Um voto para mostrar como é possível pensar na Execução Penal. Conselheiro Marcelo Urani
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Autos n.54.7832
Objeto: Pedido de Indulto.
Requerente: José Paulo Jesus dos Santos
Matrícula Penal n. 54783
Tratase o presente feito de pedido de Indulto com
base no Dec. n. 6706/08, em favor de José Paulo Jesus dos
Santos, matrícula penal n. 54783, condenado a pena de
6(seis) anos, 10(dez) meses de reclusão pelo cometimento do
crime do art. 157, § 2º, inc. I e II c/c art. 29 do CP,
sentença proferida pela 2ª Vara Crime de São SebastiãoSP.
Quanto ao tempo de cumprimento da pena, o
sentenciado foi preso em 12/07/2000, fugiu em 11/07/2001 e
recapturado em 28/05/2008, cumprindo o total de 4(quatro)
anos, 6(seis) meses e 27(vinte e sete) dias, com término da
pena em 13/04/2011.
Sendo o presente feito distribuído inicialmente a
digna e zelosa Conselheira Marília Lomanto, que em
10/03/2009 requereu a certidão de conduta carcerária do
requerente, cópia da denúncia e da sentença condenatória
para confirmação da primariedade do apenado. Tendo a
ilustre Presidente deste Conselho oficiado neste sentido, o
que só foi atendida em 19/08/2009, ou seja, 5 (cinco) meses
depois pela Penitenciária Lemos de Brito.
É o relatório.
Em relação ao aspecto objetivo exigido pelo Dec., o
requerente satisfaz plenamente as suas condições, pois já
cumpriu mais de 1/3, e caso fosse reincidente também faria
jus ao beneficio, pois alcançou mais da metade da pena, o
que por si torna desnecessário considerar o aspecto da
reincidência.
Quanto ao aspecto subjetivo do art. 4º, este é
objeto de maiores considerações.
O sentenciado só ingressou na Penitenciária Lemos
de Brito em 28/11/2008, sem a indicação de sua origem.
O Dec. de 2008 que concede Indulto e Comutação de
Pena aos sentenciados requer como pressuposto o bom
comportamento carcerário do apenado nos últimos 12(doze)
meses de cumprimento da pena, o que, em tese impediria a
concessão do benefício ao requerente, já que não há
informes neste sentido.
Apesar disto, o que não se pode perder de vista que
é direito de todo cidadão a duração razoável do seu
processo, na linha do quanto expressado no art. 5º, inc.
LXXVIII da Constituição Federal que assim dispõe “a todos,
no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a
razoável duração do processo e os meios que garantam a
celeridade de sua tramitação”.
2
Não bastasse isto, o Pacto de San José da Costa
Rica, ratificado pelo Brasil assegura no seu art. 8ª, 1
como garantia judicial, o direito que todo cidadão possui a
um processo dentro de um prazo razoável. Neste particular,
o Brasil já foi condenado pela CIDH no caso Ximenes Lopes.
Objetivando traçar parâmetros para estabelecer a
configuração da demora no processo, o TEDH determinou três
pontos que podem ser perfeitamente adotados em qualquer
país: complexidade do caso, comportamento do acusado e
conduta das autoridades.
Dentro deste contexto, percebese facilmente que o
caso não é complexo, pois somente figura um requerente no
feito, sem oitiva de testemunha ou mesmo mais de uma
condenação, independente das informações sobre a conduta do
apenado poderem ser repassadas pelos modernos meios de
comunicação, afinal estamos na era digital, onde a
velocidade impõese, ainda mais quando o status libertatis
está em restrição.
Em relação ao comportamento do acusado, também não
se pode levantar esta questão em seu desfavor, já que
esteve sempre submetido a tutela estatal, devendo o Estado
funcionar em favor do condenado, e não o reverso, como
esclarece o Desembargador Nereu Giacomolli 1 “Em face do
princípio da dignidade da pessoa humana, é o estado que
opera em função do acusado, e não este que se submete”.
Por fim, a conduta das autoridades influenciaram
decisivamente na (de)mora da apreciação do feito, tanto
assim que a ilustre Presidente deste Conselho, Dra.
Alessandra Prado somente teve resposta ao seu ofício
5(cinco) meses depois, mesmo em se tratando de Unidade
Prisional da capital.
Logo, diante deste quadro de delonga processual,
podese acatar a solução proposta por Lopes Jr
2
para
aplicar uma medida compensatória, que nos termos do
presente feito funcionaria como a desconsideração da
conduta do requerente até 28/11/2008. Medida que por sua
vez é reconhecida pelo TJ/RS em caso equivalente, ao
aplicar redução da atenuante inominada.
Penal. Estupro e Atentado violento ao pudor.
Autoria e materialidade suficientemente
comprovadas. Condenação confirmada.
Redimensionamento da pena. Atenuante inominada do
artigo 66 do Código Penal caracterizada pelo
longo e injustificado tempo de tramitação do
processo (quase oito anos) associado ao não
cometimento de novos delitos pelo apelante.
1
GIACOMOLLI, Nereu José. Reformas (?) do Processo Penal: Considerações
Críticas. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2008. p. 11.
2
LOPES JR, Aury. Direito Processual e sua Conformidade Constitucional.
V. I. 3ª Edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 170.
3
Hediondez afastada. Provimento parcial. Unânime.
(Apelação crime 70007100902, 5ª Câmara Criminal,
Rel. Des. Luis Gonzaga da Silva Moura, j.
17/12/2003).
EMBARGOS INFRINGENTES. ATENUANTE GENÉRICA. DEMORA
NA TRAMITAÇÃO DO PROCESSO. 1. O tempo
transcorrido, no caso em tela, sepulta qualquer
razoabilidade na duração do processo e influi na
solução final. A denúncia foi recebida em 1999.
Sobreveio sentença quase oito anos depois. Há que
ser reconhecido o direito de ser julgado num
prazo razoável, nos termos do artigo 5º, LXXVIII,
da Constituição Federal. 2. A solução
compensatória para a demora excessiva do processo
pode situarse, também, na aplicação da atenuante
inominada prevista no artigo 66 do Código Penal,
com a redução da pena. EMBARGOS INFRINGENTES
ACOLHIDOS. POR MAIORIA. (Embargos Infringentes Nº
70025316019, Terceiro Grupo de Câmaras Criminais,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nereu José
Giacomolli, Julgado em 19/12/2008).
A demora deve ser atribuída ao Estado, razão pela
qual não pode o requerente ser duplamente penalizado pelo
seu crime. Ademais, se qualquer dúvida paira sobre a
conduta do sentenciado no ano de 2008, esta deve ceder ante
a Presunção de Inocência, e não especulações sobre
culpabilidade, pois culpado e condenado o sentenciado só
foi pelo crime que lhe foi imputado, nada mais.
Por outro aspecto, diante do Princípio da
Razoabilidade, deve ser levado em consideração que a
resposta ao ofício da Ilustre Presidente, mesmo atraso dá
conta que o requerente até a data de 19/08/2009 tem ótima
conduta carcerária, ainda que este período não seja
computado para efeito do dec. do ano de 2008, aliado a este
fato a sentença da VEP que ao conceder o livramento
condicional em 05/10/2009 ressaltou que “Depreendese da
análise dos autos que o apenado é possuidor de ótima
conduta carcerária, conforme atestado às fls. 70”.
Independente dos aspectos processuais levantados,
vale registrar breves questões sobre o Direito Penal do
Autor e Direito Penal do Fato, que irremediavelmente
demonstram que o Princípio da Secularização não surtiu
efeito no Direito Penal contemporâneo, como bem acentuam
Bueno de Carvalho e Carvalho 3
Como corolário lógico, temos nessas condutas a
limitação interventiva, propugnando,
normativamente, um modelo políticocriminal de
3
CARVALHO, Amilton Bueno de e CARVALHO, Salo. Aplicação da Pena e
Garantismo. 4ª Edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 13.
4
intervenção mínima que respeite, de forma
absoluta e universal, o “ser” do “ outro”, pois,,
se o cidadão tem o dever de cumprir a lei, ao
mesmo tempo tem o direito de ser interiormente
perverso e continuar sendo sem a ingerência dos
aparatos de controle social.
Acrescentese, por fim, que é claro o indicativo
que o comportamento do sentenciado é satisfatório, pois foi
beneficiado através de livramento condicional em
05/10/2009. Além do que a conversão do feito em nova
diligência certamente tornará praticamente prejudicado o
Indulto, ante o lapso temporal da pena cumprida, e os
trâmites burocráticos até a apreciação final de seu
benefício, tanto que o STF no HC n. 93108/SP reconheceu a
ilegalidade da prisão de sentenciado pela demora na
conclusão de exame criminológico, o qual não seria
concluído antes do cumprimento integral da penal.
Diante do exposto, voto no sentido da concessão de
pedido de Indulto em favor de José Paulo Jesus dos Santos.
É o parecer.
Salvador, 18 de Novembro de 2009.
MARCELO FERNANDEZ URANI
Conselheiro Relator
Tentativa de pensar o Direito em Paralaxe (Zizek) alexandremoraisdarosa@gmail.com Aviso: quem não tiver coragem de assinar os comentários aos posts, nem precisa mandar, pois não publico nada anônimo. Recomendo ligar para o Disk Denúncia...
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04/05/2010
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ResponderExcluirÉ isso aí 'rapaz'...
ResponderExcluirlevando as Ciências Criminais para a Bahia!