Guia Compacto do Processo Penal conforme a Teoria dos Jogos

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Alexandre Morais da Rosa

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01/09/2010

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Conheci Maurício Ramires no excelente Programa de Pós Graduação da UNISINOS (mestrado e doutorado). Da turma dele, alguns se destacaram, desde o início, justamente porque apontavam para onde o discurso jurídico padrão manca. Não era gente preocupada em “arredondar” o discurso, em relegitimar o positivismo, nem salvar ninguém. Com suas inquietações colocaram novas interrrogações, enfim, fizeram as perguntas certas! As perguntas certas são condição de possibilidade para se responder. Assim, caso o sujeito esteja jogado numa “inautenticidade”, fora do “círculo hermenêutico”, banhado por distinções metafísicas, as questões são só aparentemente formuladas, porque, de fato, são variações sobre o mesmo tema, sem perder o tom. Disto a academia e os Manuais estão lotados. Divagações e distinções ad-hoc que, aparentemente, resolvem as questões postas diante de um “caso jurídico”, mas que servem apenas como “analgésicos decisórios”. No fundo a Teoria da Decisão manejada pelo senso comum teórico é um protocolo sem sentido, nem sabor, em que o sujeito se anula, isto é, não se faz ver. Claro que em todas estas escolhas há uma responsabilidade do sujeito. Isso porque o sujeito sempre é responsável.
Mas no mundo jurídico o analfabetismo funcional é lancinante. O “operador do direito” sabe ler o Código, compra a coleção de resumos, faz o turismo da jurisprudência – “Turisprudência” – e, no caso de certa parcela de magistrados, até conseguem decidir, mas não entendem o que fazem. É como se houvesse uma “Estrutura Dual”. No manifesto a coisa é “mostrada” com a aparência de fundamentação, num efeito estético persuasivo de semblante, enquanto no plano dos pressupostos, do latente, ou seja, do que serviu de fundamento, o vazio significante tome conta. O vazio, como tal, embora seja condição de possibilidade, no caso de decisões judiciais, numa democracia, não pode ser qualquer coisa. O julgador não está autorizado a julgar a partir de ementas e julgados embalados para presente. Os efeitos mágicos de produção em série e veloz contracenam com o descompromisso, a ausência de responsabilidade do sujeito que assina. A tradição autêntica precisa fazer barreira e não se pode deixar levar por esta deriva de sentidos.
Recompor este lugar do Poder Judiciário, lugar em que Maurício ocupa, já que juiz estadual, é o desafio do presente livro. O caminho, claro, foi bem pavimentado pelos estudos de mais de década de Lenio Luiz Streck. Com ele podemos perceber o quanto Heidegger e Gadamer são importantes para o Direito, especialmente para entender porque a “argumentação jurídica” é um engodo performático. Aliás, Lenio consegue orientar dissertações que vão ao ponto. André Karam Trindade e Rafael Tomaz de Oliveira são exemplos recentes de gente séria e que possibilita a produção acadêmica responsável. O texto é bem escrito e direto, sem floreios sem sentido e mostra com exemplos que estamos vivendo um “Estado de Natureza Hermenêutico” (Streck), em que o poder-de-dizer transformou-se num poder-de-repetir-sem-entender qualquer coisa, a saber, com a profusão de enunciados, falta enunciação.
Recentemente, também dialogando com Lenio Streck, escrevi com José Manuel Aroso Linhares (Diálogos com a Law & Economics. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009) um texto que procura apontar que esta fusão de tradições (civil e common law) não pode ser aceita como um simples encontro, muito menos como um mero diálogo de fontes, pois representa a mudança da própria maneira de compreensão do Direito, transformado em um acessório econômico, e consumível. O risco de tal proceder é que se pode decidir fora da história, sem enunciação, na mais lídima autonomia dos enunciados, em que a responsabilidade do julgador é extinta!
Talvez Peter Sloterdijk possa ser um companheiro de caminhada ao apontar que a “razão cínica” opera no contemporâneo, especialmente no campo jurídico, pois neste campo (i) não se verificou a viragem linguística, (ii) inexistem condições autênticas de uma Hermenêutica Filosófica, (iii) há uma baixa constitucionalidade e a (iv) crítica não faz mais barreira, autorizando, assim, qualquer um, do seu lugar, a dizer uma verdade por puro desconhecimento e ignorância, em todas as instâncias.
Embora a esperança possa ser manipulada desde uma perspectiva cínica, de alguma forma, ela faz parte do horizonte de sentido de quem busca pensar o que faz para além do aparato instrumental. Este é o caso de Maurício Ramires. Estava escrevendo este prefácio quando encontrei um magistrado catarinense que se rendeu aos entreguistas. Disse-me que havia cansado e que agora “decidia” (sic) conforme a orientação do STJ e do STF. Havia renunciado ao seu lugar de magistrado e, dizia ele, “negava-se a dar falsas esperanças”. Para ele o jogo está dominado e nada se pode fazer. A batalha pela judicialização da política (Werneck Vianna) era inglória. Está preocupado e me dizia – entuasiasmado – em tornar o Poder Judiciário eficiente, não fosse ela, a eficiência, uma fraude (Jacinto Nelson de Miranda Coutinho e Júlio César Marcellino Jr). O que me chocou foi que sua postura é dual. Ele sabe que está sendo manipulado, mas mesmo assim faz (Zizek). Quando nos quedarmos a isto, diz Lenio Streck, temos que estocar comida, porque o mundo vai acabar. Se bem que talvez estamos tão preocupados com a crítica que não percebemos que o mundo se acabou. Bem vindo ao mundo de 1984 (Orwell)? Leia o texto e responda, se é que me entende..., diria Lenio Streck.

Alexandre Morais da Rosa. Doutor (UFPR). Professor do Programa da UFSC . Juiz de Direito do TJSC.

Um comentário:

  1. Rapaz, só pela apresentação, já comprei o livro.

    É irritante como a argumentação jurídica tende a se basear em " o STF já decidiu" e ponto.

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