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21/07/2009
Arma que não funciona
A questão abaixo é interessante. Pode se penalizar o sujeito que está com arma que não funciona? Decidi conforme abaixo.
abs
Autos n° 023.07.135955-1
Ação: Ação Penal - Porte Ilegal de Arma/Especial
Autor:Justiça Pública
Acusado:Valdir Machado
Vistos para sentença.
I – Relatório.
O representante do Ministério Público em exercício nesta Comarca ofereceu denúncia contra Valdir Machado, já qualificado nos autos, dando-o como incurso nas sanções do art. 14, "caput", da Lei 10.826/03, tendo em vista dos atos delituosos assim narrados na peça acusatória:
"No dia 19 de outubro de 2007, por volta das 22:00 horas, policiais militares que atendiam uma ocorrência de disparo de arma de fogo em uma residência na comunidade Vila União avistaram o denunciado, que usava uma pochete na cintura, conduzindo uma motocicleta em atitude suspeita, pelo que, na tentativa de proceder a abordagem do condutor, este empreendeu fuga em direção à residência n. 43, quadra 'b', Rua Anarolina Silveira Santos, Vila União, nesta Capital, logrando êxito em adentrar aquela casa e jogar, pela janela da residência, a pochete que anteriormente portava na cintura.
Deste modo, após breve perseguição policial, foi então procedida a abordagem do acusado Valdir Machado, e realizadas as buscas nas imediações, foi encontrada aquela pochete, averiguando-se que o acusado Valdir Machado portava e transportava uma arma de fogo, tipo pistola semi-automática, marca Bersa, modelo Thunder número 454583, calibre 380, cano 102 mm oxidado, devidamente municiada com 05 (cinco) munições intactas do mesmo calibre, tudo em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
Consta ainda do caderno investigativo que o denunciado informou aos policiais militares que efetuaram a prisão em flagrante que havia comprado a referida arma de fogo no bairro Brejaú, no município de Palhoça."
Pedido de liberdade provisória (fls. 31/34), o qual foi indeferido (fl. 56).
O flagrante foi homologado em 25 de outubro de 2007 (fl. 113).
Certificados os antecedentes criminais do acusado (fls. 115/118).
A denúncia foi recebida em 05 de novembro de 2007 (fl. 124).
O acusado foi interrogado (fls. 140/141).
Foi deferida a liberdade provisória (fl. 148).
Apresentada defesa prévia, com rol de testemunhas (fl. 151).
Durante a instrução criminal foram ouvidas uma testemunha da acusação (fl. 166) e três da defesa (fls. 187/188 e 205).
A partes apresentaram alegações finais, requerendo o Ministério Público a condenação do acusado nos termos da denúncia (fls. 191/197). A defesa, por sua vez, pugnou pela absolvição, invocando o princípio "in dubio pro reo".
Os autos vieram conclusos.
É o relatório.
II – Fundamentação.
1. A decisão no processo penal não é ato de conhecimento, mas sim de compreensão, em que os sujeitos incidentes, no evento semântico denominado sentença, realizam uma fusão de horizontes, para usar a gramática de Gadamer. Neste contexto, diante da apresentação de uma hipótese fático-descritiva pela acusação, procede-se a um debate em contraditório, entre partes, nos quais os ônus são compartilhados. O resultado da produção válida de significantes será composta em uma decisão judicial, a qual não se assemelha, nem de longe, ao mito ultrapassado da verdade real. A verdade real é empulhação ideológica que serve para "acalmar" a consciência de acusadores e julgadores. O que existe é a produção de significantes e uma decisão no tempo e espaço. As únicas garantias existentes são: a) um processo como procedimento em contraditório; b) processo acusatório, entre partes, sem atividade probatória do juiz, com as garantias constitucionais (presunção de inocência, etc.; c) decisão fundamentada por parte dos órgãos julgadores. A legitimidade desta decisão decorre, também e fundamentalmente, da sua concordância com a Constituição (MORAIS DA ROSA, Alexandre. Decisão Penal: a bricolage de significantes. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006).
2. Destaque-se, por básico, que a pseudo-prova produzida no 'Inquérito Policial' somente pode servir para análise da condição da ação (GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice. Justa Causa no Processo Penal: Conceito e Natureza Jurídica. In: BONATO, Gilson (Org.). Garantias Constitucionais e Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. p. 199-200), ou seja, dos elementos necessários para o juízo de admissibilidade positivo da ação penal. No mais, não há qualquer possibilidade de valoração democrática, no Processo Penal constitucionalizado, por ser ela desprovida das garantias processuais. A recente reforma do CPP, dando nova redação ao art. 155, ao indicar a possibilidade de seu uso é flagrantemente inconstitucional (MORAIS DA ROSA, Alexandre; SILVEIRA FILHO, Sylvio Lourenço da. Para um Processo Penal Democrático. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 83-97; BARROS, Flaviane de Magalhães. (RE)Forma do Processo Penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 23-27; GIACOMOLLI, Nereu José. Reformas (?) Do Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008)23-36). É que quando de sua produção ainda não existia acusação formalizada, despreza o defensor – além de alguns ainda negarem a publicidade dos atos, embora sumulada a situação – e, ademais, viola a garantia de que seja produzida em face de juiz imparcial, sob contraditório (PIZA, Evandro. Dançando no escuro: apontamentos sobre a obra de Alessandro Baratta, o sistema penal e a justiça. In: ANDRADE, Vera Regina Pereira de (Org.). Verso e reverso do controle penal: (des) aprisionando a sociedade da cultura punitiva. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2002, p. 106-108.). Decorrência direta do princípio da publicidade é a conclusão de somente as provas produzidas (significantes) em face do contraditório é que podem ser levadas em consideração nos debates e também na decisão judicial. Os elementos indiciários não devem adentrar validamente no debate porque, por evidente, não havia acusação quando colhida, violando, dentre outros, o princípio da publicidade. Logo, as declarações prestadas naquele momento são – para se utilizar o estatuto probatório italiano, perfeitamente aplicável ao brasileiro –, absolutamente inutilizáveis, conforme lição de Paolo Tonini (A prova no processo penal italiano. Trad. Alexandra Martins. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 76): "O termo inutilizabilidade descreve dois aspectos do mesmo fenômeno. Por um lado, indica o 'vício' que pode conter um ato ou um documento; por outro lado, ilustra o 'regime jurídico' ao qual o ato viciado é submetido, ou seja, a não possibilidade de ser utilizado como fundamento de uma decisão do juiz. A inutilizabilidade é um tipo de invalidade que tem a característica de atingir não o ato em si mas o seu 'valor probatório'. O ato pode ser válido do ponto de vista formal (por exemplo, não é eivado de nulidade), mas é atingido em seu aspecto substancial, pois a inutilizabilidade o impede de produzir o seu efeito principal, qual seja, servir de fundamento para a decisão do juiz." No Processo Penal democrático, o conteúdo do Inquérito Policial está maculado pela ausência de contraditório, sendo utilizável exclusivamente para análise das questões prévias (condições da ação e pressupostos processuais aplicáveis – MIRANDA COUTINHO, Jacinto Nelson de. A natureza cautelar da decisão de arquivamento do Inquérito Policial. In: Revista de Processo, São Paulo, n. 70, p. 49-58, 1993.). Enfim, é absolutamente antidemocrática a utilização dos elementos do Inquérito Policial para efeito de condenar o acusado. Claro que se for consultar Damásio, Mirabete e Capez, todos dirão da validade, pois ainda não fizeram o giro democrático que a Constituição de 1988 preconiza!
3. Trata-se de ação penal pública incondicionada, na qual é imputada ao acusado Valdir Machado a prática do crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, nos termos do art. 14 da Lei 10.826/03, que assim dispõe:
"Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa."
Entendo que para configuração do tipo em apreço, necessária a comprovação da aptidão da arma, mediante laudo pericial idôneo capaz de demonstrar a potencialidade do instrumento. Contudo, compulsando os autos, verifico que não foi realizado laudo pericial no revólver apreendido, não tendo o Ministério Público requerido a diligência quando lhe coube.
O egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em aresto da lavra do eminente Des. Luís Gonzaga da Silva Moura, na Apelação Criminal nº 70.000.484.022, deixou assentado, sob a égide da legislação anterior:
"Porte de Arma. Imprescindível o exame pericial para confirmar a aptidão da arma apreendida. (...) Apelos providos e acusados absolvidos, forte no art. 386, inc. II, do CPP. "
Consta do corpo do acórdão:
"Sobre o tema discorrem Luiz Flávio Gomes e William Terra de Oliveira: 'Somente existirá um ilícito penal se a arma de fogo em questão for idônea para ferir ou matar alguém. A idoneidade do objeto é também um requisito fundamental e pressuposto da lesividade ínsita ao delito. Sem a demonstração concreta de que a arma possui um poder vulnerante, e de que é capaz de cumpri a função para a qual foi fabricada, não podemos admitir a existência do crime. Por tal motivo, a realização da respectiva perícia na arma de fogo é um dado probatório indeclinável. A produção de prova material é imprescindível para a caracterizar o delito, salvo no caso em que ocorram disparos, hipótese que acabará por configurar um crime distinto.' ("Lei das Armas de Fogo", ed. 1998, pág. 143).
Ainda sobre o tema, assim decidiu o Tribunal de Justiça de Minas Gerais:
"APELAÇÃO CRIMINAL - PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO - IMPRESTABILIDADE DA ARMA - NÃO CONFIGURAÇÃO DO DELITO - PORTE DE MUNIÇÃO E DE ARMA BRANCA - AUSÊNCIA DE PERÍCIA TÉCNICA - NÃO COMPROVAÇÃO DA MATERIALIDADE."
"Para configuração do crime de porte de arma de fogo impõe-se a necessidade de realização de perícia técnica no instrumento, para dizer de sua prestabilidade, vez que, se ele não se encontra em condições de ser utilizado, não traz riscos à vida e integridade física do indivíduo, deixando de ser considerado objeto material da infração. - Para que se configure o crime de porte ilegal de munição, bem como a contravenção de porte de arma branca, necessária a realização de perícia técnica nos objetos, de molde a comprovar sua potencial lesividade à integridade física de alguém."(TJMG - Apelação Criminal nº 1.0024.04.498218-9/001 - 2ª Câmara Criminal. Relatora Des. Beatriz Pinheiro Caíres. DJMG 06.03.2007).
Ainda que não haja laudo pericial, não se olvida que o crime de porte ilegal de arma de fogo é, conforme assinala a doutrina, de perigo abstrato, ou seja, trata-se de delito que se consuma com a realização da conduta supostamente perigosa, sem que haja necessidade da comprovação do risco efetivo para o bem jurídico. Porém, tais crimes levantam séria discussão acerca de sua constitucionalidade, visto que dispensam a comprovação da lesividade material, na medida que estabelecem para a sua concretização uma presunção de perigo que não admite prova em contrário. Ocorre que essa presunção "juris et de jure" fere, irrefragavelmente, os princípios da intervenção mínima e da ofensividade/lesividade, basilares do Direito Penal democrático, razão pela qual não concordo com esta orientação.
Afirmam Zaffaroni e Pierangeli (Manual de Direito Penal Brasileiro: parte geral. 3. ed. São Paulo: RT, 2001, p. 561), em acertada análise, que tal classificação dos fatos puníveis tem maior relevância processual do que penal, afinal, "na realidade, não há tipos de perigo concreto e de perigo abstrato – ao menos em sentido estrito –, mas apenas tipos em que se exige a prova efetiva do perigo submetido ao bem jurídico, enquanto noutros há uma inversão do ônus da prova, pois o perigo é presumido com a realização da conduta, até que o contrário não seja provado, circunstância cuja prova cabe ao acusado" .
Ana Cláudia Bastos de Pinho (Direito Penal e Estado Democrático de Direito: uma abordagem a partir do garantismo de Luigi Ferrajoli. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006), a partir da leitura da obra de Ferrajoli, consolida a ideia de os delitos de perigo abstrato não se coadunam com o devido respeito ao princípio da ofensividade, na medida que "nesse aspecto, o princípio da ofensividade – um dos axiomas de Ferrajoli, expresso na máxima nulla necessitas sine iniuria (não há necessidade de intervenção penal sem lesão ou ofensa a bem jurídico relevante) – desponta como um ideal garantista de efetivação do utilitarismo revisitado, na medida em que a única justificativa (utilitarista, por óbvio) para a grave intervenção penal é a produção de um dano (ou perigo concreto de dano) em bem jurídico alheio. A propósito da origem iluminista do princípio em questão, é oportuno a referência a Cesare Beccaria – abstraindo-se a conotação formal de suas formulações – que, expressamente, condicionou a medida (importância, peso) dos delitos ao dano provocado, jamais à intenção de quem o provocou ou ao suposto pecado cometido. Colocadas assim as coisas, conclui-se que não pode o Direito Penal pretender ser instrumento (iníquo) de moralização, intervindo para estabelecer padrão de comportamento. É pressuposto indispensável dessa intervenção a ofensa (ou o perigo concreto de dano) causada a algum bem jurídico de valor significativo para o ser humano. Lesão, ofensa, dano são, dessa forma, categorias indispensáveis ao delito. Só é crime a conduta que causa ofensa, e desde que, lembre-se, não se possa utilizar outro ramo do Direito (civil, administrativo, tributário, etc.) ou outra forma de controle social para dirimir o conflito (caráter fragmentário do Direito Penal)".
Não se pode conceber que o "novo Direito Penal" ou "Direito Penal do Risco", frutos da "sociedade de risco", implantados com a ilusória ideia de defesa da sociedade da "nova criminalidade", venha a se traduzir em "normas penais de emergência", de modo a tolher o direito de defesa e a livre apreciação da prova, estabelecendo uma presunção de perigo e culpa que desconhece o caso concreto. Nesta esteira, afirma Paulo Queiroz (Direito Penal: parte geral. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 167) que "objeção corrente aos crimes de perigo abstrato é que, ao se presumir o perigo prévia e abstratamente, resulta em última análise que perigo não existe, de modo que se acaba por criminalizar a simples atividade, afrontando-se o princípio da lesividade, bem assim o caráter de extrema ratio (subsidiário) do direito penal. Por isso há que considere inconstitucional toda sorte de presunção legal de perigo. No entanto, força é convir que nem sempre a sua adoção é inconstitucional (como já o sustentei, inclusive), por ofensa ao princípio da lesividade, pois casos há em que o perigo de lesão é de tal modo grave que a sua criminalização se justifica plenamente, tal como ocorre com a falsificação de moeda, por exemplo, razão pela qual cumpre verificar cada caso concretamente, de modo a verificar se sua tipificação é ou não legítima".
Não difere a lição de Marta Rodriguez de Assis Machado (Sociedade de Risco e Direito Penal: uma avaliação de novas tendências político-criminais. São Paulo: IBCCRIM, 2005. p. 129) quando discorre acerca da desgovernada fúria criminalizante que, em seus anseios equivocados, antecipa a criminalização de condutas, abrangendo, de forma desconjuntada, aquelas anteriores à lesão, sem que haja ao menos perigo considerável: "ao contrário do que idealiza o autor – e provavelmente em razão do potencial catastrófico dos novos riscos, que não permite ensaios -, o que se constata, atualmente, na sociedade do risco, é uma ênfase desmedida sobre a segurança antecipatória. Essa perspectiva está presente no desenvolvimento das tentativas de regulação jurídica dos novos riscos e, dentre elas, pode-se dizer que também a atuação do aparato penal tenta se situar dentro de uma estratégia preventiva. É nessa linha de atuação que se insere uma tendência de criminalização em âmbito prévio, cujo principal instrumento é o uso crescente das incriminações de perigo e, em maior medida, dos tipos de perigo abstrato, que são por excelência categorias voltadas à antecipação da intervenção penal estatal. (...) As incriminações de perigo abstrato parecem decorrer desse raciocínio. Com elas, o legislador adota medidas extremamente graves com relação a condutas que apenas supõe perigosas aos bens jurídicos, sem, entretanto, dispor de um juízo de certeza quanto aos resultados da conduta reputada perigosa. Ademais, a imposição de pena também se baseia em uma operação probabilística, uma vez que o juiz vê-se dispensado de comprovar a ocorrência de algum desdobramento danoso ou ameaçador a partir daquela conduta. Está-se diante, portanto, de uma política criminal de precaução, que tende a abandonar os pressupostos do conhecimento das leis causais da ciência e do direito para lançar-se na incerteza do risco, na incalculabilidade do dano e na indefinição do possível nexo causal entre um e outro – matérias sobre as quais pairam apenas presunções geralmente sustentadas em probabilidades e estatísticas. Essas considerações permitem concluir que as perspectivas de operação das categorias do direito penal que ora se analisam decorrem de uma reação do aparato jurídico ao cenário de incertezas e imprevisões da sociedade mundial do risco".
Com efeito, diante da evolução do Direito Penal, especialmente do funcionalismo de Claus Roxin (Derecho Penal, parte general. Trad. Luis Arroyo Zapatero. Barcelona: Ariel, 1989), a conduta que não causa risco significativo ao bem jurídico é atípica, pois a imputação passa a exigir – diferentemente dos modelos causalista e finalista – algo além do viés subjetivo (dolo) e da relação de causalidade. Imputar a alguém a responsabilidade penal implica criação de um risco (relevante) não permitido em que haja tanto desvalor da conduta como do resultado. Assim, em casos que ausente o perigo de lesão ao bem jurídico, cabe ao julgador ponderar a aplicação da norma e, diante de situação onde tal lesividade inexiste, inadmitir a imposição de uma pena ao agente.
Assim, não havendo comprovação de ser a arma apreendida idônea para o fim que se destinava, inexiste materialidade ao tipo em apreço e, mesmo que tal comprovação fosse suplantada pelas demais provas dos autos, impossível admitir a configuração do crime, uma vez que a comprovação da lesividade ao bem jurídico se mostra deficiente em função da inexistência de laudo pericial, clamando o presente caso, pois, pela absolvição, na forma do art. 386, inciso II, do Código de Processo Penal.
III – Dispositivo.
Por tais razões, JULGO IMPROCEDENTE a denúncia de fls. II/III para ABSOLVER o acusado Valdir Machado, já qualificado nos autos, da imputação do crime descrito no art. 14, "caput", da Lei 10.826/03, com base no art. 386, II, do Código de Processo Penal.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Dê-se destinação legal à arma apreendida.
Transitada em julgado, arquivem-se.
Florianópolis (SC), 16 de julho de 2009.
Alexandre Morais da Rosa
Juiz de Direito
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