O ART. 265 DO
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL É INCONSTITUCIONAL?
Autor: André
Gonzalez Cruz é Analista Ministerial e Assessor de Procurador de
Justiça no Ministério Público do Maranhão.
Artigo publicado na
Revista Juris Itinera de 2012.
Muito se tem
discutido atualmente se o art. 265 do Código de Processo Penal, com
a redação dada pela Lei nº 11.719/2008, é inconstitucional ou
não. Assim, antes de adentrar no mérito da questão, necessária a
transcrição do referido dispositivo, litteris:
Art.
265. O defensor não poderá abandonar o processo senão por
motivo imperioso, comunicado previamente o juiz, sob pena de multa de
10 (dez) a 100 (cem) salários mínimos, sem prejuízo das demais
sanções cabíveis.
§
1o A
audiência poderá ser adiada se, por motivo justificado, o defensor
não puder comparecer.
§
2o Incumbe
ao defensor provar o impedimento até a abertura da audiência. Não
o fazendo, o juiz não determinará o adiamento de ato algum do
processo, devendo nomear defensor substituto, ainda que
provisoriamente ou só para o efeito do ato.
Cumpre destacar que
o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, propôs, perante
o Supremo Tribunal Federal, uma Ação Direta de
Inconstitucionalidade, protocolada sob o nº 4.398, requerendo a
declaração de inconstitucionalidade do citado art. 265, no que diz
respeito à multa prevista para o defensor que abandonar o processo,
salvo por motivo imperioso, comunicado previamente ao juiz.
Entretanto, a Corte
ainda não se manifestou definitivamente sobre a questão, estando os
autos conclusos ao seu relator, Ministro Dias Toffoli, desde
29/09/2010.
Nesse diapasão,
argumenta a OAB que a nova redação do art. 265 do Código de
Processo Penal tornou a advocacia criminal um risco desmedido, tendo
em vista que esta é a única previsão legislativa existente no país
que dispensa, para aplicação de uma pena, todas as garantidas
constitucionais do cidadão.
Dessa forma,
assinala que se trata, na verdade, de violação manifesta ao livre
exercício da advocacia1,
porquanto retira da Ordem dos Advogados do Brasil o dever-poder de
punir os seus inscritos2,
além de, sobretudo, prever a aplicação de pena sem o devido
processo legal e sem assegurar ao profissional o exercício do
contraditório e da ampla defesa, conforme dispõe o art. 5º, LIV3
e LV4,
da Constituição Federal.
Aduz ainda que o
dispositivo legal impugnado extrapola todos os padrões de
razoabilidade e de proporcionalidade, pois a norma determina a
aplicação de punição a um fato, presumidamente censurável, sem
que, para tanto, se instaure o devido processo legal e sem garantir a
possibilidade de exercício do direito de defesa e do contraditório.
Assevera também que
a sistemática adotada na novel redação do art. 265 do Código de
Processo penal autoriza a apenação de advogado sem sequer ouvir a
parte penalizada que, lembre-se, não é parte no processo em que se
determina a condenação.
E, pior, a norma
gera uma condenação absoluta decorrente de uma presunção iuris
tantum
de culpa, a qual não pode ser discutida previamente e nem revista em
sede recursal, traduzindo-se evidentemente na negativa absoluta da
garantia constitucional do devido processo legal, cuja outorga de
poder ao magistrado para apenação impulsiona arbitrariedades não
compatíveis com as prerrogativas profissionais dos advogados.
A Ordem dos
Advogados do Brasil pontua ainda que a expressão “abandonar o
processo”, existente no dispositivo combatido, não recebeu do
legislador a tipificação devida, nem direta ou indireta, não
apresentando critérios objetivos e delimitadores da extensão da
expressão, daí a inviabilidade de sua aplicação não pelo
prudente arbítrio do julgador, mas sim pela arbitrariedade que
congrega a possibilidade de apenação sem o devido processo legal e
sem garantir o contraditório e a ampla defesa.
Registra que a única
forma de estimar o que significa “abandonar o processo” seria
perquirir acerca da extensão gramatical do termo “abandono”,
tendo-se, assim, 02 (duas) interpretações possíveis: no sentido
absoluto ou no sentido relativo.
No seu sentido
absoluto, o termo “abandono” seria “deixar, largar”,
revelando a impropriedade de que o advogado não poderia se afastar
fisicamente do processo, pois estaria “deixando-o” ou
“largando-o”. E, portanto, mesmo que o “abandono” não fosse
absoluto, mas momentâneo, incidir-se-ia a regra impugnada.
Isto, obviamente,
jamais serviria para a aplicação da norma, pois representa uma
condição irracional ao extremo e representaria a subversão da
razoabilidade, sendo clarividente que o advogado não precisa andar
com o processo sob sua guarda 24 (vinte e quatro) horas por dia.
Já quanto à
compleição relativa da expressão “abandonar o processo”, a OAB
frisa que esta revela a ideia de um desamparo total e absoluto do
objeto, não com caráter momentâneo, mas definitivo, isto é,
redunda na ideia de uma desistência indevida e não comunicada ao
juízo, com efeitos permanentes.
Assim, não é a
situação da ausência a um ato processual que configura o dito
abandono do processo. Talvez pudesse caracterizar, desde que
comprovada a intenção dirigida ao desprezo, um abandono do ato, mas
nunca da universalidade do processo, a qual é amparada pelo art. 265
do Código de Processo Penal.
A Ordem dos
Advogados do Brasil conclui, nesse espectro, que o abandono não
serviria para preencher o requisito da lei, pois a extensão da
expressão “abandonar o processo” como simplesmente “abandonar
um ato do processo” representaria franca interpretação extensiva,
o que, em matéria de punição, é absolutamente vedado.
Ora, se fosse
possível adotar tal intepretação extensiva e contrária à lógica,
ainda assim se teria que admitir que a aplicação da expressão
“abandonar o processo” exige voluntariedade, isto é, exige
comportamento consciente e volitivo de inação ou de abandono, pelo
fato de que este é dependente da vontade do agente e não se admite,
pela própria natureza gramatical e de significância do verbo
“abandonar”, que o mesmo se concretize, na prática, sem que o
agente tenha a vontade dirigida para o abandono.
Destarte, consoante
a OAB, cumpriria verificar em cada caso a existência do dolo
direcionado ao ato, pressuposto incompatível com a aplicação da
multa na forma sumária prevista no dispositivo vergastado, uma vez
que não permite a verificação deste dolo.
Tal intento, segundo
a inicial da ADI nº 4.398, só poderia ser verificado pela
contumácia ou, talvez, pelo reconhecimento da intenção de não
atuar, mas tais hipóteses não são verificáveis no momento em que
se aplica a penalidade, e, a rigor, os critérios subjetivos de
conveniência para a atuação do defensor no processo é matéria
correlata ao atendimento pactuado entre o advogado e seu cliente, e,
portanto, infere-se dentro da autonomia contratual da parte e nos
critérios de conveniência da defesa.
O que importa
ressaltar, nessa linha de raciocínio, é a impossibilidade de, no
próprio ato em que o advogado não comparecer, o juízo ter qualquer
espécie de ciência acerca das motivações de seu não
comparecimento e, não tendo como ter ciência desta motivação, nem
sendo onisciente, não pode saber se houve abandono do processo ou se
houve impossibilidade de comparecimento baseada em razões de força
maior ou outra coisa qualquer.
E não havendo
possibilidade de aferir, quando do multicitado ato, o elemento
subjetivo que autorizou a conduta, o juiz só poderá proceder
através de uma presunção, que, por expressa determinação
constitucional, só poderá ser de inocência.
Alega a Ordem dos
Advogados do Brasil que não socorreria a legitimidade da norma
atacada o disposto no seu § 2º, que possibilita a justificação
prévia – entenda-se até a instalação da audiência – das
razões do não comparecimento, pois, por óbvio, isto não serviria
para afastar a incidência do contraditório na formação da
convicção da dita negligência do não comparecimento, tendo em
vista que, até o momento da instalação da audiência, não há o
que contraditar, ou seja, não se operou o juízo de presunção e
até mesmo o suposto ato punível ainda não se concretizou.
Da mesma forma, nas
hipóteses de força maior ou de erro justificável para o não
comparecimento ao ato processual, a possibilidade de exercício do
contraditório restaria prejudicada, ou seja, o retromencionado § 2º
só visualiza causa pré-existente de motivação, desconsiderando as
causas de impossibilidade que podem ocorrer em pouco tempo antes da
audiência – e, por isto, não podem ser apresentadas até a sua
abertura –, mas que são plenamente capazes de impossibilitar a
presença do advogado no aludido ato. E cita como exemplo o caso do
advogado que sofre um acidente a caminho da dita audiência, que não
poderá justificar sua ausência até a instalação do ato.
Derradeiramente,
sustenta que o art. 265 do Código de Processo Penal revela
contrariedade ao art. 7º, IV5,
parte final, da Constituição Federal, pois utiliza o salário-mínimo
como fator de indexação para a multa, bem como que o dispositivo
vergastado permite a aplicação de penalidade de forma concorrente
ao contido na Lei nº 8.906/94, a qual dispõe sobre o Estatuto da
Advocacia, haja vista que o art. 34, XI, desta última, estabelece
infração disciplinar ao advogado que abandonar a causa sem justo
motivo ou antes de decorridos 10 (dez) dias da comunicação da
renúncia.
Assim, criam-se 02
(dois) subsistemas de punição aos advogados, retirando da OAB,
contudo, a possibilidade de aplicação da penalidade em face do
princípio da vedação do bis
in idem,
resultando violação ao art. 5º, XIII, da Constituição Federal.
Entretanto,
discorda-se de toda a argumentação expendida anteriormente pela
Ordem dos Advogados do Brasil, conforme restará sobejamente
demonstrado abaixo.
Tal conclusão é
chegada quando se analisa atentamente o que estipula o art. 265 do
Código de Processo Penal e os regramentos contidos na Constituição
Federal.
Cumpre ressaltar
que, ao contrário do afirmado pela OAB, o juiz, quando da audiência
em que ausente o defensor, não está obrigado a aplicar, de logo, a
penalidade de multa de 10 (dez) a 100 (cem) salários mínimos, o que
implicaria violação manifesta aos princípios do contraditório e
da ampla defesa.
Como pontuou a Ordem
dos Advogados do Brasil na ADI nº 4.398, a Lei nº 11.719/2008
promoveu significativas alterações nas disposições do Código de
Processo Penal, destacando-se, dentre elas, a nova redação do art.
265, cuja essência normativa, contudo, não sofreu alteração
substancial, eis que a redação anterior previa a apenação do
defensor que abandonasse o processo, ao passo que a sua novel redação
mantém esta mesma disposição.
Não obstante,
registra a OAB que, muito embora já existisse tal regramento no
ordenamento jurídico, não existiam notícias de sua aplicação,
nem de condenação de advogado ao pagamento das multas que
estipulava. É que na redação anterior o efeito prático consistia
em autorizar o magistrado a não adiar a audiência ou o ato
processual em face da ausência do advogado.
Desse modo,
constata-se claramente que só proposta a referida Ação Direta de
Inconstitucionalidade em face da interpretação dada pelos
magistrados, em concreto, à novel redação do art. 265 do Código
de Processo Penal, ou seja, no sentido de que o juiz deve aplicar a
penalidade de 10 (dez) a 100 (cem) salários mínimos ao defensor que
abandonar o processo, salvo por motivo imperioso comunicado
previamente, já naquela audiência em que o mesmo não pode
comparecer.
É cristalino que
este resultado desvirtua completamente as garantias da ampla defesa e
do contraditório. Todavia, em nenhum momento a norma atacada
propugna que este deve ser o modo de proceder do magistrado.
No mais, constata-se
que o regramento contido no art. 265, caput,
do Código de Processo Penal, não restringe o ato de “abandonar o
processo” à simples ausência do defensor à audiência, tendo em
vista que este pode “deixar” ou “largar” o processo em
qualquer momento processual, como, por exemplo, não ofertando as
alegações finais.
Dessa forma, o que
se tem em questão é a melhor intepretação conferida ao regramento
infraconstitucional vergastado, o que é matéria afeita ao Superior
Tribunal de Justiça, e não ao Supremo Tribunal Federal.
Nesse ponto, sábia
é a interpretação da expressão “abandonar o processo”, no seu
sentido relativo, dada pela própria Ordem dos Advogados do Brasil,
de que aquela revela a ideia de um desamparo total do objeto, não
com caráter momentâneo, mas sim definitivo, isto é, redundando na
ideia de uma desistência indevida e não comunicada ao juízo, com
efeitos permanentes.
O Advogado-Geral da
União se manifestou nesse sentido nos autos da ADI nº 4.398, em
face do que dispõe o art. 103, § 3º6,
da Constituição Federal, in
verbis:
Não assiste razão
ao requerente, pois sua pretensão tem por fundamento uma
interpretação equivocada do artigo 265 do Código de Processo
Penal, na redação que lhe foi conferida pelo artigo 1º da Lei
federal nº 11.719/08. A norma impugnada não impõe multa ao
advogado que faltar a certo ato processual, mas àquele que abandonar
o processo de maneira injustificada, colocando em risco a defesa
técnica do réu. Assim, não se pode confundir a ausência à
audiência designada pelo juízo com o abandono do processo. Com
efeito, o artigo 265 do Código de Processo Penal não impõe multa
em razão de simples falta injustificada do advogado à audiência
criminal de instrução ou de instrução e julgamento, conforme se
infere de seus termos expressos. É preciso, de fato, que tenha
havido o abandono da defesa pelo causídico, sem justificativa
exposta ao juiz, de maneira a gerar risco para a própria atuação
jurisdicional futura, que poderá ser questionada por obra da omissão
do defensor. Essa omissão, como se sabe, pode revelar-se como
estratégia torpe, dando azo à nulidade absoluta do feito por
violação ao contraditório e à ampla defesa. É por essa razão
que o caput
do artigo 265 do Código de Processo Penal é claro ao não
especificar qual tipo de ausência redundará na imposição da
penalidade pecuniária, pois o que gera essa pena, na adequada
interpretação do artigo, é o abandono injustificado do processo.
Os §§ 1º e 2º do artigo 265 do Código de Processo Penal tratam,
unicamente, de disciplinar as hipóteses de não comparecimento do
advogado à audiência. Nos termos de referidos dispositivos, caso
seja demonstrada a existência de justo impedimento para o seu
comparecimento a referido ato, o juiz deverá adiar a audiência,
privilegiando a defesa pelo advogado da confiança do réu (pois foi
por este escolhido). Já no caso de ausência injustificada, o juiz
deverá praticar o ato processual com a nomeação de defensor
substituto. Nenhuma dessas situações, entretanto, é fato gerador
da incidência da multa prevista no caput
do artigo impugnado. Desse modo, somente o fenômeno processual do
abandono,
que se revela juridicamente muito mais grave do que a ausência a um
ato processual específico, pode ensejar a multa definida no caput
do artigo 265 do Código de Processo Penal. O conceito de abandono
do advogado no processo penal pode ser extraído, por analogia, do
teor do artigo 60, inciso I, do Código de Processo Penal, que cuida
da perempção por inação do querelante. A redação de referido
dispositivo é similar, inclusive, ao texto do artigo 267, inciso
III, do Código de Processo Civil, que cuida do abandono do autor em
processos dessa espécie. Em ambos os dispositivos, dispõe-se que
haverá abandono quando, por não promover os atos e diligências que
lhe competem, o autor permanecer omisso por mais de 30 (trinta) dias.
Assim, não existe ofensa à proporcionalidade, pois a garantia de
segura prestação jurisdicional, na seara criminal, é um bem
coletivo que justifica a aplicação da multa, no quantitativo
legalmente definido. Trata-se de emanação do poder de polícia
judiciária, em que o interesse coletivo deve sobrepor-se ao
interesse individual do advogado que, com sua conduta desidiosa e
intencional, põe em risco a validade da sentença vindoura. Também
não se está diante de afronta ao princípio do amplo acesso à
jurisdição, pois o artigo 265 do Código de Processo Penal
objetiva, na verdade, proteger a segura prestação jurisdicional. A
multa busca evitar, inclusive, a prescrição da pretensão punitiva
estatal, pois processos que sejam declarados nulos, por falta de
defesa técnica, não interrompem o efeito deletério do tempo. Por
outro lado, verifica-se que o contraditório e a ampla defesa foram
observados no procedimento definido pelo artigo em debate. A
penalidade pecuniária somente será aplicada se o advogado
colocar-se deliberadamente em posição omissa. A própria norma
questionada assegura, antes de tudo, a possibilidade de manifestação
do advogado, deferindo-lhe o poder de informação ao Judiciário
sobre impedimentos e ausências forçadas. Estando razoavelmente
justificada a falta, não haverá abandono e, consequentemente, não
será aplicada multa.
Tal posicionamento,
inclusive, completa-se ao parecer da Procuradoria-Geral da República
naquela Ação Direta de Inconstitucionalidade, litteris:
O
novo texto, cuja modificação, no ponto impugnado, esteve limitada à
atualização do valor da multa, alinha-se ainda mais às orientações
do processo penal na atualidade, especialmente aquelas que dizem com
a razoável duração do processo e a defesa efetiva do réu. A
norma, por outro lado, ao contrário do que propugna o requerente,
vem em reforço ao art. 133 da CF, pois reconhece que a ausência
reiterada e injustificada do advogado é circunstância que
compromete de tal forma a administração da Justiça que merece ser
sancionada. A incidência da multa, portanto, ocorrerá apenas –
repita-se – em caso de abandono do processo. [...] A norma atende
ao princípio da proporcionalidade em todas as suas vertentes: é
adequada, porque tem em vista uma prestação jurisdicional célere,
com a garantia de uma defesa efetiva; é necessária, como único
meio efetivo de inibir a desídia de advogados e os prejuízos
processuais daí decorrentes; e é proporcional, porque permite ao
juiz no caso concreto, dentro dos limites legais, aplicar o quantum
adequado à conduta que se busca imprimir. Convenhamos, ainda, que o
valor que oscila de 10 a 100 salários-mínimos muito dificilmente
levará um advogado à absoluta insolvência. De resto, as garantias
do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório e da
inafastabilidade do controle jurisdicional também serão observadas,
na medida em que o advogado não está impedido de utilizar-se dos
meios processuais disponíveis para impugnar a decisão que impõe a
multa. Ante o exposto, o parecer é pela improcedência da ação.
Noutro giro, além
de não conflitar com as garantias constitucionais da ampla defesa e
do contraditório, o art. 265 do Código de Processo Penal ainda se
alinha com as orientações do moderno processo penal brasileiro, no
qual ganham destaque a efetiva defesa do acusado e a razoável
duração do processo, capituladas, respectivamente, no art. 5º, LV
e LXXVIII7,
da Constituição Federal.
Assim, segue o
Brasil a linha adotada no sistema norte-americano, no qual é dado ao
juiz, segundo Barbosa Moreira (2001, p. 173), “no âmbito do
chamado criminal
contempt power,
punir o advogado que deliberadamente viole os deveres para com o
próprio órgão judicial”.
Mendonça (2009, p.
206-207) comunga desse mesmo raciocínio, conforme se vê a seguir.
No caput,
manteve-se o dever de o defensor não abandonar o acusado, a não ser
por motivo imperioso. O abandono de que está tratando o artigo em
estudo é apenas o definitivo, ou seja, aquele em que o advogado se
afasta do processo de maneira permanente. Não se está a cuidar da
hipótese de ausência momentânea do advogado a determinado ato. A
inovação fica por conta da necessidade de que esta comunicação
seja prévia, ou seja, antes de abandonar a defesa do acusado, sob
pena de pesada multa de 10 a 100 salários mínimos – valor este
que foi atualizado –, sem prejuízo das demais sanções cabíveis,
inclusive perante a Ordem dos Advogados do Brasil. A necessidade de
comunicação prévia visa evitar a ocorrência de eventuais
nulidades, em razão de mácula ao direito de defesa. No entanto,
entendemos que a atualização da multa visa, também, assegurar ao
magistrado poderes para punir aquele causídico que se mostrar
descompromissado com o Poder Judiciário, em sentido próximo ao
contempt
of court,
do direito norte-americano. Nesta senda, não vislumbramos
inconstitucionalidade no referido dispositivo, desde que instaurado
um incidente, em que o advogado tenha oportunidade para se defender,
em atenção ao devido processo legal. Cumpre destacar que o art. 34
da Lei nº 8.906/1994 qualifica como infração disciplinar
“abandonar a causa sem justo motivo ou antes de decorridos dez dias
da comunicação da renúncia”, podendo o advogado, sem prejuízo
da sanção prevista no presente artigo, sofrer sanções no âmbito
disciplinar da Ordem dos Advogados do Brasil.
No mesmo sentido é
a lição de Nucci (2008, p. 565), que assevera:
Por isso, a partir
da edição da Lei 11.719/2008, o defensor pode abandonar o processo
por motivo imperioso, comunicando
previamente o juiz.
Se a comunicação não for feita de antemão, fica sujeito a uma
multa de 10 a 100 salários mínimos, sem prejuízo de outras
sanções, como, por exemplo, de ordem administrativa (OAB). A
fixação da multa deve observar a capacidade econômica demonstrada
pelo causídico. Logicamente se a comunicação prévia for
realizada, mas não se tratar de motivo imperioso,
está-se burlando, do mesmo modo a lei, podendo o magistrado aplicar
a multa supramencionada e dar continuidade aos trabalhos, nomeando
substituto.
Observe-se ainda que
tais autores afirmam também que a referida penalidade de multa é
independente da possível apuração administrativa da Ordem dos
Advogados do Brasil, o que vai de encontro ao sustentado na Ação
Direta de Inconstitucionalidade nº 4.398, de que o art. 265 do
Código de Processo Penal representa violação manifesta ao livre
exercício da advocacia, porquanto retira daquela Instituição o
dever-poder de punir os seus inscritos, em face da vedação do bis
in idem.
E isto se deve ao
fato de que a referida penalidade de multa emerge como um instrumento
colocado à disposição do juiz, para a garantia de uma eficiência
prestação jurisdicional, não possuindo, assim, natureza
disciplinar, e, portanto, nada interferindo na atuação da Ordem dos
Advogados do Brasil. Assim, o dispositivo atacado não viola os arts.
5º, XIII, e 133 da Constituição Federal.
Por último, quanto
à alegação de que o art. 265 do Código de Processo Penal revela
contrariedade ao art. 7º, IV, parte final, da Constituição
Federal, tendo em vista que utiliza o salário-mínimo como fator de
indexação para a multicitada multa, também sem razão. Isto porque
não existe impedimento legal à fixação de penas pecuniárias com
base no salário-mínimo, mas exclusivamente a sua utilização como
indexador de base de cálculo de vantagem ou para outros fins de
natureza econômica que o constituam em fator inflacionante, como
ressaltou a própria Procuradoria-Geral da República.
Tanto é verdade a
supracitada assertiva que a Súmula Vinculante nº 04 do Supremo
Tribunal Federal estabelece que, “salvo nos casos previstos na
Constituição, o salário mínimo não pode ser usado como indexador
de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado,
nem ser substituído por decisão”, o que justamente não ocorre no
caso da multa aplicada ao defensor pelo abandono do processo.
Caso assim não
fosse, pontua o Advogado-Geral da União, as penas criminais
pecuniárias, expressões do jus
puniendi,
jamais poderiam tomar como base o salário-mínimo, que é levado em
conta para a definição do dia-multa, conforme demonstrado no art.
498,
caput
e
§ 1º, do Código Penal.
A questão da
constitucionalidade do dispositivo vergastado já foi apreciada pelo
Tribunal Regional Federal da 1ª Região, tendo este se manifestado
pela adequação à Constituição Federal, desde que o magistrado
não aplique a mencionada multa quando da primeira audiência em que
ausente o defensor, assinalando, assim, as balizas para a sua
interpretação, como revelado abaixo em ordem cronológica.
Para
aplicação da multa prevista no art. 265 do CPP, é preciso que o
advogado seja ouvido sobre o motivo por que deixou de atuar no
processo, em obediência ao princípio do contraditório.9
1.
"Não se vislumbra inconstitucionalidade do art. 265, caput, do
CPP, ou ofensa aos princípios do juiz natural, do devido processo
legal, do contraditório e da ampla defesa, em se tratando de sanção
de natureza processual, incluindo-se na esfera de discricionariedade
regrada do juiz natural do processo, sendo exercidos a ampla defesa e
o contraditório através da possibilidade de impugnar a decisão
atacada por pedido de reconsideração ou mandado de segurança"
(STJ - RMS 31966/PR, Relator Ministro Adilson Vieira Macabu
(Desembargador Convocado do TJ/RJ), 5ª Turma, julgado por
unanimidade em 14/04/2011, publicado no DJe de 18/05/2011). 2. No
caso em comento, o ora impetrante, apesar de ter sido, por duas
vezes, regularmente intimado, não apresentou as alegações finais
nos autos do processo nº 2007.38.15.000903-5/MG e, além disso, não
apresentou nenhuma justificativa, o que levou o MM. Juízo Federal a
quo a aplicar-lhe multa no valor de 10 (dez) salários mínimos, por
abandono de causa. Dessa forma, a decisão impugnada encontra
respaldo no art. 265, caput, do CPP, que é expresso ao afirmar que
"O defensor não poderá abandonar o processo senão por motivo
imperioso, comunicado previamente o juiz, sob pena de multa de 10
(dez) a 100 (cem) salários mínimos, sem prejuízo das demais
sanções cabíveis". 3. A decisão impugnada se encontra
suficientemente fundamentada, não apresentando eiva de ilegalidade
ou abuso de poder que pudesse justificar a concessão do writ. 4.
Mandado de segurança denegado.10
1.
Regularmente intimado, por 3 vezes consecutivas, num prazo de 4
meses, para a apresentação de alegações finais, só vindo a
fazê-lo na quarta intimação e após aplicação de multa na forma
do art. 265 do CPP, caracterizado está o abandono da causa. 2.
Correta a aplicação de multa de 10 (dez) salários mínimos. 3.
Segurança denegada.11
I
- A decisão que aplica multa ao advogado do réu por abandono da
causa é impugnável por meio de recurso de apelação, a teor do
disposto no art. 593, II, CPP. II - Caracterizado o abandono da causa
pelo patrono do réu, por duas vezes, de forma injustificada,
irretocável o decisum que aplicou ao recorrente multa ao recorrente,
a teor do art. 265 do CPP. III - Não obstante a gravidade dos fatos,
em face do abandono de causa criminal por advogado, mormente por se
tratar de réu preso, o que permite a fixação da multa em patamar
maior que o mínimo, inexistem outros fundamentos para a exasperação
da multa aplicada, que varia entre 10 (dez) e 100 (cem) salários
mínimos, em seu grau máximo. Redução da multa para 20 (vinte)
salários mínimos. IV - Recurso em Sentido Estrito conhecido como
apelação e parcialmente provido.12
A matéria também
já foi submetida à apreciada do Tribunal Regional Federal da 2ª
Região, que se manifestou da mesma forma, conforme se vê fartamente
descrito a seguir.
1 - Inexiste
autorização para declaração incidental da inconstitucionalidade
do artigo 265 do Código de Processo Penal sem afronta ao princípio
da cláusula de “Reserva de Plenário” (art. 97 da CF/88). 2 –
Não há necessidade de instauração de procedimento contraditório
específico para aplicação de multa prevista no artigo 265 do CPP,
eis que o contraditório e a ampla defesa estão resguardados pela
possibilidade de oferecimento de recursos ou outras medidas de
impugnação inerentes ao próprio processo, que se desenvolve sob o
crivo do contraditório. 3 - Não se caracteriza o abandono da causa
se não há a constituição regular dos causídicos para patrocínio
da causa antes de sua intimação para realização do ato em relação
ao qual se considerou a defesa inerte. 3 - A nomeação da Defensoria
Pública da União para atuação na defesa de acusados não pode ser
condicionada à verificação de sua hipossuficiência econômica. 4
– Ordem concedida, ressalvada a eficácia da multa aplicada
posteriormente, que não foi objeto do presente writ.13
1. Mandado de
segurança impetrado contra ato praticado pelo MM. Juiz Titular da 1ª
Vara Federal Criminal de Vitória/ES, que, nos autos da ação penal
nº 2007.5001.013851-3, aplicou aos Impetrantes a multa prevista no
artigo 265, caput, do Código de Processo Penal, no valor de R$
5.100,00 (cinco mil e cem reais), por não terem comparecido à
audiência de instrução e julgamento. 2. A aplicação da multa
prevista no artigo 265 do Código de Processo Penal é cabível ao
advogado que abandona o processo. E o abandono de processo ocorre
quando o advogado regularmente constituído deixa de promover os atos
que lhe competem, de maneira reiterada e definitiva, expressa pela
ausência absoluta nos autos. 3. Constata-se que os Impetrantes deram
regular seguimento à defesa do acusado no curso da Ação Penal
originária, tendo, como se verifica às fls. 63/67, apresentado
Alegações Finais defensivas. 4. Ainda que a justificativa para o
não comparecimento à audiência não tenha sido aceita pelo
magistrado a quo, trata-se de um fato isolado, inexistindo qualquer
outro indicativo que demonstre desídia ou abandono da causa por
parte dos Impetrantes, que prosseguiram na defesa de seu
constituinte, impondo-se, por conseguinte, a concessão da segurança
para cancelar a multa aplicada. 5. Segurança concedida.14
- A
constitucionalidade do art. 265 é objeto da ADI nº 4398, mas não
há medida cautelar deferida. - As garantias constitucionais do
devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa não são
violadas pela imposição da multa prevista na novel dicção do art.
265 do CPP, que restringiu a aplicação dessa penalidade ao defensor
que abandonar o processo sem justo motivo, pelo que exsurge evidente
que existe espaço para a manifestação, em contraditório, do
defensor sancionado. A inexistência de incidente processual
específico para oportunizar a ampla defesa do advogado não
significa que a aplicação da multa seja automática - A
inviolabilidade do advogado por seus atos e manifestações no
exercício da profissão (CRFB, art. 133) não é irrestrita, podendo
ser contida nos limites da lei. - Não há previsão constitucional
no sentido de a Ordem dos Advogados do Brasil deter a competência
exclusiva para sancionar disciplinarmente advogado. A decisão do
Supremo Tribunal Federal na ADI nº 2652/DF não acolhe o argumento
da competência exclusiva. Ao contrário, explicita que advogados
podem estar submetidos concomitantemente ao Estatuto da OAB e a outro
regime jurídico. - O art. 14 do CPC não serve de parâmetro de
comparação adequado, porquanto da sua aplicação estão
expressamente excluídos os advogados, ao contrário do que ocorre
com o art. 265 do CPP, destinado tão-somente a estes. ABANDONO DE
CAUSA. INEXISTÊNCIA. FATO ISOLADO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AO
PATROCINADO. - O abandono de causa capaz de justificar a aplicação
da multa prevista no art. 265 do CPP demanda que o defensor
regularmente constituído reiteradamente deixe de promover os atos
necessários à defesa do acusado, não bastando uma única omissão
- como o não comparecimento à audiência - para caracterizá-lo. -
A ausência do advogado, sem motivo razoável, pode indicar desídia
do profissional e, ainda, abuso do direito, na hipótese de restar
configurado o interesse em atrapalhar a regular marcha processual e
causar tumulto mediante a postergação de ato do processo, mas não
configura, por si só, abando de causa. - A inércia do advogado não
influenciou na defesa da parte patrocinada, posto que sua
manifestação, exigida pelo Juízo impetrado, destinava-se tão
somente ao exercício da ampla defesa em relação à própria
aplicação da multa questionada.15
E assim ainda foi o
caso do Tribunal Regional Federal da 3ª Região:
1. Réu condenado
pela prática do crime de apropriação indébita previdenciária. 2.
Recurso da defesa argüindo nulidade decorrente da nomeação de
defensor ad hoc para apresentação de alegações finais, sem
intimação prévia do réu para constituir novo defensor. 3.
Nulidade patente. Constatado o abandono de causa por parte do
defensor constituído, a providência adequada era determinar a
intimação do réu para lhe dar ciência do ocorrido e a chance de
constituir um novo defensor, de sua confiança e em prazo razoável.
Ao nomear diretamente o defensor para o ato de apresentação de
alegações finais, o MM. Juízo incorreu em nulidade, violando o
artigo 263 do CPP, nos termos do artigo 564, IV, do mesmo Estatuto,
revelando-se inequívoco o prejuízo diante da condenação do
apelante. 4. Reiterados precedentes do Superior Tribunal de Justiça,
reconhecendo a nulidade em situações análogas. 5. Por outro lado,
comprovado o abandono de causa pelo anterior causídico, impõe-se a
aplicação de multa, nos termos do artigo 265 do CPP, em valor que
seja compatível com a fase processual e com a importância do ato
omitido. Neste caso concreto, tratando-se de alegações finais de
defesa, peça da mais alta relevância no processo penal, por ter o
condão de definir os rumos do feito e sem a qual não se pode dar
cabo do procedimento, gerando mais lentidão no processamento e
relativa demora para sua ausência ser devidamente equacionada pelo
condutor do processo, a multa deve ser de 50 salários mínimos,
vigentes à época do abandono, corrigidos monetariamente. 6. Feito
anulado a partir, inclusive, da nomeação da defesa ad hoc, com a
urgente baixa dos autos ao Juízo monocrático, cabendo aos atuais
defensores constituídos a apresentação das alegações finais,
para a prolação de nova sentença. 7. Preliminar de nulidade
acolhida. Aplicação de multa por abandono do processo. Expedição
de ofício à Procuradoria da Fazenda Nacional. Exame do mérito
recursal prejudicado.16
Outro não é o
entendimento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, como
demonstrado abaixo.
1. A correição
parcial não é meio processual adequado a atacar decisão que impõe
a aplicação da multa prevista no artigo 265 do Código de Processo
Penal. 2. Recebimento da correição parcial como mandado de
segurança. Aplicação do princípio da fungibilidade. 3. A adequada
interpretação do instituto do abandono do processo, preceituado no
artigo 265 do Código de Processo Penal, reclama animus de
definitividade, ocorrente na hipótese em que o advogado abstém-se
de promover, à míngua de motivo imperioso, os atos e diligências
que lhe competiam durante o curso processual de maneira reiterada,
que se expressa pela absoluta ausência nos autos, demonstrando a
vontade de não atuar em favor do mandante. É situação excepcional
que exige o elemento subjetivo de desídia na condução defensiva do
feito, em manifesto prejuízo do constituinte, já em visas de se
tornar indefeso, para só então cogitar-se da aplicação da sanção
pecuniária correspondente, até mesmo porque contemplativa de altos
patamares valorativos, que devem ser sopesados com prudência para
que não sejam excedidos os limites da razoabilidade. 4. Caso em que,
na conjectura do feito, não há lugar para um juízo categórico que
abone o cabimento da medida adotada. Nada obstante a ausência
injustificada à audiência, recobrou o advogado a condução do
processo, apresentando alegações finais, minimizando ou mesmo
impedindo, com essa postura, eventuais prejuízos ao seu
constituinte, a atestar que não houve afastamento definitivo em
relação ao patrocínio da causa penal.17
E não foi diferente
no Tribunal Regional Federal da 5ª Região, litteris:
1-Preliminar,
arguida pela Defensoria Pública da União, representante do acusado,
de necessidade de aplicação da penalidade de multa ao advogado
constituído em face do abandono da causa, prevista no Artigo 265 do
Código de Processo Penal, bem como no Artigo 34, XI, da Lei nº
8906/94 (Estatuto da OAB). 2-Inexiste desídia, por parte do
causídico constituído, pelas próprias peculiaridades ínsitas a um
processo penal com réu preso, estrangeiro (norte americano), sem
falar o nosso idioma. 3-Ademais, referido causídico, na oportunidade
da intimação do acusado do teor da sentença condenatória,
protocolizou petição pugnando pela apresentação das razões
recursais, nesta instância (CPP, Art. 600, § 4º), ato processual
que foi concluído por defensor público, nomeado pelo juízo, em
face de o réu, apesar de intimado, não ter constituído outro
causídico, o que afasta a tese de ocorrência de prejuízo ao réu.18
Entretanto, mais
valiosa ainda é a interpretação dada pelo Superior Tribunal de
Justiça à matéria, tendo em vista que é sua função tutelar a
unidade do direito federal.
1. Não é lícito
ao Advogado abandonar sem justo motivo previamente comunicado ao
Juízo, o patrocínio da causa, no momento da realização de ato
processual ao qual, devidamente intimado, deve comparecer, por
configurar, prima facie, menoscabo às atividades do Poder
Judiciário, nas quais desempenha função essencial e insubstituível
(art. 133 da Carta Magna). 2. Não se deve confundir a ausência a
determinado ato processual com o abandono do processo, tal como
previsto no art. 265 do CPP (redação da Lei 11.719/08), tanto que
cumpre ao Juiz, em tal hipótese, se for o caso, nomear defensor
substituto, como dispõe o art. 265, § 2º do CPP (redação da Lei
11.719/08), mas sem afastar a atuação do causídico em atos
processuais futuros. 3. A aplicação de qualquer sanção, ainda que
de cunho administrativo, mas com reflexo patrimonial, se sujeita aos
rígidos padrões de procedimento que integram o due process of law
(justo processo jurídico), que não admite a noção de
responsabilidade objetiva por ato infracional disciplinar, a exigir a
devida apuração de sua prática e do correspondente contexto
circunstancial em que ocorreu, haja vista o disposto nos incisos LIV
e LV do art. 5o. da Constituição Federal. 4. Cabe ao Juiz prover
medidas de pronta eficácia para impedir delongas processuais,
inclusive suscitando ao órgão de classe dos Advogados a adoção de
sanções administrativas, mas deve abster-se de exercer diretamente
essa atividade de controle disciplinar. 5. Recurso a que se dá
provimento, para conceder a ordem de segurança.19
1. Intimado para
comparecer à audiência de interrogação do acusado, deixou o
patrono de fazê-lo, sem justo motivo, comprometendo o bom andamento
do processo e a ampla defesa do réu, impondo, assim, a aplicação
da penalidade de multa prevista no art. 265, caput, do CPP. 2. Não
se vislumbra inconstitucionalidade do art. 265, caput, do CPP, ou
ofensa aos princípios do juiz natural, do devido processo legal, do
contraditório e da ampla defesa, em se tratando de sanção de
natureza processual, incluindo-se na esfera de discricionariedade
regrada do juiz natural do processo, sendo exercidos a ampla defesa e
o contraditório através da possibilidade de impugnar a decisão
atacada por pedido de reconsideração ou mandado de segurança. 3.
Evidenciada a ausência de ofensa a direito líquido e certo do
advogado, ora recorrente, refoge à via mandamental determinar a
suspensão da multa arbitrada. 4. Recurso Ordinário a que se nega
provimento.20
1. Prevê o art.
265, caput, do Código de Processo Penal, que "[o] defensor não
poderá abandonar o processo senão por motivo imperioso, comunicado
previamente o juiz, sob pena de multa de 10 (dez) a 100 (cem)
salários mínimos, sem prejuízo das demais sanções cabíveis".
2. No caso, as próprias Recorrentes, em suas razões, revelam que
deixaram de atender a dois chamados judiciais para apresentarem peça
defensiva, sequer esclarecendo ao Juízo que o Réu havia dispensado
seus serviços. 3. Restando claro que não havia notícia nos autos
de que as Recorrentes foram dispensadas pelo Réu de patrocinarem sua
defesa, não há como infirmar o fundamento correto da Juíza a quo
de intimar as Advogadas para praticar ato processual, sob pena de
multa. As Recorrentes não atenderam, ainda, à determinação de
que, ao deixar de defender causa criminal, o Causídico comunicará
previamente ao Juiz. 4. Quanto à alegação de que não lhes teria
sido oportunizado o exercício do contraditório, antes de que a
multa por abandono de causa fosse aplicada, mencione-se,
inicialmente, que a Jurisprudência desta Turma ainda é vacilante no
ponto. Em sentidos opostos, os recentes julgados: RMS 31.966/PR, Rel.
Min. ADILSON VIEIRA MACABU - Desembargador convocado do TJ/RJ -, DJe
de 18/05/2011 e RMS 32.742/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO,
DJe de 09/03/2011. 5. Entretanto, na espécie, tal discussão é
completamente desinfluente à solução da controvérsia, pois as
Recorrentes foram expressamente intimadas e advertidas pela Juíza
monocrática de que, se repetissem a omissão de não se manifestarem
nos autos, estariam sujeitas à pena de multa a que se refere o art.
265, caput, do Código de Processo Penal. Não resta configurada,
assim, qualquer ofensa ao due process of law. 6. Recurso desprovido.21
Atente-se para o
fato de que, nas decisões transcritas em que a segurança fora
concedida, nunca se declarou a inconstitucionalidade do art. 265 do
Código de Processo Penal – o que não poderia ser realizado, em
face das mesmas terem sido proferidas por órgãos fracionários das
respectivas Casas de Justiça e da cláusula de reserva de plenário,
prevista no art. 9722
da Constituição Federal –, mas tão-somente se deu a
interpretação mais escorreita ao entelado dispositivo.
Dessa forma,
verifica-se, com clareza solar, que todos os Tribunais Regionais
Federais, bem como o Superior Tribunal de Justiça, entendem que
constitucional o art. 265 do Código de Processo Penal, e que somente
deve ser aplicada a respectiva multa quando o defensor manifestar,
através de seus atos, o intuito de abandonar o processo,
conferindo-se o contraditório e a ampla defesa, como anteriormente
defendido
REFERÊNCIAS
BARBOSA MOREIRA,
José Carlos. Temas
de direito processual.
7. série. São Paulo: Saraiva, 2001.
MENDONÇA, Andrey
Borges de. Nova
reforma do Código de Processo Penal:
comentada artigo por artigo. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
NUCCI, Guilherme de
Souza. Código
de Processo Penal Comentado.
8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
1
Art. 133 da Constituição Federal: “O advogado é indispensável
à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e
manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.
2
Art. 5º, XIII, da Constituição Federal: “É livre o exercício
de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as
qualificações profissionais que a lei estabelecer”.
3
Art. 5º, LIV, da Constituição Federal: “Ninguém será privado
da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.
4
Art.
5º, LV, da Constituição Federal: “Aos litigantes, em processo
judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados
o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes”.
5
Art. 7º, IV, da Constituição Federal: “São direitos dos
trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social: [...] salário mínimo, fixado em
lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades
vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação,
educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e
previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o
poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim”.
6
Art. 103, § 3º, da Constituição Federal: “Quando o Supremo
Tribunal Federal apreciar a inconstitucionalidade, em tese, de norma
legal ou ato normativo, citará, previamente, o Advogado-Geral da
União, que defenderá o ato ou texto impugnado”.
7
Art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal: “A todos, no âmbito
judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do
processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.
8
Art.
49 do
Código Penal: “Art. 49 - A pena de multa consiste no pagamento ao
fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em
dias-multa. Será, no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo, de 360
(trezentos e sessenta) dias-multa. § 1º - O valor do dia-multa
será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do
maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior
a 5 (cinco) vezes esse salário”.
9
Tribunal Regional Federal da 1ª Região, 2ª Seção, Mandado de
Segurança nº 0014546-46.2010.4.01.0000/AC, rel. Desembargador
Federal Tourinho Neto, decisão unânime, julgado em 03/11/2010, DJ
de 12/11/2010, p. 13.
10
Tribunal
Regional Federal da 1ª Região, 2ª Seção, Mandado de Segurança
nº 0039346-07.2011.4.01.0000/MG, rel. Desembargador Federal I'talo
Fioravanti Sabo Mendes, decisão unânime, julgado em 28/09/2011, DJ
de 07/10/2011, p. 21.
11
Tribunal Regional Federal da 1ª Região, 2ª Seção, Mandado de
Segurança nº 0035418-48.2011.4.01.0000/MG, rel. Desembargador
Federal Carlos Olavo, decisão unânime, julgado em 26/10/2011, DJ
de 18/11/2011, p. 11.
12
Tribunal Regional Federal da 1ª Região, 3ª Turma, Recurso em
Sentido Estrito nº 2009.43.00.005217-6/TO, rela. Desembargadora
Federal Assusete Magalhães , decisão unânime, julgado em
10/11/2011, DJ de 18/11/2011, p. 379.
13
Tribunal
Regional Federal da 2ª Região, 1ª Turma, Mandado de Segurança nº
2009.02.01.011133-4/RJ, rel. Desembargador Julio Mansur (Juiz
Federal convocado), decisão unânime, julgado em 27/01/2010, DJ de
01/03/2010, p. 89.
14
Tribunal
Regional Federal da 2ª Região, 1ª Turma Especializada, Mandado de
Segurança nº 2010.02.01.015096-2/RJ, rel. Desembargador Aluisio
Gonçalves de Castro Mendes (Juiz Federal convocado), decisão
unânime, julgado em 26/01/2011, DJ de 01/02/2011, p. 4.
15
Tribunal
Regional Federal da 2ª Região, 2ª Turma Especializada, Mandado de
Segurança nº 2011.02.01.003548-0/RJ, rel. Desembargador Federal
Marcello Ferreira de Souza Granado (Juiz Federal convocado), decisão
unânime, julgado em 21/06/2011, DJ de 01/07/2011, p. 124-125.
16
Tribunal
Regional Federal da 3ª Região, 1ª Turma, Apelação Criminal nº
0009574-07.2003.4.03.6181/SP, rel. Desembargador Federal Alessandro
Diaferia (Juiz Federal convocado), decisão unânime, julgado em
10/04/2012, DJ de 18/04/2012.
17
Tribunal
Regional Federal da 4ª Região, 8ª Turma, Correição Parcial nº
2009.04.00.042906-8/SC,
rel. Desembargador Federal Victor Luiz dos Santos Laus, decisão
unânime, julgado em 09/06/2010, DJ de 17/06/2010.
18
Tribunal
Regional Federal da 5ª Região, 1ª Turma, Apelação Criminal nº
200881000035768/CE, rel. Desembargador Federal Rogério Fialho
Moreira, decisão unânime, julgado em 01/10/2009, DJ de 12/02/2010.
19
Superior
Tribunal de Justiça, 5ª Turma, Recurso Ordinário em Mandado de
Segurança nº 32742/MG, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho,
decisão unânime, julgado em 15/02/2011, DJ de 09/03/2011.
20
Superior
Tribunal de Justiça, 5ª Turma, Recurso Ordinário em Mandado de
Segurança nº 31966/PR, rel. Min. Adilson Vieira Macabu
(Desembargador convocado), decisão unânime, julgado em 14/04/2011,
DJ de 18/05/2011.
21
Superior
Tribunal de Justiça, 5ª Turma, Recurso Ordinário em Mandado de
Segurança nº 31178/RS, rel. Min. Laurita Vaz, decisão unânime,
julgado em 20/03/2012, DJ de 29/03/2012.
22
Art.
97 da Constituição Federal: “Somente pelo voto da maioria
absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão
especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de
lei ou ato normativo do Poder Público”.
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