Informativo STF Nº 700 Brasília, 1º a 5 de abril de 2013
Reincidência e recepção pela CF/88 - 1
É constitucional a aplicação da reincidência como agravante da pena em processos criminais (CP, art. 61, I). Essa a conclusão do Plenário ao desprover recurso extraordinário em que alegado que o instituto configuraria bis in idem, bem como ofenderia os princípios da proporcionalidade e da individualização da pena. Registrou-se que as repercussões legais da reincidência seriam múltiplas, não restritas ao agravamento da pena. Nesse sentido, ela obstaculizaria: a) cumprimento de pena nos regimes semiaberto e aberto (CP, art. 33, § 2º, b e c); b) substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direito ou multa (CP, artigos 44, II; e 60, § 2º); c) sursis (CP, art. 77, I); d) diminuição de pena, reabilitação e prestação de fiança; e e) transação e sursis processual em juizados especiais (Lei 9.099/95, artigos 76, § 2º, I e 89). Além disso, a recidiva seria levada em conta para: a) deslinde do concurso de agravantes e atenuantes (CP, art. 67); b) efeito de lapso temporal quanto ao livramento condicional (CP, art. 83, I e II); c) interrupção da prescrição (CP, art. 117, VI); e d) revogação de sursis e livramento condicional, a impossibilitar, em alguns casos, a diminuição da pena, a reabilitação e a prestação de fiança (CP, artigos 155, § 2º; 170; 171, § 1º; 95; e CPP, art. 323, III). Consignou-se que a reincidência não contrariaria a individualização da pena. Ao contrário, levar-se-ia em conta, justamente, o perfil do condenado, ao distingui-lo daqueles que cometessem a primeira infração penal. Nesse sentido, lembrou-se que a Lei 11.343/2006 preceituaria como causa de diminuição de pena o fato de o agente ser primário e detentor de bons antecedentes (art. 33, § 4º). Do mesmo modo, a recidiva seria considerada no cômputo do requisito objetivo para progressão de regime dos condenados por crime hediondo. Nesse aspecto, a lei exigiria o implemento de 2/5 da reprimenda, se primário o agente; e 3/5, se reincidente. O instituto impediria, também, o livramento condicional aos condenados por crime hediondo, tortura e tráfico ilícito de entorpecentes (CP, art. 83, V). Figuraria, ainda, como agravante da contravenção penal prevista no art. 25 do Decreto-Lei 3.688/41. Influiria na revogação do sursis processual e do livramento condicional, assim como na reabilitação (CP, artigos 81, I e § 1º; 86; 87 e 95).
RE 453000/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 4.4.2013. (RE-453000)
Reincidência e recepção pela CF/88 - 2
Considerou-se que a reincidência comporia consagrado sistema de política criminal de combate à delinquência e que eventual inconstitucionalidade do instituto alcançaria todas as normas acima declinadas. Asseverou-se que sua aplicação não significaria duplicidade, porquanto não alcançaria delito pretérito, mas novo ilícito, que ocorrera sem que ultrapassado o interregno do art. 64 do CP. Asseverou-se que o julgador deveria ter parâmetros para estabelecer a pena adequada ao caso concreto. Nesse contexto, a reincidência significaria o cometimento de novo fato antijurídico, além do anterior. Reputou-se razoável o fator de discriminação, considerado o perfil do réu, merecedor de maior repreensão porque voltara a delinquir a despeito da condenação havida, que deveria ter sido tomada como advertência no que tange à necessidade de adoção de postura própria ao homem médio. Explicou-se que os tipos penais preveriam limites mínimo e máximo de apenação, somente alijados se verificada causa de diminuição ou de aumento da reprimenda. A definição da pena adequada levaria em conta particularidades da situação, inclusive se o agente voltara a claudicar. Estaria respaldado, então, o instituto constitucional da individualização da pena, na medida em que se evitaria colocar o reincidente e o agente episódico no mesmo patamar. Frisou-se que a jurisprudência da Corte filiar-se-ia, predominantemente, à corrente doutrinária segundo a qual o instituto encontraria fundamento constitucional, porquanto atenderia ao princípio da individualização da pena. Assinalou-se que não se poderia, a partir da exacerbação do garantismo penal, desmantelar o sistema no ponto consagrador da cabível distinção, ao se tratar os desiguais de forma igual. A regência da matéria, harmônica com a Constituição, denotaria razoável política normativa criminal.
RE 453000/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 4.4.2013.(RE-453000)
Reincidência e recepção pela CF/88 - 3
O Min. Luiz Fux acresceu não se poder saber o motivo de o agente ter voltado a delinquir depois de punido — se isso decorreria de eventual falibilidade do sistema carcerário, da personalidade do indivíduo ou de outros fatores. Diferenciou reincidência de reiteração criminosa e sublinhou que nesta dar-se-ia ao acusado o denominado período de probation, para que refletisse sobre sua atitude e não voltasse a cometer o delito. O Min. Gilmar Mendes aludiu a índices que indicariam que a reincidência decorreria da falência do modelo prisional, que não disporia de condições adequadas para a ressocialização. Colacionou medidas positivas para reverter o quadro, como formação profissional e educacional de condenados e indicou a importância do debate crítico acerca do modelo punitivo existente. Por fim, determinou-se aplicar, ao caso, o regime da repercussão geral reconhecida nos autos do RE 591563/RS (DJe de 24.10.2008). Além disso, por maioria, permitiu-se que os Ministros decidam monocraticamente casos idênticos. Vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio, relator.
RE 453000/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 4.4.2013. (RE-453000)
Reincidência: agravamento de pena e recepção pela CF/88 - 2
Ao aplicar o mesmo entendimento acima exposto, o Plenário denegou a ordem em uma série de habeas corpus, afetados pela 2ª Turma, em que discutida eventual ofensa ao art. 5º, XLVI, da CF, decorrente da suposta existência de bis in idem em razão do agravamento de pena pela reincidência — v. Informativo 602. Ademais, por maioria, autorizou-se que os Ministros decidam casos idênticos monocraticamente. Vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio.
HC 94361/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 4.4.2013. (HC-94361)
PRIMEIRA TURMA
ED e juízo de admissibilidade de RE
A 1ª Turma iniciou julgamento conjunto de embargos de declaração em que se pretende o conhecimento de agravo interposto contra decisão que inadmitira recurso extraordinário. Na decisão embargada, julgou-se intempestivo o agravo ao fundamento de que “os embargos de declaração opostos contra a decisão do Presidente do Tribunal de origem que não admitiu o recurso extraordinário, por serem incabíveis, não suspendem o prazo para interposição de outro recurso”. Na espécie, alega-se: a) o cabimento dos embargos contra toda e qualquer decisão; b) a incompetência do STF para analisar o cabimento ou não dos embargos de declaração; e c) a restrição dessa temática à esfera infraconstitucional e, por isso, competente o STJ. Em preliminar, por maioria, os embargos de declaração foram convertidos em agravos regimentais, vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio. No mérito, o Min. Dias Toffoli, relator, negou provimento aos regimentais, no que foi acompanhado pela Min. Rosa Weber. Destacou a jurisprudência da Corte segundo a qual os embargos de declaração opostos contra a decisão do Presidente do Tribunal de origem que não admitira o recurso extraordinário, por serem incabíveis, não suspenderiam o prazo para interposição de outro recurso. A Min. Rosa Weber acompanhou o relator e negou provimento ao recurso. O Min. Marco Aurélio conheceu dos embargos. Frisou que, quando protocolizados, existiria um lapso temporal em curso e, portanto, haveria interrupção de prazo, a pressupor-se unicamente em relação ao manuseio dos declaratórios (procedência ou improcedência, conhecimento ou não conhecimento). Asseverou que a decisão do juízo primeiro de admissibilidade, em especial quando negativa, admitiria embargos declaratórios. Obtemperou que todo pronunciamento com carga decisória desafiaria embargos declaratórios. Nesse mesmo sentido votou o Min. Luiz Fux. Após, o julgamento foi suspenso para aguardar voto de desempate de Ministro da 2ª Turma.
ARE 688776/RS, rel. Min. Dias Toffoli, 2.4.2013. (ARE-688776)
ARE 685997/RS, rel. Min. Dias Toffoli, 2.4.2013. (ARE-685997)
HC N. 114.830-RS
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA DA PENA. CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO § 4º DO ART. 33 DA LEI 11.343/2006. FIXAÇÃO NO GRAU MÍNIMO PERMITIDO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. ORDEM CONCEDIDA. REGIME INICIAL DIVERSO DO FECHADO. POSSIBILIDADE. CONCESSÃO DE OFÍCIO.
I – Não agiu bem o Tribunal estadual, uma vez que fixou a pena-base no mínimo legal, e, em seguida, aplicou a fração de redução prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006 em 1/6, sem apresentar a devida fundamentação.
II – O Plenário desta Corte, no julgamento do HC 111.840/ES, Rel. Min. Dias Toffoli, declarou a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/1990 (redação dada pela Lei 11.464/2007), que determinava o cumprimento de pena dos crimes hediondos, de tortura, de tráfico ilícito de entorpecentes e de terrorismo no regime inicial fechado.
III – Ordem concedida para determinar ao juízo da execução reduza da pena imposta ao paciente com a aplicação da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006 no patamar de 2/3.
IV – Concessão da ordem de ofício para determinar ao magistrado que fixe o regime inicial de cumprimento da pena de forma fundamentada, afastando a regra do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/1990, declarado inconstitucional pelo Plenário desta Corte.
*noticiado no Informativo 698
RHC N. 115.486-MG
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTE. 1. INDICAÇÃO DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA PARA A FIXAÇÃO DA PENA-BASE E DO REGIME PRISIONAL INICIAL SEMIABERTO. 2. CAUSA DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO § 4º DO ART. 33 DA LEI N. 11.343/2006. QUANTIDADE E NATUREZA DA DROGA ADOTADAS PARA A FIXAÇÃO DA PENA-BASE E DEFINIÇÃO DO PERCENTUAL DE DIMINUIÇÃO. BIS IN IDEM. 3. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. POSSIBILIDADE DE REEXAME A SER FEITO PELO JUÍZO DE PRIMEIRA INSTÂNCIA. FUNDAMENTO DA NATUREZA E DA QUANTIDADE DO ENTORPECENTE ACRESCIDO ORIGINARIAMENTE PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA PARA VEDAR A SUBSTITUIÇÃO POR PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. INOVAÇÃO EM HABEAS CORPUS IMPETRADO PELA DEFESA.
1. Não há nulidade na decisão que fixa a pena-base com fundamentação idônea, considerando-se a natureza e a quantidade do entorpecente (art. 42 da Lei n. 11.343/2006). A sentença deve ser lida em seu todo. Precedentes.
2. O fundamento relativo à natureza e à quantidade do entorpecente foi utilizado tanto na primeira fase da dosimetria, para a fixação da pena-base, como na terceira fase, para a definição do patamar da causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 em um terço no Superior Tribunal de Justiça. Bis in idem. Patamar de dois terços a ser observado.
3. Regime prisional inicial semiaberto fixado pelo Superior Tribunal de Justiça e mantido em razão das circunstâncias judiciais desfavoráveis. Observância ao art. 33 do Código Penal.
4. Este Supremo Tribunal Federal assentou ser inconstitucional a vedação à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, em se tratando de tráfico de entorpecente. Precedentes.
5. Não competia ao Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de habeas corpus da defesa, acrescentar fundamento novo (não ser medida socialmente recomendável pela natureza e quantidade do entorpecente) para afastar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.
6. Recurso parcialmente provido para determinar que o juízo da Primeira Vara Criminal da Comarca de Juiz de Fora/MG reduza a pena imposta ao Recorrente no Superior Tribunal de Justiça, com a aplicação da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006 no patamar máximo de dois terços e, considerada essa nova pena a ser imposta, reexamine os requisitos para a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, afastado o óbice dos arts. 33, § 4º, e 44, caput, da Lei n. 11.343/2006.
HC N. 112.006-RJ
RELATORA : MIN. ROSA WEBER
EMENTA: HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. NATUREZA JURÍDICA. CRIME PERMANENTE. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. WRIT DENEGADO.
O crime de estelionato previdenciário, quando praticado pelo próprio beneficiário das prestações, tem caráter permanente, cessando a atividade delitiva apenas com o fim da percepção das prestações. Precedentes desta Corte.
Iniciado o prazo prescricional com a cessação da atividade delitiva, não é cabível o reconhecimento da extinção da punibilidade no caso concreto.
Habeas corpus denegado.
HC N. 108.899-PE
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. SUPERVENIÊNCIA DA SENTENÇA DE PRONÚNCIA SEM A MANUTENÇÃO, REVOGAÇÃO OU SUBSTITUIÇÃO HABEAS CORPUS CONCEDIDO.
1. Ao manter a prisão dos corréus na sentença de pronúncia, o Juízo de primeira instância não faz qualquer referência à manutenção da prisão preventiva anteriormente decretada em desfavor do Paciente, que está foragido desde 2004, e, mesmo não vigorando então a norma do art. 413, § 3º, do Código de Processo Penal, que obriga o juiz, desde 2008, a se manifestar a respeito da manutenção, revogação ou substituição da prisão cautelar, a Constituição da República afirma que todas as decisões judiciais têm que ser motivadas.
2. Ordem concedida.
HC N. 108.049-SP
RELATOR: MIN. TEORI ZAVASCKI
EMENTA: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. PERICULOSIDADE E RISCO DE REITERAÇÃO DELITIVA.
1. Não há ilegalidade no decreto prisional que, diante das circunstâncias do caso concreto, aponta a sofisticação e a larga abrangência das ações da organização criminosa, supostamente liderada pelo paciente, o que demonstra a sua periculosidade.
2. A jurisprudência desta Corte possui entendimento no sentido de que “a existência de organização criminosa impõe a necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de seus integrantes como garantia da ordem pública, constituindo fundamentação cautelar idônea e suficiente para a prisão preventiva” (HC 95.024/SP, 1ª T., Min. Cármen Lúcia, DJe de 20.02.2009). Precedentes.
3. Ordem denegada.
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