Guia Compacto do Processo Penal conforme a Teoria dos Jogos

Guia Compacto do Processo Penal conforme a Teoria dos Jogos
Alexandre Morais da Rosa

Kindle - Meu livro novo

O meu livro Jurisdição do Real x Controle Penal: Direito & Psicanálise, via Literatura foi publicado pela http://www.kindlebook.com.br/ na Amazon.
Não precisa ter o Kindle. Pode-se baixar o programa e ler o livro. CLIQUE AQUI

AGORA O LIVRO PODE SER COMPRADO NA LIVRARIA CULTURA - CLIQUE AQUI

Também pode ser comprado na LIVRARIA SARAIVA - CLIQUE AQUI

LIVROS LUMEN JURIS - CLIQUE AQUI

19/09/2010

Contardo Calligaris - FSP 26.08.2010



CONTARDO CALLIGARIS – FSP de 26-08-2010
Para que serve a psicanálise?

"A quem luta para se manter adulto, o paternalismo dá calafrios, ou mesmo vontade de sair atirando ..."

________________________________

Para que serve, hoje, a psicanálise? A campanha eleitoral em curso me ajuda a escolher uma resposta.

Repetidamente, o presidente Lula e Dilma Rousseff se apresentam como pai e mãe dos brasileiros. Em 17/8, Lula declarou: "A palavra não é governar, a palavra é cuidar: quero ganhar as eleições para cuidar do meu povo, como a mãe cuida de seu filho".
No dia seguinte, Marina Silva comentou: "Querem infantilizar o Brasil com essa história de pai e mãe". Várias vozes (por exemplo, o editorial da Folha de 19/8) manifestaram um mal-estar; Gilberto Dimenstein resumiu perfeitamente: "Trazer a lógica familiar para a política significa colocar a criança recebendo a proteção de um pai em vez de um governante atendendo a um cidadão que paga imposto".

Entendo que um presidente ou uma candidata se apresentem como pai ou mãe do povo. Embora haja precedentes péssimos (de Vargas a Stálin, ao ditador da Coreia do Norte, Kim Jong-il), estou mais que disposto a acreditar que Lula e Dilma se expressem dessa forma com as melhores intenções.

O que me choca é que eleitores possam ser seduzidos pela ideia de serem cuidados como crianças e preferi-la à de serem governados como adultos.

Se o governo for paternal ou maternal, o que o cidadão espera nunca será exigível, mas sempre outorgado como um presente concedido por generosidade amorosa; o vínculo entre cidadão e governo se parecerá com o tragipastelão afetivo da vida de família: dívidas impagáveis, culpas, ciúme passional etc. Alguém gosta disso?

Numa psicanálise, descobre-se que a vida adulta é sempre menos adulta do que parece: ela é pilotada por restos e rastos da infância. Ao longo da cura, espera-se que essa descoberta nos liberte e nos permita, por exemplo, renunciar à tutela dos pais e ao prazer (duvidoso) de encarnarmos para sempre a criança "maravilhosa" com a qual eles sonhavam e talvez ainda sonhem.

Tornar-se adulto (por uma psicanálise ou não) é um processo árduo e sempre inacabado. Por isso mesmo, a quem luta para se manter adulto, qualquer paternalismo dá calafrios - ou vontade de sair atirando, como Roberto Zucco.

Roberto Succo (com "s"), veneziano, em 1981, matou a mãe e o pai; logo, fugiu do manicômio onde fora internado e, durante anos, matou, estuprou e sequestrou pela Europa afora. Em 1989, Bernard-Marie Koltès inspirou-se na história de Succo para escrever "Roberto Zucco", peça admiravelmente encenada, hoje, em São Paulo, na praça Roosevelt, pelos Satyros.

Na peça, Zucco perpetra realmente aqueles crimes que todos perpetramos simbolicamente, para nos tornarmos adultos: "matar" o pai, a mãe e, dentro de nós, a criança que devemos deixar de ser.

O diretor da peça, Rodolfo García Vázquez, disse que Zucco é um Hamlet moderno. Claro, para Hamlet, como para Zucco, o parricídio é uma espécie de provação no caminho que leva à "maioridade". Além disso, pai, padrasto e mãe de Hamlet eram reis, e o pai de Succo era policial. Para ambos, o Estado se confundia com a família.

Se o Estado é um pai ou uma mãe para mim, eu não tenho deveres, só dívidas amorosas, e, se esse Estado me desrespeita, é que ele me rejeita, que ele trai meu amor. Por esse caminho, amado ou traído pelo Estado, nunca me considerarei como um entre outros (o que é uma condição básica da vida em sociedade), mas sempre como a menina dos olhos do poder.

Agora, se eu me sentir traído, não me contentarei em mudar meu voto, mas procurarei vingança no corpo a corpo, quem sabe arma na mão; pois essa é a linguagem da paixão e de suas decepções. O paternalismo, em suma, semeia violência.

Enfim, se é verdade que muitos prefeririam ser objeto de cuidados maternos ou paternos a serem "friamente" governados, pois bem, nesse caso, a psicanálise ainda tem várias boas décadas de utilidade pública entre nós.

É uma boa notícia para a psicanálise. Não é uma boa notícia para o mundo fora dos consultórios.

Um comentário:

  1. Acredito que é essencial e uma postura ética que os psicanalistas se manifestem na cena pública quanto ao mal-estar na sociedade e seus sintomas.
    No entanto, decepcionei-me muito com Calligaris ao ler este artigo e até conversei com algumas pessoas sobre isso.
    A Folha de São Paulo e a revista Veja, como explica Alberto Dines, desenvolveram ultimamente um tipo de reportagem denuncista apoiada em misteriosos vazamentos, ilações, e não em investigações. Optou pelo gênero de jornalismo de cruzada (cruzading journalism), adjetivado, politizado, claramente engajado. Seus críticos e colunistas sentem-se livres para reciprocar no mesmo tom, desconsiderando liminarmente o teor e a importância do que está sendo publicado.
    Comumente, os neoliberais para recriminar um político que intervenha, contra interesses econômicos da elite, associam a busca para corrigir as injustiças e de aliviar os sofrimentos que o próprio mercado provocou, como se fosse cuidar do povo (paternalismo) ou cerceamento da liberdade do indivíduo. Nenhum dos dois, liberdade não é deixar o trabalhador assujeitado a uma relação de forças desiguais e garantir os direitos sociais básicos não é paternalismo.
    Governar também diz respeito a cuidar do povo, promover o seu desenvolvimento, garantir a educação, mas não é só isso. Logo não é fácil, sem muita reflexão, utilizar criteriosamente cada palavra quando e onde lhe seja adequado empregar. No entanto, esta não é uma questão semântica, e sim ideológica. Ou seja, estamos abordando se queremos um Estado que interfira no cenário social, ou que deixe a economia - e na realidade nunca a influência se mantém num só aspecto – vulnerável aos grandes capitais mundiais.

    Nesse sentido, Bauman nos alerta “Vivemos em tempos de desregulamentação, de descentralização, de individualização,em que se assiste ao fim da Política com P maiúsculo e ao surgimento da “política da vida”, ou seja, que assume que eu, você e todo o mundo deve encontrar soluções biográficas para problemas históricos, respostas individuais para problemas sociais. Nós, indivíduos, homens e mulheres na sociedade, fomos portanto, de modo geral, abandonados aos nossos próprios recursos”.
    Lula é transparente no afeto que deposita na política. Mas nem Lula, nem Dilma tomam atitudes como pai ou mãe do povo brasileiro. Pelo contrário, posicionam-se como Políticos engajados na luta pela justiça social e pelo desenvolvimento do país.
    No governo Lula, a desigualdade regional diminuiu, a desigualdade de renda diminuiu,os juros diminuem, o Brasil cresce mais do que a China em 2010, empregos formais aumentam. Isto, a Folha de São Paulo não publica, não é notícia que interessa ao povo, pois não é o que ela pretende “informar”.
    Os obstáculos para o amadurecimento do povo brasileiro são outros, que o Calligaris nem menciou...

    ResponderExcluir

Mega Big Brother

Contador de visitas