A PEC dos Recursos e o Direito Processual Eleitoral:
reflexos da proposta no plano da legislação e da jurisdição eleitorais
Ruy Samuel Espíndola[1]
No Direito Processual Eleitoral, os Recursos Especiais Eleitorais, aqueles que vão dos TRE´s ao TSE (para discutirem divergência jurisprudencial ou violação de lei ou da Constituição Federal), não sofrerão qualquer reforma pela “PEC dos Recursos”, segundo se entende de sua redação[2], que afeta apenas a processualidade de seus primos-irmãos, os Recurso Especial (para o STJ) e o Recurso Extraordinário (para o STF).
Isso por que o Recurso Especial Eleitoral é contemplado, sem esse nome jurídico expresso, em outra dimensão do texto constitucional[3]. E recebe o nome de Recurso Especial, apenas pelo Código Eleitoral[4].
Além disso, é necessário enfatizar que por disposição expressa do Código Eleitoral, os recursos judiciais eleitorais não teem efeito suspensivo[5], desde 1965, ano em que entrou em vigor o Código Eleitoral.
Por outro lado, a jurisprudência eleitoral afirma pacificamente que as decisões condenatórias, no que toca a matéria de captação ilícita de sufrágio nos procedimentos não criminais, condutas vedadas, ou seja, nas representações eleitorais, ação de investigação judicial eleitoral e ação de impugnação de mandato eletivo, tem efeito imediato. Seja a decisão de primeiro ou a de segundo grau, ela será executada imediatamente!
Ou melhor: cassação de registro, diploma ou mandato,em regra, tem efeito imediato. Muitas vezes, um avassalador efeito imediato...
E a Lei complementar 135/10 (lei “ficha limpa”) sedimentou de vez essa tendência de executibilidade imediata das decisões condenatórias em matéria eleitoral não criminal, reformando as normas pertinentes aos debates processuais sobre inelegibilidade[6]. Atualmente, cabe sempre a parte recorrente condenada em matéria não criminal, se quiser obstar os efeitos da decisão condenatória, interpor medida cautelar para tal fim.
Assim, no que toca a presteza da jurisdição eleitoral em matéria não criminal, ela continuará a mesma, relativamente aos pleitos recursais endereçados ao TSE.
Eventual reflexo no Direito Eleitoral poderá se dar quando da alteração da legislação infraconstitucional: se discute a reforma do Código Eleitoral no Senado, pela sua Comissão de Juristas, cujo Presidente é o Ministro Dias Toffoli, do STF.
O projeto de reforma da codificação eleitoral poderá contemplar, no plano processual judicial, a possibilidade de recurso ordinário (no sentido da PEC) em matéria penal eleitoral, no que tocam as ações penais originárias, como são exemplos as que se intentam contra prefeitos perante o TRE, por força do foro privilegiado.
Hoje, dessas condenações, cabe apenas Recurso Especial Eleitoral, com a limitação de não se poder discutir matéria fática e revolver provas. O modelo inovador da PEC dos Recursos poderá aperfeiçoar o due process dos demandados, no que toca a otimização dos recursos inerentes à ampla defesa e ao contraditório efetivo dos acusados penais eleitorais.
Haverá apenas uma limitação, prejudicial a todos os demandados na seara eleitoral, especialmente aos acusados através de feitos não criminais ou dos processados em feitos criminais julgados recursalmente pelo TSE: é que não se poderá pedir, a princípio, medida cautelar para conferir efeito suspensivo ao Recurso Extraordinário interposto contra decisão do TSE.
E tal limitação incide em processo judicial de possibilidades impugnatórias limitadas, pois as ações rescisórias em matéria eleitoral são demais restritas: só cabem, contra decisões tomadas pelo TSE, apenas quando o assunto versar inelegilibilidade, de 120 dias do trânsito em julgado. E nada mais!
Assim, no Direito eleitoral, os acusados em quaisquer de seus feitos punitivos (criminais e não criminais) terão um ônus processual muito maior do que os acusados em processos fora da justiça eleitoral.
E ônus demais severo, eis que em regra os mandatos políticos tem prazo certo: 04 anos para Presidente, Governador, Prefeito, Deputado Federal, Deputado Estadual e Vereador; e 08 anos para Senadores.
Desta forma, a demora em fazer justiça e em julgar o Recurso Extraordinário, representará, para o condenado, a extinção total ou parcial do mandato, sem possibilidade de devolução do tempo escoado, tenha ele ou não razões materiais ou formais para reverter o julgado condenatório.
É esse, o maior inconveniente da proposta no âmbito eleitoral, e sua sustentável inconstitucionalidade em face dos princípios da ampla defesa, devido processo legal, juiz natural, contraditório e acesso universal à jurisdição, como destacou, em ofício ao Presidente do Supremo, o Ministro Marco Aurélio. Também como manifestou ao Ministro da Justiça, em carta, o Presidente Nacional da OAB, Ophir Cavalcante.
[1] Professor de Direito Constitucional da Escola Superior de Magistratura de Santa Catarina e Professor de Direito Constitucional Eleitoral e Recursos Eleitorais na Pós-Graduação em Direito Eleitoral do CESULBRA - Mestre em Direito Público pela UFSC – Autor do livro “Conceito de Princípios Constitucionais” – Conferencista Internacional – Secretário de Comissão Especial do Conselho Federal da OAB (a em prol da emenda constitucional de iniciativa popular) - Sócio gerente da Espíndola & Valgas, Advogados Associados, com sede em Florianópolis/SC – Advogado militante perante o TSE e STF - ruysamuel@hotmail.com.
[2] “Art. 105-A: A admissibilidade do recurso extraordinário e do recurso especial não obsta o trânsito em julgado da decisão que os comporte. Parágrafo único: A nenhum título será concedido efeito suspensivo aos recursos, podendo o Relator, se for o caso, pedir preferência no julgamento.
Art. 105-B: Cabe recurso ordinário, com efeito devolutivo e suspensivo, no prazo de quinze (15) dias, da decisão que, com ou sem julgamento de mérito, extinga processo de competência originária: I – de Tribunal local, para o Tribunal Superior competente; II – de Tribunal Superior, para o Supremo Tribunal Federal.”
Art. 105-B: Cabe recurso ordinário, com efeito devolutivo e suspensivo, no prazo de quinze (15) dias, da decisão que, com ou sem julgamento de mérito, extinga processo de competência originária: I – de Tribunal local, para o Tribunal Superior competente; II – de Tribunal Superior, para o Supremo Tribunal Federal.”
[3] “Art. 121. Lei complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas eleitorais. § 3º - São irrecorríveis as decisões do Tribunal Superior Eleitoral, salvo as que contrariarem esta Constituição e as denegatórias de "habeas-corpus" ou mandado de segurança. § 4º - Das decisões dos Tribunais Regionais Eleitorais somente caberá recurso quando: I - forem proferidas contra disposição expressa desta Constituição ou de lei; II - ocorrer divergência na interpretação de lei entre dois ou mais tribunais eleitorais; III - versarem sobre inelegibilidade ou expedição de diplomas nas eleições federais ou estaduais;IV - anularem diplomas ou decretarem a perda de mandatos eletivos federais ou estaduais; V - denegarem "habeas-corpus", mandado de segurança, "habeas-data" ou mandado de injunção.”
[4] Art. 276. As decisões dos Tribunais Regionais são terminativas, salvo os casos seguintes em que cabe recurso para o Tribunal Superior: I - especial: a) quando forem proferidas contra expressa disposição de lei; b) quando ocorrer divergência na interpretação de lei entre dois ou mais tribunais eleitorais.”
[5] “Art. 257. Os recursos eleitorais não terão efeito suspensivo. Parágrafo único. A execução de qualquer acórdão será feita imediatamente, através de comunicação por ofício, telegrama, ou, em casos especiais, a critério do Presidente do Tribunal, através de cópia do acórdão.”
[6] Ao reformar o dispositivo próprio da Lei Complementar 64/90, que exigia trânsito em julgado para inelegibilidade, que agora tem a seguinte redação: “Art. 15. Transitada em julgado ou publicada a decisão proferida por órgão colegiado que declarar a inelegibilidade do candidato, ser-lhe-á negado registro, ou cancelado, se já tiver sido feito, ou declarado nulo o diploma, se já expedido. (Redação dada pela Lei Complementar nº 135, de 2010) Parágrafo único. A decisão a que se refere o caput, independentemente da apresentação de recurso, deverá ser comunicada, de imediato, ao Ministério Público Eleitoral e ao órgão da Justiça Eleitoral competente para o registro de candidatura e expedição de diploma do réu. (Incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010)”
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