Quem é você? Quem somos nós?
18–01–2010 --- Envie para um amigo
por Vanessa Souza – Indivíduo singular plural, do psicólogo e psicanalista baiano Eduardo Leal Cunha, não é um livro para ler de uma só vez. São necessários vários fôlegos, pausas, retomadas. Afinal, ele junta Bauman, Barthes, Blanchot, Derrida, Foucault, Fourier… e Freud! Vou me deter, mais atenciosamente, no pai da psicanálise.
Na orelha da obra, o ótimo Joel Birman avisa que a proposta do livro é mostrar a articulação entre a concepção de identidade e a emergência da modernidade no Ocidente, o que ocorreu na construção do Estado-nação e a noção de soberania. Onde entra a psicanálise nisso? Segundo Birman, ela trouxe contribuições fundamentais para a interpretação do psiquismo. E estas, concebem outras modalidades de subjetivação, compatíveis com uma leitura do psiquismo fundado no descentramento.
Vamos então ao todo, que pareceu-me bem fragmentado. Para o sociólogo polonês Zygmunt Bauman, amplamente citado no livro, as identidades da atualidade são pensadas em um contexto de crise. Bauman afirma que o fato de vivermos em uma modernidade líquida faz com que concentremos grande parte de nossa energia em operações de vigilância – para enfrentarmos e termos sob nosso domínio a imprevisibilidade do mundo contemporâneo. Ou seja, paranóia em tempo integral com muitos mecanismos de defesa. Essa modernidade nos mostra a fragilidade e a falta de estabilidade das coisas – e das pessoas.
Já a questão do indivíduo, para Freud, começa a partir do estudo da histeria. Diz Cunha:
(…) o mecanismo de identificação aparece como o modo de pensar próprio ao inconsciente referido à articulação e ao posicionamento do indivíduo e diferentes tramas intersubjetivas, fazendo com que a experiência subjetiva ultrapasse as fronteiras da corporeidade e com que o sujeito possa, pela via do sonho, da fantasia ou sintoma, experimentar o lugar do outro ou reconhecer, no outro, algo de si.
Segundo o psicanalista, há várias noções possíveis de identidade, e usos distintos para esse termo, dispersos pela obra de Freud. E as fantasias são fundamentais nesse processo complexo da individualidade, já que elas se formam a partir de fragmentos de sentido, restos de histórias, sobras deixadas pelo outro.
(…) as fantasias trazem, no entanto, as marcas do processo primário e do inconsciente, território sem lugar para a contradição e no qual o alinhamento contínuo entre passado, presente e futuro também não faz sentido, ou melhor, não se impõe como sentido único, território no qual o prazer é o principal destino.
Cunha afirma que o ato de fantasiar é o ordenamento e reordenamento permanente, de movimentos e limites em uma rede de representações. É necessário construir o tempo todo o ponto de encontro entre o que a pulsão exige e os limites impostos pelo outro. O psicanalista conclui a obra propondo uma existência “para além de qualquer vínculo de pertencimento, em um modo de ‘viver junto’ no qual já não seja fundamental saber quem é você, ou o que deseja”.
::: Indivíduo singular plural: A identidade em questão ::: Eduardo Leal Cunha :::
::: 7 Letras, 2009, 176 páginas ::: encontre pelo melhor preço :::
Nenhum comentário:
Postar um comentário