apresentar algo realmente novo que poderá configurar uma saida bem sucedida à atual crise sistêmica. LeonardoBoff
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Por que é que a actual crise do capitalismo fortalece quem a causou?
Por que é que a racionalidade da “solução” da crise assenta nas previsões que faz e não nas consequências que quase sempre as desmentem?
Por que é que está ser tão fácil ao Estado trocar o bem-estar dos cidadãos pelo bem-estar dos bancos? Por que é que a grande maioria dos cidadãos assiste ao seu empobrecimento como se fosse inevitável e ao enriquecimento escandaloso de poucos como se fosse necessário para a sua situação não piorar ainda mais? Por que é que a estabilidade dos mercados financeiros só é possível à custa da instabilidade da vida da grande maioria da população?
Por que é que os capitalistas individualmente são, em geral, gente de bem e o capitalismo, no seu todo, é amoral? Porque é que o crescimento
económico é hoje a panaceia para todos os males da economia e da
sociedade sem que se pergunte se os custos sociais e ambientais são ou não sustentáveis? Porque é que Malcom X estava cheio de razão quando
advertiu: “se não tiverdes cuidado, os jornais convencer-vos-ão de que a
culpa dos problemas sociais é dos oprimidos, e não de quem os oprime”?
Por que é que as críticas que as esquerdas fazem ao neoliberalismo entram nos noticiários com a mesma rapidez e irrelevância com que saem? Por que é que as alternativas escasseiam no momento em que são mais necessárias?
Estas questões devem estar na agenda de reflexão política das
esquerdas sob pena de, a prazo, serem remetidas ao museu das felicidades
passadas. Isso não seria grave se esse facto não significasse, como
significa, o fim da felicidade futura das classes populares. A reflexão deve começar por aí: o neoliberalismo é, antes de tudo, uma cultura de medo, de sofrimento e de morte para as grandes maiorias; não se combate com eficácia se não se lhe opuser uma cultura de esperança, de felicidade e de vida. A dificuldade que as esquerdas têm em assumirem-se como portadoras desta outra cultura decorre de terem caído durante demasiado tempo na armadilha com que as direitas sempre se mantiveram no poder: reduzir a realidade ao que existe, por mais injusta e cruel que seja, para que a esperança das maiorias pareça irreal.
O medo na espera mata a esperança na felicidade. Contra esta armadilha é preciso partir da ideia de que a realidade é a soma do que existe e de tudo o que nela é emergente como possibilidade e como luta pela sua concretização. Se não souberem detectar as emergências, as esquerdas submergem ou vão para o museu, o que dá no mesmo.
Este é o novo ponto de partida das esquerdas, a nova base comum
que lhes permitirá depois divergirem fraternalmente nas respostas que
derem às perguntas que formulei. Uma vez ampliada a realidade sobre que
se deve actuar politicamente, as propostas das esquerdas devem ser
credivelmente percebidas pelas grandes maiorias como prova de que é
possível lutar contra a suposta fatalidade do medo, do sofrimento e da
morte em nome do direito à esperança, à felicidade e à vida.
Essa luta deve ser conduzida por três palavras-guia: democratizar, desmercantilizar, descolonizar. Democratizar a própria democracia, já que a actual se deixou sequestrar por poderes anti-democráticos. É preciso tornar evidente que uma decisão democraticamente tomada não pode ser destruída no dia seguinte por uma agência de rating ou por uma baixa de cotação nas bolsas (como pode vir a acontecer proximamente em França). Desmercantilizar significa mostrar que usamos, produzimos e trocamos mercadorias mas que não somos mercadorias nem aceitamos relacionar-nos com os outros e com a natureza como se fossem apenas mercadorias.
Somos cidadãos antes de sermos empreendedores ou consumidores e para o sermos é imperativo que nem tudo se compre e nem tudo se venda, que haja bens públicos e benscomuns como a água, a saúde, a educação. Descolonizar significa erradicar das relações sociais a autorização para dominar os outros sob o pretexto de que são inferiores: porque são mulheres, porque têm uma cor de pele diferente, ou porque pertencem a uma religião estranha.
Fonte: Visão 5/4/2012

Revista Responsabilidades

Já épossível acessar o novo número da Revista Responsabilidades:
http://www.tjmg.jus.br/presidencia/programanovosrumos/pai_pj/revista/edicoes.html

“O que ensinam os jovens no tempo da adiçãogeneralizada”

Este número da RevistaResponsabilidades apresenta respostas dos jovens de nossa época e das diversaspolíticas que lhes concernem, quando seu ato, sua língua, seu corpo e os objetos aosquais se enlaça interrogam o discurso e a ordem social vigente, a saber, a promessa defelicidade para todos, ao custo do controle de um por um, sem exceção.
A resposta do jovem,o modo como toma a palavra e faz sua apresentação enquanto sujeito frente ao Outro,ganha aqui sua função irredutível. Sua palavra merece respeito, trata-se daenunciação de um saber autêntico que revela os impasses de sua época eo modo singular como tenta resolvê-los.
Saiba mais: http://www.tjmg.jus.br/presidencia/programanovosrumos/pai_pj/revista/edicoes.html

Revista do IHJ - Chamada



Chamada pública para o número 11, ano 10
da Revista do Instituto de Hermenêutica Jurídica

Prazo final para envio: 30 de junho de 2012

A Revista do Instituto de Hermenêutica Jurídica, ISSN 1678-1864, com periodicidade semestral, é um periódico especializado com linha de pesquisa em Hermenêutica Jurídica, avaliada pelo Qualis de periódico da CAPES, B3.
Tema do número 11, ano 10 (2012)
1.Os membros do Conselho Editorial da Revista do IHJ indicaram o seguinte tema, para o volume 11, ano 10 da Revista do IHJ: Constitucionalismo Latino Americano
2. O tema proposto pretende uma discussão sobre temas relacionados ao processo de redemocratização e constitucionalização da América Latina. Pretende-se com o volume da Revista congregar as diversas pesquisas jurídicas e filosóficas sobre esse tema para a atualidade do direito.


Chamada pública para o número 12, ano 10
da Revista do Instituto de Hermenêutica Jurídica

Prazo final para envio de artigos: 19 de novembro de 2012

Tema do número 12, ano 10 (2012)
1.Os membros do Conselho Editorial da Revista do IHJ indicaram o seguinte tema, para o volume 12, ano 10 da Revista do IHJ: Hermenêutica Jurídica
2. O tema proposto pretende uma discussão sobre temas relacionados à hermenêutica jurídica, interpretação e argumentação. Pretende-se com o volume da Revista congregar as diversas pesquisas jurídicas e filosóficas sobre esse tema para a atualidade do direito.


As propostas de artigos para edição deverão ser enviadas para < revista@ihj.org.br; ou conselhorevistas@editoraforum.com.br>

Revista de Psicanálise

Revista séria de Psicanálise
http://www.uva.br/trivium/

Evento em Vitória - Recomendo



Coordenação                   Escola Lacaniana                   ELPV,                   Cartel Direito e Psicanálise (em                   constituição)


Palestrante                   convidado:                    Prof. Dr. Thiago Fabres de                   Carvalho
Doutor e Mestre em Direito                   pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos -                   UNISINOS. Docente no curso de Mestrado no Programa de                   Pós-Graduação Stricto Sensu em                   Direitos e Garantias Fundamentais da                   Faculdade de Direito de Vitória -                   FDV.
Data:                   Sexta-feira, 20 de Abril de 2012
Horário: 14:00h                  
Local: Auditório da                   FDV, Rua                   Doutor João Carlos de Souza, 779 - Santa Lúcia,                   Vitória -                   ES
Encontro:                   "Um diálogo sobre a prática da justiça                   reconstrutiva"
                     Escutamos todos os dias gente falando da falência do sistema                   judiciário, de sua fragilidade, de sua insuficiência e de suas                   atrocidades. É a força gigantesca de um sistema instituído,                   que parece não responder mais à realidade do nosso tempo, tão                   pouco à subjetividade do homem de hoje que age impulsivamente,                   cada vez mais distante de sua capacidade de refletir sobre seu                   ato.
                     Estamos falando de um modelo de Justiça Penal Retributiva e                   punitiva nascida da Modernidade através do Estado Constituído                   em leis propiciando o surgimento dos presídios e hospícios.                  
Neste modelo o Estado confisca, o ato criminoso, tanto da                   vítima quanto do infrator, na pretensão de proteger a                   sociedade do delinqüente, além de acreditar que, pela punição,                   irá reeducá-lo e reinseri-lo no convívio                   coletivo.
                     A clínica psicanalítica nos interroga a respeito das                   patologias do ato que se encenam na vida privada e nos espaços                   públicos. Ela não nos permite esquecer que o homem “existe                   onde não pensa.” Por isso ele age – muitas vezes encenando a                   barbárie - determinado pelas pulsões / impulsões de um                   inconsciente que também expressa a maneira de o homem viver na                   coletividade. Se não houver o encontro com a boa palavra,                   tendo o analista como testemunha, não é possível que ele se                   reconheça autor e responsável por seus                   atos.
                     O Modelo de Justiça Reconstrutiva visa reconstruir o cenário                   de um ato que pertence tanto à vitima quanto ao infrator. O                   Estado e a comunidade passam a ocupar a função de testemunha                   frente à dor e ao horror vividos pela vítima, que ganha o                   direito de intervir no processo judiciário. É uma justiça que                   visa transformar pela palavra, sem pretender “cuidar da psicologia perturbada do                   delinqüente ou consolar a consciência dolorosa da                   vítima”. Ela visa antes a responsabilização,                   levando em conta o diálogo e a escuta atenta de um                   interlocutor.
                    Será que podemos contar com o funcionamento de uma Justiça                   Reconstrutiva dentro de um cenário de tanta violência, em que                   ainda se sonha com presídios e a tortura ainda fascina como                   forma de punição?
“(...)                   a Justiça Restaurativa não se limita a uma troca processual de                   argumentos jurídicos; exerce também a depuração das                   paixões.”
“(...)                   Qual seria o lugar específico deste Direito?.... O da                   constituição da cidade enquanto ele deve regular as relações                   entre os homens. ..... visa transformar o escandaloso de um                   crime em um acontecimento traumático entre vitima e infrator                   ...visa o encontro onde há confronto.”
“(...)                   O encontro é partilhar um mesmo evento. O juiz deve não apenas                   julgar pessoas mas também liquidar este mal                   encontro.”
“                   (...) a ele cabe introduzir o escandaloso de um crime nos atos                   processuais... O processo é a religação necessária do                   irreconciliável do trauma... Ele é o lugar vivo de um outro                   encontro entre os mesmos                   protagonistas...
“(...)                   A única alternativa ao inferno da pena é teatralizar o nosso                   espaço por mais dramas para se referir, para melhor o habitar                   com relatos comuns e reprová-los como símbolos vivos.” E                   far-se-á justiça!” (Antoine Garapon)
Para                   dialogarmos sobre estas questões, convidamos o Professor                   Thiago Fabres de Carvalho.   Sugerimos a leitura das                   páginas 253                   a 335 do livro “Punir em                   Democracia” Garapon, Gross, Pech. A cópia do texto se encontra na                   Secretaria da Escola.
Contamos                   com vocês!
Até               lá!

STJ - Informativo 494 - Resumo Jorge Andrade



Informativode Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - N° 0494



EXECUÇÃODA PENA. INTERRUPÇÃO. FALTA GRAVE.



Ocometimento de falta disciplinar grave pelo apenado determina ainterrupção do prazo para a concessão da progressão de regimeprisional. Para o Min. Relator, se assim não fosse, ao custodiado emregime fechado que comete falta grave não se aplicaria sanção emdecorrência dessa falta, o que seria um estímulo ao cometimento deinfrações no decorrer da execução. Precedentes citados do STF: HC98.387-SP, DJe 1º/7/2009; HC 94.098-RS, DJe 24/4/2009; do STJ: HC47.383-RS, DJ 13/3/2006, e HC 66.009-PE, DJ 10/9/2007. EREsp.1.176.486-SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgados em28/3/2012.



PRESCRIÇÃO.CRIME ANTECEDENTE. LAVAGEM DE DINHEIRO.



Aextinção da punibilidade pela prescrição quanto aos crimesantecedentes não implica o reconhecimento da atipicidade do delitode lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei n. 9.613/1998) imputado aopaciente. Nos termos do art. 2º, II, § 1º da lei mencionada, paraa configuração do delito de lavagem de dinheiro não hánecessidade de prova cabal do crime anterior, mas apenas ademonstração de indícios suficientes de sua existência. Assimsendo, o crime de lavagem de dinheiro é delito autônomo,independente de condenação ou da existência de processo por crimeantecedente. Precedentes citados do STF: HC 93.368-PR, DJe 25/8/2011;HC 94.958-SP, DJe 6/2/2009; do STJ: HC 137.628-RJ, DJe 17/12/2010;REsp 1.133.944-PR, DJe 17/5/2010; HC 87.843-MS, DJe 19/12/2008; APn458-SP, DJe 18/12/2009, e HC 88.791-SP, DJe 10/11/2008. HC207.936-MG, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 27/3/2012.


Excertodo acórdão:


“Daleitura do mencionado dispositivo legal (artigo 1º da Lei9.613/1998), percebe-se que para que o delito  em  apreço reste configurado,  é  necessário  que  o  dinheiro,  bens  ou  valoresocultados ou dissimulados sejam provenientes de algum dos ilícitosnele arrolados, ou  seja,  no  tipo  penal  há  expressa  vinculação entre  a  lavagem  de  capitais  a determinados crimes a elaanteriores.


Assim, num  primeiro  momento  se  poderia  entender  necessária  a prévia condenação, ou mesmo a indispensabilidade da  comprovação daautoria e da materialidade dos crimes antecedentes, para que secaracterize a infração penal prevista no artigo 1º da Lei9.613/1998.


Noentanto, não foi essa a opção adotada pelo legislador pátrio, queno artigo 2º, inciso II e § 1º, da Lei de Lavagem de Capitais,dispõe que a apuração do  delito  em  comento  independe  do "processo  e  julgamento  dos  crimes antecedentes ", devendo  a  denúncia  ser  "instruída  com  indícios suficientes  da existência  do crime  antecedente,  sendo  puníveis os fatos  previstos  nesta  Lei,  ainda que desconhecido  ou isento de pena o autor daquele  crime".


Dessemodo, a simples existência de indícios da prática de algum doscrimes previstos no artigo 1º da Lei 9.613/1998 já autoriza ainstauração de ação penal  para  apurar  a  ocorrência  do delito  de  lavagem  de  dinheiro,  não  sendo necessária a préviapunição dos autores do ilícito antecedente.”



CONCURSOFORMAL. LATROCÍNIO.



Nahipótese, os recorrentes, objetivando a reforma do julgado,sustentaram negativa de vigência ao art. 70 do CP, alegando aocorrência de apenas uma subtração patrimonial e a morte de duasvítimas, o que configuraria crime único de latrocínio, e nãoconcurso formal impróprio. Porém, foi comprovado que os agentes nãose voltaram apenas contra um patrimônio, mas que, ao contrário, oscrimes resultaram de desígnios autônomos. Daí, as instâncias aquo decidiram que os agentes desejavam praticar mais de umlatrocínio, tendo em cada um deles consciência e vontade, quandoefetuaram os disparos contra as vitimas. Assim, aplica-se o concursoformal impróprio entre os delitos de latrocínio (art. 70, partefinal , do CP), pois ocorreram dois resultados morte, ainda quetivesse sido efetuada apenas uma subtração patrimonial. Ademais,consoante a Súm. n. 610 do STF, há crime de latrocínio quando ohomicídio se consuma, ainda que não realize o agente a subtraçãode bens da vítima. Precedentes citados: HC 56.961-PR, DJ 7/2/2008;HC 33.618-SP, DJ 6/2/2006, e REsp 729.772-RS, DJ 7/11/2005. REsp1.164.953-MT, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 27/3/2012.


Excertodo acórdão:


“Aquestão relativa à pluralidade das vítimas e ao patrimônio únicodo crime de latrocínio  traz  inúmeras  controvérsias  na doutrina  e  na  jurisprudência.  Esta  Corte  possui precedentes nosentido de que, no crime de latrocínio (art. 157, § 3.º, partefinal, do Código Penal),  uma  única subtração  patrimonial  com dois  ou  mais resultados  morte  caracterizaria concurso  formal impróprio.  Nesse  sentido:  HC  56.961/PR,  5.ª  Turma,  Rel. Ministra LAURITA VAZ, DJ de 07/02/2008; HC 33.618/SP, 6.ª Turma,Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO,  DJ  de  06/02/2006;  REsp 729.772/RS,  5.ª  Turma,  Rel.  Ministro  JOSÉ ARNALDO DA FONSECA,DJ de 07/11/2005.


Nãoobstante, há julgados deste Tribunal Superior sufragando oentendimento de que a morte de mais de uma pessoa com a subtraçãode um só patrimônio configura crime único.  Nesse  diapasão:  HC 91.231/RJ,  5.ª  Turma,  Rel.  Ministro  ARNALDO  ESTEVES LIMA, DJede 03/08/2009; HC 83.326/BA, 5.ª Turma, Rel. Ministro ARNALDOESTEVES LIMA,  DJe  de  09/03/2009;  HC  86.005/SP,  5.ª  Turma, Rel.  Ministra  JANE  SILVA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG), DJde 17/12/2007.


No casoem comento, restou comprovado que os Recorrentes, o corréu RogérioFernando  Gonçalves  de  Carvalho  e  outros  indivíduos  não identificados,  previamente conluiados e com unidade de propósitos,dirigiram-se à fazenda de VALDÉCIO RAMOS DA COSTA para cometer umassalto. Chegando ao local, renderam os familiares do proprietário,PEDRO  RAMOS  DA  COSTA,  ANTÔNIA  MARQUES  NUNES,  TEREZINHA  ALVESBELÉM, JACONIAS RIBEIRO LOPES, e um amigo que os visitava, ANTÔNIOPEREIRA DA SILVA.


Os Acusados  subtraíram  bens  pertencentes  a  VALDÉCIO,  TEREZINHA e JACONIAS.  VALDÉCIO  e  ANTÔNIO  foram  conduzidos  à  área externa  da  residência, tiveram mãos  e pés  amarrados, foramobrigados  a  ajoelhar no gramado  e receberam vários tiros àqueima-roupa pelas costas, vindo ambos a falecer em virtude dosferimentos sofridos.


(...)


As instâncias  ordinárias,  após  o  cotejo  minucioso  das  provas produzidas  ao longo  da  instrução  criminal,  decidiram  que  os Acusados  desejavam  "praticar  mais  de  um latrocínio,  tendo em  cada  um  deles  consciência  e  vontade,  quando  efetuaram os  disparos contra  as  vítimas ".  Destacou-se  que  os Agentes  não  se  voltaram  apenas  contra  um patrimônio, mas contra o de todas  as vítimas,  embora não tenha subtraído o deANTÔNIO MARQUES  NUNES.  Outrossim,  o  acórdão  recorrido concluiu  inarredavelmente  que  os crimes resultaram de desígniosautônomos.


(…)


Assim,tendo em vista o contexto acima delineado, conclui-se que foiacertado o reconhecimento do concurso formal impróprio, afastando-sea tese de crime único para os delitos  de  latrocínio.  As  penas devem  ser  aplicadas  cumulativamente,  ante  a  expressa disposiçãoda parte final do art. 70 do Código Penal.


Comefeito, tendo sido produzido o resultado morte, o crime de latrocínioestá consumado,  ainda que não tenha havido  a subtração da coisa, nos termos do  entendimento jurisprudencial  de  há  muito consagrado  na  Súmula  n.º  610  do Supremo  Tribunal  Federal:"[h]á  crime  de latrocínio,  quando  o homicídio  seconsuma,  ainda  que não realize  o agente  a subtração  de bensda vítima". Por conseguinte, se foram duas as mortes, ainda queapenas um patrimônio lesado, há concurso entre dois latrocínios.”



SextaTurma



PRINCÍPIODA IDENTIDADE FÍSICA DO JUÍZ. JUÍZA SUBSTITUTA.



Não háofensa ao art. 399, § 2º do CPP, que estatui que o juiz quepresidiu a instrução deverá proferir a sentença – identidadefísica –, na hipótese de juíza substituta tomar os depoimentosdas testemunhas de acusação e, posteriormente, ser sucedida pelajuíza titular que prosseguiu com a audiência, ouvindo astestemunhas de defesa e proferindo sentença de mérito que condenouo impetrante. Ademais, a juíza substituta estava exercendo o seumunus em caráter temporário, podendo ser designada, por ato dapresidência do tribunal, a atuar em qualquer outra vara. Por outrolado, a juíza titular tem por função, dentre outros atos, aentrega da prestação jurisdicional nos feitos conclusos parasentença. HC 219.482-SC, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em27/3/2012.


Excertodo acórdão:


“Deinício, não vislumbro a existência de ofensa ao princípio daidentidade física do juiz.


É bemverdade que o Código de Processo Penal, no § 2º do art. 399,estatui que "o juiz que presidiu a instrução deverá proferira sentença".


Nãomenos verdade é que a sentença foi prolatada quando já em vigor areferida norma, introduzida pela Lei nº 11.719/2008, a qualconsubstancia genuíno princípio de natureza processual,excepcionado apenas pelas hipóteses de convocação, licença,promoção, aposentadoria ou afastamento de magistrado (art. 132 doCPC).


Tenho,contudo, que o exame do acervo cognitivo contido nos presentes autosrevela que a Juíza sentenciante, Drª Maria Terezinha Mendonça deOliveira, presidiu parte da instrução processual, dandoprosseguimento à audiência realizada no dia 14/4/2008, quando,naquele dia, ouviu as testemunhas de defesa Rosa Alves e Maria daGraça Felisberto (fl. 110), declarando, em seguida, encerrada ainstrução.


Impendesalientar que a magistrada que conduziu, no início, a instrução,Drª Ana Luísa Schmidt Ramos Bornhausen, era Substituta e, portanto,Documento: 1129531 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado -DJe: 11/04/2012 Página 4 de 19Superior Tribunal de Justiçaencontrava-se exercendo, em caráter temporário, o ofício na 2ªVara Criminal de Florianópolis, ao contrário da Juíza que asucedeu, Drª Maria Terezinha Mendonça, que assumiu como Titular porforça do Ato nº 1491/07-GP, cabendo-lhe – nas palavras do acórdão– "a prática dos atos inerentes ao seu mister, dentre osquais a entrega da prestação jurisdicional nos feitos conclusospara sentença, situação que afasta a incidência do aludidoprincípio".


Dessaforma, não vislumbro ofensa ao art. 399, § 2º, do CPP.”



DESEMBARGADORSUSPEITO. VOTAÇÃO EM ÓRGÃO ESPECIAL.



Não hánulidade no julgamento realizado pelo órgão especial do Tribunal deJustiça, composto de vinte e quatro desembargadores, apesar de umdeles ter declarado a sua suspeição e, mesmo assim, ter participadoda votação. Tendo em vista que apenas dois desembargadores foramcontrários ao recebimento da denúncia contra a promotora dejustiça, deve-se entender que a efetiva participação do magistradosuspeito não influenciou no resultado do julgamento, circunstânciaque, nos termos da jurisprudência deste Superior Tribunal, afasta aalegação de nulidade. Também não pode ser declarada a nulidade daação penal por ilicitude das escutas telefônicas realizadas emoutro processo, que julgava terceira pessoa, sob a alegação daincompetência do magistrado que autorizou a produção da prova, combase na prerrogativa de função da paciente, pois se trata de provaemprestada, resultante do encontro fortuito, submetida ao crivo docontraditório e da ampla defesa no processo em que a paciente figuracomo denunciada. Precedente citado: HC 130.990-RJ, DJe 22/2/2010. HC227.263-RJ, Rel. Min. Vasco Della Giustina (Desembargador convocadodo TJ-RS), julgado em 27/3/2012.


Excertosdo acórdão:


“No quetange à nulidade do julgamento por participação de Desembargadorsupostamente impedido, infere-se dos autos, certidão de fl. 666,e-STJ, que o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio deJaneiro é composto de vinte e quatro Desembargadores, sendo queapenas dois votaram contra o recebimento da denúncia.


Dessaforma, a efetiva participação do magistrado suspeito nãoinfluenciou no resultado do julgamento, circunstância que, nostermos da jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, afastaa alegação de nulidade. Nesse sentido:


HABEASCORPUS. PROCESSO PENAL. JULGAMENTO DE RECURSO EM SENTIDO ESTRITOPRESIDIDO POR DESEMBARGADOR IMPEDIDO, NOS TERMOS DO ART. 252, IV, DOCPP. NULIDADE NÃO CONFIGURADA.
1. EstaCorte Superior de Justiça firmou compreensão na qual não deve serconsiderado nulo o julgamento proferido em órgão colegiado no qualparticipou Desembargador impedido, se o voto deste não foideterminante da apuração do resultado do julgamento.
2. Incasu, o resultado do julgamento se deu por unanimidade de votos, oque sustenta o argumento de que, mesmo que tenha o DesembargadorPresidente da sessão proferido voto no julgamento em questão, nãoseria suficiente para ensejar a nulidade do acórdão.
3. Ordemdenegada. (HC 130.990/RJ, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA,


(...)


Nãomerece amparo, também, a tese de nulidade e trancamento da açãopenal por ilicitude das escutas telefônicas valoradas no acórdão.Inicialmente, não se há falar na  incompetência  do  magistrado que  autorizou  a  produção  da  prova,  com  base  na prerrogativa da  paciente,  pois  ao  que  consta,  as  referidas  interceptações foram realizadas  em  processo  de  terceiro,  não  detentor  de qualquer  prerrogativa. Trata-se, portanto,  de  prova  emprestada,resultante  de  encontro fortuito,  incólume  a  qualquer notícia da sua ilicitude  no  processo  em  que foi  produzida,  bem  comosubmetida  ao crivo  do  contraditório  e  da  ampla defesa  no procedimento  em  que figura  a  paciente que,  destaque-se, impugnou  a  referida  prova  na  sua  manifestação  de  fls. 555-577, e-STJ.


Fortalece,ainda, o afastamento da ilicitude suscitada, o fato do recebimento dadenúncia  estar  lastreado  em  outros  elementos  de  convicção. Na  mesma  linha  de entendimento:


CRIMINAL.HC. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. NULIDADE  DO  PROCESSO. INTERCEPTAÇÃO  TELEFÔNICA. PROVA  EMPRESTADA  REPUTADA  ILÍCITA EM  PROCESSO ANTERIOR  PERANTE  A JUSTIÇA ESTADUAL. CONDENAÇÃO  NAJUSTIÇA  FEDERAL.  AUSÊNCIA  DE  NULIDADE.  REGULARIDADE FORMAL  DA MEDIDA.  INTERCEPTAÇÃO  TELEFÔNICA AUTORIZADA  PELO  JUÍZO ESTADUAL.  NÃO-INVALIDAÇÃO  DA PROVA  COLHIDA.  PROVA  EMPRESTADA. OUTROS  ELEMENTOS DE  CONVICÇÃO.  PROVAS  POSTERIORMENTE  OBTIDAS.ILEGALIDADE.  INVIÁVEL  APRECIAÇÃO  EM  SEDE  DE  HABEAS CORPUS.ORDEM DENEGADA.
I. Hipótese  em  que  a  denúncia  se  baseou  em  peças informativas provenientes de transcrições captadas em escutastelefônicas, integrantes de processo  criminal  da  Justiça Estadual,  no  qual  referidas  provas  foram consideradas ilícitas.
II.Condenação com base em farto conteúdo probatório dos autos,incluídas as interceptações telefônicas.
III. Medida  realizada,  em  princípio,  nos  moldes  determinados  na Lei 9.296/96.
IV.Eventual declinação de competência que não tem o condão deinvalidar a prova até então colhida. Precedentes.
V. Independentemente  de se  tratar  de  utilização  de  prova emprestada,  as mesmas foram  reputadas legítimas na presente  açãopenal,  adicionado  ao fato de que outros elementos de convicçãoforam utilizados para a formação do juízo condenatório, afastandoa alegação de nulidade. Precedentes.
VI.Inviabilidade de análise da ilegalidade das demais provas, em funçãodo que foi produzido e a sua relação com a denúncia e com acondenação, em face  do  incabível  exame  do  conjunto  fático probatório  que  se  faria necessário, inviável na via eleita.
VII. Ordem  denegada.  (HC  66.873/SP,  Rel.  Ministro  GILSON  DIPP,QUINTA TURMA, julgado em 17/05/2007, DJ 29/06/2007, p. 674)”

Poemas Antiproibicionistas

“Me contem, me contem aonde eles se escondem?
atrás de leis que não favorecem vocês
então por que não resolvem de uma vez:
ponham as cartas na mesa e discutam essas leis” Planet Hemp

A seção Cartas na mesa é composta por opiniões de leitores e membros do DAR acerca das drogas, de seus efeitos político-sociais e de sua proibição, e também de suas experiências pessoais e relatos sobre a forma com que se relacionam com elas. Vale tudo, em qualquer formato e tamanho, desde que você não esteja aqui para reforçar o proibicionismo! Caso queira ter seu desabafo desentorpecido publicado, envie seu texto para coletivodar@gmail.com e ponha as cartas na mesa para falar sobre drogas com o enfoque que quiser.
O texto desta semana vem de dentro do movimento, e tenta descrevê-lo de uma forma diferente, lírica: em versos. Apresentamos “Os antiproibicionistas estão chegando: e pra eles já chega”, poema do Júlio Delmanto, jornalista e membro do DAR.

Os antiproibicionistas estão chegando: e pra eles já chega

cansados de tanta morte
os antiproibicionistas vão às ruas
por paz/saúde/informação/justiça/democracia/educação/respeito/tolerância/pão
- e por liberdade para si
por que não?
por liberdade para si
ocupam as ruas
os antiproibicionistas
e por liberdade para ti
para mi
por que não?
o direito que falta aos antiproibicionistas
não falta só aos antiproibicionistas
entendem os antiproibicionistas
enquanto sonham suas trincheiras indo e vindo
se misturindo
com as de pobres, mal pagos, pretos, favelados, presos, viados, vadias, mal amados, fudidos, desviados, sapatas, noiados, travecos, amalucados, mendigos, desempregados
como o mar
que alimenta a praia
enquanto se alimenta dela
cansados do massacre
de tanta toga tanta bota tanta bala tanto medo tanta merda
os antiproibicionistas
preferem as ruas
do que a resignação
o sempre foi assim
o eu gostaria mas prefiro não não
cansados dessa war
o desejo maior
dos antiproibicionistas é que venham às ruas
- não os proibicionistas
que bem sabem bem
qual verde priorizam, qual amarelo aprisionam, qual vermelho derramam -
mas aqueles que
se não são
antiproibicionistas
tampouco podem ser
proibicionistas:
mesmo que não queiram fumaça em seus pulmões
em nome disso não podem permitir
ela na testa de seus filhos ou saindo de seus colchões
podem?
nada esperam
os antiproibicionistas
dos que matam para melhor viver
pouco podem
os antiproibicionistas
sem colar os ombros nesses filhos dos escombros
que mesmo quando matam nos interrogam
que outro puto jeito há pra se sobreviver

Débora Diniz

(Débora Diniz, especial para O Estado de S. Paulo) Ainda estou para entender o que os magistrados brasileiros descrevem como “realidade”. Muito antes da pós-modernidade, essa palavra provocava tremores nos cientistas sociais. A realidade depende de quem a descreve e, mais ainda, de quem experimenta sua concretude na própria pele. A tese de que o Direito precisa se “adequar às mudanças sociais” foi a sustentada pela ministra do Superior Tribunal de Justiça Maria Thereza de Assis Moura para inocentar um homem adulto que violentou sexualmente três meninas de 12 anos. Não haveria absolutos no direito penal, defendeu a ministra,  pois os crimes dependem da “realidade” das vítimas e dos agressores. Foram as mudanças sociais que converteram as meninas em prostitutas ou, nas palavras da ministra Maria Thereza, “as vítimas, à época dos fatos, lamentavelmente, já estavam longe de serem inocentes, ingênuas, inconscientes e desinformadas a respeito do sexo”.
“Já estavam longe” foi um recurso discursivo que atenuou o sentido imperativo do julgamento moral da ministra sobre as meninas. Uma forma clara de traduzir seu pronunciamento sobre o caso é ignorar a atenuante e reler os adjetivos por seus antônimos. “As meninas eram culpadas, maliciosas, conscientes e informadas a respeito do sexo”, por isso não houve crime de estupro. Para haver crime de estupro, segundo a tese da ministra, é preciso desnudar a moral das vítimas, mesmo que elas sejam meninas pré-púberes de 12 anos. O passado das meninas - cabuladoras de aulas, segundo o relato da mãe de uma delas, e iniciadas na exploração sexual - foi o suficiente para que elas fossem descritas como prostitutas. Apresentá-las como prostitutas foi o arremate argumentativo da ministra: não houve crime contra a liberdade sexual, uma vez que o sexo teria sido consentido. O agressor foi, portanto, inocentado.

Descrever meninas de 12 anos como prostitutas é linguisticamente vulgar pela contradição que acompanha os dois substantivos. Não há meninas prostitutas. Nem meninas nem prostitutas são adjetivos que descrevem as mulheres. São estados e posições sociais que demarcam histórias, direitos, violações e proteções. Uma mulher adulta pode escolher se prostituir; uma menina, jamais. Sei que há comércio sexual com meninas ainda mais jovens do que as três do caso - por isso, minha recusa não é sociológica, mas ética e jurídica. O que ocorria na praça onde as meninas trocavam a escola pelo comércio do sexo não era prostituição, mas abuso sexual infantil. O estupro de vulneráveis descreve um crime de violação à dignidade individual posterior àquele que as retirou da casa e da escola para o comércio do sexo. O abuso sexual é o fim da linha de uma ordem social que ignora os direitos e as proteções devidas às meninas.

Meninas de 12 anos não são corpos desencarnados de suas histórias. As práticas sexuais a que se submeteram jamais poderiam ter sido descritas como escolhas autônomas - o bem jurídico tutelado não é a virgindade, mas a igualdade entre os sexos e a proteção da infância. Uma menina de 12 anos explorada sexualmente em uma praça, que cabula aulas para vender sua inocência e ingenuidade, aponta para uma realidade perversa que nos atravessa a existência. As razões que as conduziram a esse regime de abandono da vida, de invisibilidade existencial em uma praça, denunciam violações estruturais de seus direitos. A mesma mãe que contou sobre a troca da escola pela praça disse que as meninas o faziam em busca de dinheiro. Eram meninas pobres e homens com poder - não havia dois seres autônomos exercendo sua liberdade sexual, como falsamente pressupôs a ministra.

O encontro se deu entre meninas que vendiam sua juventude e inocência e homens que compravam um perverso prazer. Sem atenuantes, eram meninas exploradas sexualmente em troca de dinheiro.

Qualquer ordem política elege seus absolutos éticos. Um deles é que crianças não são seres plenamente autônomos para decidir sobre práticas que ameacem sua integridade. Por isso, o princípio ético absoluto de nosso dever de proteção às crianças. Meninas de 12 anos, com ou sem história prévia de violação sexual, são crianças. Jamais poderiam ser descritas como “garotas que já se dedicavam à prática de atividades sexuais desde longa data”. Essa informação torna o cenário ainda mais perverso: a violação sexual não foi um instante, mas uma permanência desde muito cedo na infância. Proteger a integridade das meninas é um imperativo ético a que não queremos renunciar em nome do relativismo imposto pela desigualdade de gênero e de classe. O dado de realidade que deve importunar nossos magistrados em suas decisões não é sobre a autonomia de crianças para as práticas sexuais com adultos. Essa é uma injusta realidade e uma falsa pergunta.  A realidade que importa - e nos angustia - é de que não somos capazes de proteger a ingenuidade e a inocência das meninas.

* Debora Diniz é professora da UNB e pesquisadora da Anis: Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero

Criança Indígina e Direitos Fundamentais. Grande debate

Com grande satisfação, encaminhamo a programação do Ciclo de Debates intitulado “A criança indígena e os seus direitos fundamentais”, bem como o convite virtual do evento e do lançamento do livro “Criança Indígena: Um Olhar Multidisciplinar. Mais detalhes sobre o evento também podem ser verificados no site www.criancaindigena.com.br 


Programação
19 de Abril
19h30 – Abertura
“1º Ciclo de Debates Criança Indígena e seus Direitos Fundamentais”

Participação especial:
Marina Silva
Tema – A criança indígena no contexto nacional
Senador Vital do Rego Filho
Tema –Levantamentos da CPI sobre a subnutrição da criança indígena

20h00 – Coquetel
Lançamento da obra coordenada pela procuradora de Justiça Ariadne Cantú “Criança Indígena – Olhar Multidisciplinar”.

20 de Abril
8h00 às 09h40 – MESA 1
Convidados:
Paulo Afonso Garrido de Paula, procurador de Justiça e um dos autores do anteprojeto de lei que originou o ECA.
Tema – A criança indígena e o ECA.

Mirian Maria José dos Santos, presidente do CONANDA.
Tema – O desafio do poder público na questão da criança indígena.

Ariadne de Fátima Cantú da Silva, procuradora de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul.
Tema – Crianças Indígenas e a adoção.

Debatedores:
Joenildo de Sousa Chaves - Desembargador TJMS
Renzo Siufi - Promotor de Justiça de Mato Grosso do Sul
Dra. Soraya Soares da Nóbrega Escorel – Promotora de Justiça e 1ª Secretária da Diretoria da ABMP

09h40 às 10h00 – coffe break

10h00 às 11h30 – MESA 2
Convidados:
Luiz Eduardo Canto Bueno, Procurador de Justiça do Estado do Paraná e Coordenador do CAOP Indígena.
Tema – Atuação do CAOP Indígena e sua importância no enfrentamento de questões afetas à infância.

Tiago Tanaka Nakawa, juiz do TJMS.
Tema – Justiça Restaurativa indígena.

Willian Lira de Souza, Ministério Público do Estado do Paraná.
Tema – Atribuição do MPE na questão indígena: a interação como meio de solução dos conflitos culturais.

Debatedores:
Des. Luiz Carlos Santini - Desembargador do TJ/MS
Rodrigo Lopes da Costa – Presidente do CEDCA

11h30 às 13h30 – INTERVALO

13h30 às 15h40 – MESA 3
Convidados:
Ana Keila Mosca Pinezi , antropóloga – UFABC.
Tema – Apontamentos sobre a dinâmica cultural e identidade indígena

Antonio Hilário Aguilera Urquiza, antropólogo - UFMS.
Tema – Diversidade Cultural e Educação das crianças indígenas

Sônia Grubits, doutrora em Psicologia com vários livros publicados.
Tema – Reflexões sobre a construção da identidade da criança indígena

Debatedores:
Tonico Benites – Representante da Associação Brasileira de Antropologia,  líder Guarani Kaiowá, Mestre e Doutor em Antropologia UFRJ.
Flávio Vicente Machado –  Conselheiro do CIMI
Edson Fagundes – Representante da FUNAI
Samia Roges Jordy Barbieri – Presidente da Comissão Permanente de Assuntos Indígenas da OAB/MS

15h40 às 16h00 – coffe break

16h00 às 17h00 – MESA 4
Convidados:
Élcio Felix D´Angelo,  promotor de Justiça do Ministério Público de Mato Grosso do Sul.
Tema – A consequência dos crimes contra a vida na educação da criança e dos adolescentes indígenas.

Luiz Henrique Eloy Amado, índio terena mestrando em Progresso de Desenvolvimento Local na UCDB, advogado e assessor jurídico do CIMI.
Tema – Criança indígena.

Dr. Rubens Trombini, pediatra.
Tema – Aspectos importantes sobre a saúde da criança indígena

Debatedores:
Nelson Carmelo Olazar  - Representante do SESAI e chefe do DSEI de Mato Grosso do Sul;
Elcio Terena – Representante do Conselho Regional de Psicologia e presidente do Conselho Municipal dos direitos e defesas dos povos Indígena de Campo Grande.

Um muro – dois mundos – uma só humanidade, João Marcos Buch

http://www.clicrbs.com.br/anoticia/jsp/default2.jsp?uf=2&local=18&source=a3725692.xml&template=4187.dwt&edition=19394&section=892

A NOTÍCIA (13/04/2012)

13 de abril de 2012. | N° 1462
ARTIGO
Um muro – dois mundos – uma só humanidade, João Marcos Buch*


“É um muro e dois mundos, temos que beber um destilado, preciso acalmar minh’alma.” Era um amigo que, a pedido, havia ido até o presídio fazer uma gentileza dentro de sua especialidade acadêmica.
A expressão parece ingênua, mas não é. Assim se reportam a mim as muitas pessoas, estudantes de direito, novéis advogados, profissionais diversos após a primeira visita ao presídio e o contato com aquele mundo, separado por um muro.
Refleti algum tempo se deveria usar este espaço em “A Notícia” para falar sobre situações que envolvam o complexo prisional de Joinville. É um espaço em que as opiniões são pessoais, não refletindo necessariamente uma instituição ou classe. Poderia eu causar confusão ao leitor sobre se estaria falando pelo Judiciário ou em caráter particular. Resolvi que sim, que o tema é premente e devo utilizar este meio para, no mínimo, provocar debate, desde, é claro, com o alerta, ora feito, de que não é uma posição oficial. É a opinião de alguém que expressa a necessidade de todos, instituições públicas e privadas, universidades, sociedade e indivíduos, pensarmos na melhor forma de tratar da delicada situação do Presídio Regional de Joinville. Alguém que afirma sempre a importância do fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana, irrenunciável, não importa a ação praticada. Alguém que percebe que as vítimas dos crimes devem ser lembradas e amparadas, mas que também verifica que aquele que perdeu a liberdade não pode perder a saúde, o trabalho, a educação, a higiene, a cultura, o afeto, a condição humana, enfim, sob o risco de reagir com maior violência do que aquela que o colocou na prisão.
Há mais de dez anos em Joinville, preocupo-me, penso, trabalho, estudo, leio, ouço, converso e respiro o fenômeno da violência e da criminalidade, no mais próximo da racionalidade e ponderação que me é possível. Vi a população carcerária de Joinville dobrar, as deficiências aumentarem, o Estado faltar e ainda assim incessantemente busco soluções, em que acredito numa certeza dogmática. Portanto, posso dizer, com clareza solar, que o Presídio Regional de Joinville precisa de ajuda. O Estado deve voltar seus olhos para ele, com projeto global urgente. A iniciativa privada precisa se propor a auxiliar. A sociedade carece pensar melhor no assunto. Juntos, é fato, alcançaremos nossos objetivos, com amparo às vítimas, qualidade de trabalho para os agentes penitenciários, equipamentos básicos para segurança, instalações adequadas para familiares em visita e, principalmente, respeito à dignidade do preso, no sentido mais profundo e histórico que a dignidade da pessoa humana possa significar.
“Mais forte é o muro na mente das pessoas, a humanidade é uma só e o futuro nos cobrará. Você está fazendo a sua parte, não precisa de destilado algum”, respondi ao meu amigo.
*Juiz de direito da Vara de Execuções Penais da Comarca de Joinville

CNJ Pesquisa

http://www.cnj.jus.br/pesquisas-judiciarias/cnj-pesquisa

Processo Eletrônico TRF 4a Região



http://www.conjur.com.br/2012-mar-10/digital-realidade-justica-federal-sul-pais

http://www.conjur.com.br/2012-abr-08/entrevista-eduardo-picarelli-diretor-foro-justica-federal-gaucha


http://www.conjur.com.br/2012-mar-20/juizes-advogados-canadenses-dao-dicas-processo-eletronico

CONJUR: A tomada de poder pelos estagiários e o novo regime, por Lenio Luiz Streck

12 abril 2012
Senso incomum

A tomada de poder pelos estagiários e o novo regime

Respeito muito os estagiários. Esta coluna é uma homenagem a eles e, especialmente, àqueles que trabalha(ra)m em meu gabinete nestes anos todos. Valorosa classe. Inicio com uma citação:
“Embora a qualidade média das decisões judiciais possa não ter diminuído em conseqüência da atribuição de redigi-las a estagiários, a variação de qualidade diminuiu. Os estagiários de direito – que em sua maioria, são indivíduos recém-formados em direito, com referências acadêmicas extraordinárias, mas sem experiência em direito ou em qualquer outra profissão – são mais homogêneos que os juízes. A tendência à uniformidade da produção, também característica das petições redigidas pelos grandes escritórios de advocacia, encontra equivalência na evolução em direção à fabricação em massa de produtos...”.
Não se empolguem aqueles críticos que sempre acham que no Brasil tudo é pior... A citação anterior é uma preocupação externada por um dos corifeus da análise econômica do direito (AED), Richard Posner – portanto, distante das minhas predileções teóricas - em relação à “estagiarização” que está ocorrendo nos Estados Unidos.
1. Todo o poder aos estagiários.
Os estagiários ainda não assumiram o poder – falo agora de terrae brasilis - porque não estão (ainda) bem organizados. Deveriam aderir à CUT. Em alguns anos, chegariam lá. Dia desses veremos os muros pichados com a frase “TODO O PODER AOS ESTAGIÁRIOS”. Afinal, eles dão sentenças, fazem acórdãos, pareceres, elaboram contratos de licitação, revisam processos... Vão ao banco. Sacam dinheiro. Possuem as senhas. Eles assinam eletronicamente documentos públicos. Eles decidem. Têm poder. Eu os amo e os temo.
Sim, eu respeito profundamente os estagiários. Eles estão difusos na República. Por vezes, invisíveis. Jamais saberemos quantos são. E onde estão. Algum deles pode estar com você no elevador neste momento. Ou em uma audiência (é bem provável até). Ou no Palácio do(s) Governo(s). Federal, estadual e municipal. Sei de vários que lá estão. E participam de reunião de gabinetes de Ministérios. Que bom. Com isso vão aprendendo. Afinal, é para isso que servem os estagiários.
Eles fazem de tudo. Neste momento, um estagiário, ou vários deles, podem estar controlando o seu voo. A Infraero tem muitos estagiários. Torço para que eles sejam tão bons quanto os que estagiam no meu gabinete. Estagiários de todo mundo: uni-vos. Nada tendes a perder senão vossos manuais recheados de enunciados prêt à porter, prêt à parler, prêt à penser que os professores vos mandam comprar. Estagiários de toda a nação: indignai-vos face à exploração a que estão submetidos.
1. A tomada do poder.
Parênteses: como seria uma revolta dos estagiários? Imaginemos uma aliança tipo “operário-camponesa”, quer dizer, uma aliança entre estagiários e os bacharéis que não passaram no Exame de Ordem. Cercariam os Fóruns e Tribunais. Juízes, Promotores, advogados e serventuários da justiça (sim, estes, dos quais muitos maltratam os pobres estagiários nos balcões de todo o Brasil) ficariam sitiados durante semanas. O armamento das forças aliadas (estagiários e bacharéis sem carteira) seria simples, mas letal: enormes catapultas, com as quais atirariam enormes manuais (aqueles que querem simplificar o direito e que, por sua causa e baixa densidade científica, os bacharéis não conseguiram passar no exame de ordem e nem nos concursos)... Conheço alguns desses compêndios que provocariam enormes estragos nos tetos dos Tribunais. Penso que nem o teto do STJ resistiria. Que, assim como os demais fóruns, repartições e tribunais, teriam um problema a mais: não somente o ataque vindo de fora, das catapultas das forças aliadas, como também de dentro. Explico: provavelmente o ataque seria lançado durante o expediente. Alguns representantes do MUNESBASC (Movimento Unido dos Estagiários e Bacharéis sem Carteira) estão fazendo alianças com os bacharéis – mesmo os com carteira - que não conseguem decifrar as questões armadilhescas dos concursos públicos (a sigla do movimento, pelo seu tamanho, é impossível de publicar). Já se fala abertamente em um putsch.
Eles formam verdadeiramente o Terceiro Estado. Lembrem-se: antes de 1789, já se ouviam rumores... Diziam coisas, mas ninguém acreditava: lá vinham eles em direção à Paris...! Hoje, os estagiários são aquele conjunto de pessoas que formavam o terceiro Estado (camponeses, comerciantes, advogados, enfim, todos os que não eram nobres ou clérigos...). E as fileiras vão engrossando.
Portanto, meu pedido inicial: estagiários de todo os fóruns, repartições, palácios e tribunais em geral: quando chegardes ao poder, poupai-me! Sou da “base aliada dos estagiários”. A diferença é que não fico exigindo, como fazem os deputados da base aliada do governo, a liberação de emendas parlamentares. Eu apoio a futura estagiariocracia sem chantagear! Outro detalhe que me favorece: eu não peço para a “base aliada” colocar minha mãe no TCU (lembram-se de um certo governador fazendo campanha para levar mamãe ao Tribunal de Contas da União? Ele conseguiu!). Quem me contou isso foi um estagiário que viu tudo...
Eles sabem de tudo. Outra vantagem minha: como sou da base aliada dos estagiários, não mando a conta da arrumação dos meus dentes para o Senado (portanto, é a patuléia quem paga), como fez, no ano passado, o agora presidente da comissão de ética, senador Valadares. E nem uso o que resta das minhas cotas de passagens aéreas para levar familiares (ou namoradas) para a Disney ou para Paris. Nem quero o Ministério da Pesca. Eu também não sei pescar, assim como o ministro Crivella. Só sei escrever. Um pouco.
2. Depois da revolução. Como seria o nouveau régime? O adeus ao ancièn régime.
Eu apoio a futura estagiariocracia sem exigir cargos ou favores. Já ofereço, desde já, a minha biblioteca para o nouveau régime. Ela pode ser expropriada. Vamos melhorar o ensino jurídico brasileiro. Tenho uma lista enorme de livros a indicar. Bons autores. Nenhum deles trará as lições de autores como Dworkin, Habermas, Gadamer, Rui Barbosa, Pontes de Miranda, Heleno Fragoso, Alexy, Kelsen, etc, de “orelha” (aqui, cada leitor pode fazer a sua lista – não quero polemizar nessas simples referências). Nada de pequenos resumos. Fora com as vulgatas. Vamos estudar de verdade. No novo regime, o direito será encarado como um fenômeno complexo. Portanto, não haverá mais espaço para “literatura piriguete” (quer algo mais fácil que “piriguete”?) Também na pós-graduação (mestrados e doutorados) não mais serão feitas dissertações ou teses sobre temas monográficos como “agravo de instrumento”, “o papel do oficial de justiça”, “reflexões sobre os embargos infringentes”; “(re)pensando o artigo 25 do Código do Consumidor – uma visão critica”; “um olhar sistêmico sobre a progressão de regime” ou “execução de pré-executividade: reflexões à margem”... (permitam-se as licenças poéticas).
Sim, tudo mudará. Os estudantes não mais serão enganados pelo professor que só sabe dar aula usando Power Point e fica lendo o que está nesse “pauerpoint” (observação: se o professor insistir, passará a remeter o material via email para os alunos, que poderão ficar em casa lendo aquilo que, até então, ele lia para eles no pauerpoint...). PS: antes que alguém se atravesse (ou se irrite), registro: sim, eu valorizo bastante as novas tecnologias... Só acho que não podem ser um fim em si mesmo. O instrumento não substitui o saber.
No nouveau régime, será proibido ao professor ficar lendo o artigo do código para os alunos e, em seguida, “explicar” – fazendo caras e bocas - o que “dizem as palavras da lei...”. Será proibido invocar coisas metafísicas como “a vontade da norma” (como sabemos, “norma” só tem vontade se for uma senhora que convidamos para jantar). Sugeri isso para a pauta da Estagiariocracia porque essa discussão me é muito cara. De há muito.
Também não haverá mais a invocação do “espírito do legislador” e não haverá mais perguntas “inteligentes” como “o que o legislador quis dizer aqui”? (neste caso, sempre haverá um aluno – espião do regime – que entregará um celular pré-pago ao professor sugerindo-lhe que ele mesmo, o mestre, ligue para “o legislador” e pergunte...).
Com o tempo, os alunos, a partir desse novo programa pedagógico, já poderão entender as anedotas e os sarcasmos que eu conto em minhas palestras... Até as finas ironias (não só as minhas, é claro) serão compreendidas. Já não agüento mais contar a estória dos rabinos que estudavam o Talmude, o Livro Sagrado... Mas, é claro, não contarei aqui. Não mais precisarei explicar que interpretar não depende de placar ou de maioria... E que quando o Rabino Eliezer disse... Bem, deixemos assim. Na próxima conferência, que será em Natal (Congresso em Homenagem ao Min. Gilmar Mendes), prometo que contarei (de novo). Ainda: quando falo do sujeito solipsista, não será mais preciso estroinar no final, desfazendo o silêncio com brincadeiras do tipo “o Selbstsüchtiger (sim, é esse o nome do sujeito egoísta da modernidade, esse do esquema sujeito-objeto) não é o volante do Bayern de Munique... O novo regime será muito bom. Já estou antevendo isso. Alvíssaras.
Mas, tem mais: no nouveau régime — pelo menos até que ocorra a restauração (sempre ocorre, pois não) do ancièn régime e nossas cabeças sejam cortadas — mudaremos os atuais currículos dos cursos jurídicos. E os concursos públicos não mais perguntarão sobre a vida e obra de gêmeos xifópagos e nem sobre a transformação de homens em lagartos (nunca vou esquecer isso). As questões não mais versarão sobre enfiteuse e nem serão armadilhas (pegadinhas malandras que só divertem o nécio que a elaborou). Não mais será necessário decorar a Constituição e os Códigos para fazer concurso; as perguntas, no novo regime, buscarão detectar efetivamente o que os candidatos sabem; também o Exame de Ordem não trará mais perguntas que somente o argüidor saiba ou baseadas no único livro que o argüidor leu ou conhece.
Nessa nova era, as provas de concursos não serão mais feitas para divertir os arguidores. Não. Nunca mais. E haverá fortes punições. Por exemplo, quem fizer perguntas do estilo “pegadinhas” ou sobre coisas ridículas (p.e.x., Caio e Tício que embarcam em uma tábua e depois se matam...), terá que resolver as questões do mesmo concurso feitas pelos seus colegas de banca. E essa prova será oral... na presença de todos os concurseiros (como na arena romana). E cabeças rolarão!
No nouveau régime, extinguiremos (me coloco no meio porque me considero, como já disse, da “base aliada dos estagiários”) os embargos declaratórios e os juízes não mais farão sentenças obscuras, contraditórias ou omissas. No novo regime, o art. 93, IX será cumprido na íntegra. E não será mais necessário fazer agravo do agravo; e nem embargos do agravo e embargos do agravo do agravo. Na nova ordem que será instaurada, o Supremo Tribunal Federal declarará a inconstitucionalidade dos embargos declaratórios (ou os declarará não recepcionados, antes que alguém me corrija e diga que, em sendo o art. 535 do CPC anterior a Constituição, não cabe ADI – embora caiba ADPF, pois não?).
No novo regime, não mais se decidirá conforme o que cada-um-pensa-sobre-o- mundo-e-o-direito, mas, sim, a partir do que diz a doutrina e a jurisprudência, com coerência e integridade. O direito terá um DNA. As denuncias do Ministério Público somente serão deduzidas quando efetivamente existirem indícios. Não bastará juntar reportagens de revistas, por exemplo. E serão recebidas de forma amplamente fundamentadas.
Nesse novo tempo, não será mais permitido construir princípios estapafúrdios. Até que saibamos, de fato, o que é um Princípio, sua “fabricação” estará suspensa. Proibida! Vamos separar o joio do trigo. Como Medida Provisória n. 1, já de pronto ficam revogados “princípios” como “da ausência ocasional do plenário”, “da rotatividade”, “do fato consumado”, “da confiança no juiz da causa”, “da delação impositiva”, “alteralidade”, da “benignidade”, “do deduzido e do dedutível”, “da afetividade” e “da felicidade” (embora todos queiramos ser felizes!).... Estão fora ab ovo. Ficará também vedado o uso da ponderação de valores, a não ser que haja a comprovação de que o utente tenha construído a regra adstrita... Portanto, nada de pegar um princípio em cada mão e recitar o mantra da “ponderação”.
No nouveau régime que se instalará, o sistema acusatório prevalecerá no processo penal. Inclusive o art. 212 do CPP será cumprido. O STJ e o STF anularão todos os processos em que não for obedecido o novo modo de inquirição das testemunhas. O descumprimento do art. 212 não será mais “nulidade relativa”; será, sim, nulidade absoluta. Finalmente, a nova lei será cumprida e os advogados e promotores deverão eles mesmos produzir as provas. O juiz inquisidor terá seus dias contados.
Já no processo civil, não mais se falará em “escopos processuais”. Finalmente, o instrumentalismo será sepultado. As cinzas de Oskar von Büllow serão jogadas na costa brasileira e sua alma, juntamente com as de Liebmann (e outros...), descansarão em paz. Tudo graças ao nouveau regime.
Também o direito administrativo será levado a sério. Será vedada a sua “descomplicação” (é um sarcasmo!). Você não será mais multado por qualquer guarda de trânsito sem a possibilidade de defesa. Não mais bastará a palavra dele. Ele não terá mais “fé pública”. A Constituição triunfará. Todos dirão: viva, o direito administrativo não é mais só para fazer grandes congressos... Ou para fazer dissertações de mestrado. Agora vai valer mesmo. Inclusive os recursos que o advogado interpuser contra as multas serão lidos na íntegra pelas juntas. As juntas, quando negarem os recursos, fundamentarão as decisões. E já não se falará de outra coisa...
No direito penal, os tipos penais de perigo abstrato sofrerão uma forte censura (filtragem) hermenêutico-constitucional. Cada caso concreto será examinado à luz da presunção da inocência e, se necessário, será aplicada a técnica da Teilnichtigerklärung ohne Normtextreduzierung. É verdade. Finalmente, implementaremos o controle difuso para valer e este não mais servirá apenas para ornamentar dissertações e teses.
Nos crimes de furto, o sistema fará uma escolha: ou aplicará o critério da insignificância dos crimes de descaminho também para o furto ou os crimes de contrabando ou descaminho também serão avaliados de acordo com as balizadoras do furto. A isonomia será para valer. Inclusive na comparação entre a devolução do valor furtado com o pagamento dos tributos nos casos de sonegação. Fairness (equaninimidade), essa será a palavra mais usada. Isonomia. Igualdade. Estes serão os critérios norteadores dos tribunais.
Também o art. 557 do CPC será usado com mais parcimônia pelos tribunais. O nouveau régime dará cursos para evitar tantas decisões monocráticas... O CNJ baixará recomendação para que sejam revitalizados os juízos colegiados. Também os advogados, ao fazerem sustentações orais, serão ouvidos. Ninguém ficará mexendo nos computadores enquanto o causídico se esfalfela na Tribuna. Todos prestarão atenção.
No nouveau régime, uma portaria não valerá mais do que a Constituição. Nunca mais. O Ministro da Fazenda não legislará mais por resoluções. Nwem o da Previdência. A Comissão de Constituição e Justiça do Congresso examinará os projetos previamente. As ONG’s serão fiscalizadas. Muitos dos atuais dirigentes terão que trabalhar de verdade. Os atores da Globo não mais usarão os benefícios da Lei Rouanet. Oas Estádios da Copa não serão superfaturados. A fiscalização será implacável. E o crime de Fraude à Licitação não será mais punido com “cesta básica”.
No nouveau régime os advogados não mais serão maltratados e/ou humilhados. Eles não precisão mais implorar para serem recebidos pelos juízes. E receberão cafezinho na antessala do magistrado. Aliás, isso estará no novo Estatuto que o nouveau régime implantará. E, o que é melhor, o Estatuto dos Advogados será cumprido. Ah, no novo regime...!
Pronto. Eis as bases do putsch. Mas não quero ser o Robespierre desse regime. Pela simples razão de que este perdeu a cabeça. Falando mais sério ainda: um pouco de utopia vai bem. Nestes tempos de atopia e acronia, mirar um lugar inalcançável pode fazer bem ao nosso espírito. Um pouco de desconstrução do sistema pode levar a boas reconstruções. Como diz meu poeta favorito, Manoel de Barros, sempre compreendo o que faço depois que já fiz! Só esta frase já daria para fazer uma tese. Pura fenomenologia. Mas, o que quer dizer isto? No nouveau régime saberemos. Aliás, no novo regime os estudantes lerão Manoel de Barros. E tantos outros bons livros. E o Google não mais mentirá, porque será alimentado por jovens que refletem e não por aqueles que apenas se informam!
Numa palavra final. Estamos no mundo pela metáfora. E estamos nele porque simbolizamos. O texto acima também se pretende “metáfora”. Mas não pode ser somente uma metáfora. Como disse Wittgenstein — e cito-o, de cabeça, pela boca de Ruben Alves —, andaimes cercam a casa, mas não são a própria casa; uma vez construída a casa, desmontam-se os andaimes. Pois é. As metáforas talvez sejam isso. Nietschze talvez me ajude: tudo aquilo para que temos palavras é porque já fomos além. E, assim, fica mais fácil entender a frase acima de Manoel de Barros... Sim, sempre compreendo o que faço depois que já fiz!
Lenio Luiz Streck é procurador de Justiça no Rio Grande do Sul, doutor e pós-Doutor em Direito.
Revista Consultor Jurídico, 12 de abril de 2012

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