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29/07/2011

Conjur - TJ paulista pede perdão para autora de apelação Por Fernando Porfírio


TJ paulista pede perdão para autora de apelação
Por Fernando Porfírio
O Tribunal de Justiça de São Paulo se penitenciou oficialmente com
Diva Ferreira, mãe de um garoto de 16 anos. Jhonny Rafael Ferreira de
Bahamontes agonizou por 45 minutos, na rua em que morava, em Campinas,
depois de ser atropelado por uma viatura policial. O socorro demorou
porque os policiais informaram à equipe de resgate, de propósito, o
endereço errado do local do acidente.
O pedido oficial de perdão da corte paulista foi provocado pelo
segundo erro do Estado. Desta vez, patrocinado pelo próprio
Judiciário. O Tribunal de Justiça levou dez anos para julgar o recurso
de apelação da mãe do adolescente. Diva reclamou do valor da
indenização arbitrado pelo juiz de primeira instância, em R$ 60 mil,
por danos morais.
“Embora sem responsabilidade pessoal no fato, vejo-me obrigado a me
penitenciar perante os autores, em nome da minha instituição, por esse
verdadeiro descalabro, que se procurará a partir de agora por fim”,
afirmou o desembargador Magalhães Coelho, que em 17 de junho se tornou
relator do recurso apresentado por Diva Ferreira.
“Por longos e inaceitáveis dez anos remanesceram inertes [os autos]
sem que os recursos fossem apreciados, constituindo-se o fato, na
prática, em denegação da jurisdição, responsabilidade da qual o
Tribunal de Justiça de São Paulo, como instituição respeitabilíssima e
necessária à garantia do Estado Democrático de Direito, não tem como
se furtar”, completou Magalhães Coelho.
O recurso de Diva Ferreira deu entrada no Tribunal de Justiça em 2001.
Depois de ficar por mais de nove anos com o desembargador de origem,
sem apreciação, foi redistribuído a outros dois julgadores. Só no mês
passado chegou às mãos de Magalhães Coelho. Em cinco dias estava com a
revisora, Beatriz Braga, que no mesmo prazo entregou à mesa para
julgamento.
A turma julgadora, formada por três desembargadores da 7ª Câmara de
Direito Público, reformou a sentença de primeiro grau, quanto ao dano
moral, aumentando a indenização para R$ 200mil. O tribunal manteve os
danos materiais (despesas do funeral e pagamento de pensão vitalícia)
e reconheceu a responsabilidade do Estado pela tragédia.
“Nunca, em meus quase 30 anos de magistratura, vi um caso tão
perverso, causado pela burocracia judicial”, disse o desembargador
durante a sessão de julgamento. “Em nome do Tribunal de Justiça, quero
me penitenciar com essa mãe pela demora injustificada para julgar caso
tão grave”, completou.
Magalhães Coelho afirmou que o grande volume de processos, distribuído
a juízes e desembargadores, não pode servir de justificativa para a
demora de mais de dez anos para julgar o recurso. Segundo o relator,
essa realidade tem que ser mudada sob pena de comprometer a
credibilidade da justiça. “Não imagino o que essa mãe pode pensar da
justiça de São Paulo”, completou.
O acidente
O garoto sofreu acidente na esquina da casa onde morava, em setembro
de 1998. Ele passeava com sua mobilete quando foi atropelado por um
carro da Polícia. A viatura passava pelo local em alta velocidade, com
os faróis apagados e a sirene desligada. Depois do acidente, os
policiais demoraram a chamar o resgate e quando o fizeram deram o
endereço errado.
A Fazenda do Estado alegou que não podia ser condenada pelos danos
morais e materiais uma vez que houve culpa exclusiva da vítima no
acidente. De acordo com a defesa, o garoto conduzia a motocicleta sem
a devida habilitação, conduta que, sendo ilegal tanto do ponto de
vista civil como criminal, descaracterizaria a responsabilidade civil
do Estado.
A turma julgadora não aceitou a tese da Fazenda do Estado. “Não
bastasse a imprudência dos policiais na condução da viatura, uma vez
ocorrido o acidente, a vítima demorou mais de quarenta minutos para
ser socorrida, já que os agentes públicos tardaram em chamar o resgate
e, quando o fizeram, informaram o endereço errado”, disse o
desembargador Magalhães Coelho.
De acordo com o relator, os policiais agiram com desrespeito à vítima
e sua família e foram agressivos ao impedirem, com violência, que os
parentes se aproximassem do garoto que agonizava à espera de socorro.
“No caso, a conduta dos agentes públicos [policiais] feriu os direitos
mais essenciais da autora [mãe], ao passo que não bastasse causar o
acidente por imprudência trataram a vítima e os seus familiares de
maneira atroz, de forma incompatível com os seus deveres funcionais,
maculando a instituição a que servem”, justificou o relator para
aceitar o pedido da mãe de aumento do valor da indenização por danos
morais.
“O valor da indenização deve, assim, servir de instrumento para
conscientizar os agentes públicos das consequências de seus atos
negligentes e abusivos, cabendo à Fazenda Estadual conferir
efetividade a esta finalidade da sanção por meio do ajuizamento de
ação de regresso”, completou.
Meta 2
A indignação do desembargador com o desleixo de sua instituição ocorre
num momento delicado, em que a corte paulista faz uma verdadeira
faxina, redistribuindo processo que estavam encalhados a anos, no
acervo de desembargadores. No centro do debate está a Resolução
542/2011 e a redistribuição de um acervo de mais de 47 mil recursos da
chamada Meta 2, do CNJ. A medida é alvo de bombardeios no CNJ e no
STF.
Baixada no final de março, a Resolução prevê o julgamento de todos os
processos que deram entrada na corte paulista até 31 de dezembro de
2006. Vai um pouco além ao fixar metas de produtividade para todos os
desembargadores e possibilitar a aplicação de sanções administrativas
para os que não as cumprirem. A redistribuição atinge desembargadores
com atraso no acervo e manda para os gabinetes dos magistrados que
estão com os recursos em dia para que façam os julgamentos dos
litígios parados por tanto tempo.
De acordo com o ato, os julgadores que receberão os acervos não serão
prejudicados por terem sido mais rápidos. Para compensar, terão
suspensa a distribuição. Os retardatários, ao se livrarem dos
processos antigos, receberão três novos para cada um que mandarem aos
seus colegas. Essa regra foi uma estratégia importante para arrefecer
o ímpeto de quem não se conformava em trabalhar para os “outros”. Nos
primeiros dias da resolução, havia até ameaças de representação ao
CNJ.
Além disso, os processos antigos em mãos dos retardatários deverão ser
julgados em 120 dias, sob pena de apuração de responsabilidade
disciplinar. Da mesma forma, serão responsabilizados os que tiverem
produtividade igual ou inferior a 70% da média da Seção onde atua. Há
ainda outro detalhe: os que são professores terão reexaminadas as
autorizações para docência. Em outras palavras: serão lembrados de que
a magistratura é a atividade principal.
Para a maioria dos desembargadores paulistas, a Resolução 542, por si
só, não será a solução para todos os problemas da morosidade da
Justiça. Porém, ela tem a grande virtude de colocar um basta na
tradição de tolerância que sempre existiu em relação aos atrasos nos
tribunais.
Fernando Porfírio é repórter da revista Consultor Jurídico
Revista Consultor Jurídico, 26 de julho de 201

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